(Saturday Night Fever)
Videoteca do Beto #115
Dirigido por John Badham.
Elenco: John Travolta, Karen Lynn Gorney, Barry Miller, Joseph Cali, Paul Pape, Donna Pescow, Bruce Ornstein, Julie Bovasso, Martin Shakar, Lisa Peluso, Denny Dillon, Fran Descher e Ann Travolta.
Roteiro: Norman Wexler, com estória de Nik Cohn.
Produção: Milt Felsen e Robert Stigwood.
[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].
Alguns filmes ultrapassam os limites da telona e se tornam a marca de uma época. “Os Embalos de Sábado à Noite” pertence a esta seleta categoria, captando com eficiência o espírito da era “Disco” em Nova York, além de apresentar, através do personagem interpretado por John Travolta, um marcante drama adolescente. De quebra, a excepcional trilha sonora tornou-se icônica, assim como as cenas de dança na discoteca “2001”. Por tudo isto, o longa dirigido por John Badham entrou para a história como um símbolo da cultura pop dos anos 70.
Empregado numa pequena loja de tintas no Brooklyn, Tony Manero (John Travolta) só encontra a felicidade quando está nas pistas de dança nos fins de semana. Quando seu irmão Frank (Martin Shakar) desiste de ser padre e volta pra casa, ele encontra uma nova parceira de dança chamada Stephanie (Karen Lynn Gorney) e começa a repensar a maneira que encara a vida e a falta de perspectiva de seu futuro.
Para compreender o fenômeno cultural “Os Embalos de Sábado à Noite” é primordial contextualizar seu lançamento. Após anos de escândalos políticos e participações em guerras, o pessimismo começou a abrir espaço para o escapismo entre os norte-americanos, que procuravam esquecer os problemas e encontrar prazer nas pistas de dança. Este movimento começou a se refletir também no cinema, que vivia os últimos suspiros da Nova Hollywood – um movimento repleto de (excelentes) filmes igualmente pessimistas – e passava a produzir filmes mais alegres, que funcionavam como uma espécie de fuga da realidade, culminando com o estrondoso sucesso da saga “Star Wars”. “Os Embalos de Sábado à Noite” não é necessariamente um filme alegre, pelo contrário, mas retrata com precisão este movimento iniciado em Nova York, em que jovens iam para boates apenas atrás de sexo, drogas e diversão, como forma de esquecer a dura realidade da vida e a falta de perspectiva para o futuro. Expondo o sexo e o uso de drogas com naturalidade, a narrativa encarna o espírito jovem e reflete o pensamento da época, ilustrando também problemas sociais das grandes metrópoles, por exemplo, através das brigas entre os amigos de Tony e os “latinos”.
Desde o início, o balanço do caminhar de Travolta, acompanhado de perto pelo close em seus pés, dá o tom e a importância da música na narrativa, afinal, é ela quem dita os sentimentos dos personagens. No dia-a-dia, Tony é frustrado no trabalho e discute com a família, mas quando veste suas camisas de poliéster e coloca seus sapatos lustrados cuidadosamente, ele parte para o único lugar onde é verdadeiramente feliz. Desta forma, a câmera do diretor John Badham narra uma verdadeira tragédia urbana, provocada pela vida difícil nas grandes cidades e pelos dilemas que jovens de bairros menos favorecidos normalmente enfrentam. Como Tony, alguns conseguem encarar esta fase e, com sorte e esforço, seguir em frente. Outros, como um de seus amigos, não. Balanceando bem a narrativa entre os empolgantes momentos na pista de dança e a conturbada vida do protagonista fora dela, o diretor emprega o tom correto ao longa, evidenciando o estado de espírito de Tony e seus amigos. Além disso, sua câmera nos coloca dentro da pista e capta muito bem a atmosfera da casa noturna, algo reforçado pela empolgante trilha sonora composta pelos Bee Gees (Barry Gibb, Maurice Gibb e Robin Gibb), junto com David Shire.
Além de capturar o espírito de seu tempo, “Os Embalos de Sábado à Noite” ainda faz algumas referências a grandes filmes do passado, como quando alguém diz que Tony se parece com Al Pacino e ele encara seu pôster de “Serpico” buscando semelhanças – destaque para o semblante feliz de Travolta ao repetir as palavras do assaltante de Pacino (“Attica! Attica!”) em “Um Dia de Cão”. E até mesmo o nome da discoteca que eles freqüentam é uma óbvia referência ao clássico de Kubrick “2001, uma odisséia no espaço”. Já o pôster de “Rocky, Um Lutador” pendurado na parede do quarto é uma nada elegante alfinetada em John G. Avildsen, que dirigiria “Os Embalos de Sábado à Noite”, não fossem os desentendimentos com Travolta. Por outro lado, a direção de arte acerta em muitos detalhes, criando uma Nova York suja, que reflete o submundo que aqueles jovens viviam.
Nas pistas de dança, a fotografia de Ralf D. Bode emprega muitas luzes e tons avermelhados, simbolizando a paixão que pulsa naqueles corações livres e ávidos por diversão sem compromisso. Além disso, destaca-se também a montagem fluída de David Rawlins, que emprega um ritmo empolgante ao acompanhar as excelentes músicas e os movimentos dos dançarinos. Repare ainda como o jantar da família Manero termina em poucos minutos, num exemplo claro do estilo de montagem dinâmica que estamos acostumados. Na narrativa, o jantar dura apenas dois minutos, mas não nos incomodamos com isso, pois sabemos que no universo diegético o jantar teve uma duração maior. Este dinamismo é essencial num filme voltado para o público jovem.
Uma refeição também escancara os problemas de Tony com sua família. “Só duas vezes me disseram que sou bom na vida!”, ele grita, demonstrando a insatisfação com a falta de apoio do pai. Por isso, quando seu irmão Frank larga a igreja, Tony se renova (“Não sou tão ruim assim”), numa crítica interessante ao peso dos estereótipos que criamos. Mulherengo, despojado e cativante, Travolta cria um personagem icônico, numa atuação bastante convincente. Tony é machista e preconceituoso, mas ainda assim gostamos dele, graças à atuação carismática de Travolta, que, com seu terno branco (figurinos de Patrizia von Brandestein), criou um símbolo da cultura pop daquela década. O ator se sai bem também nos momentos dramáticos, como na discussão com a mãe, em que ele se arrepende e pede desculpas após magoá-la. Pra completar, John Travolta dá um verdadeiro show nas pistas de dança, mostrando o resultado de meses de dedicação e treinamento com coreografias admiráveis.
Mas apesar do glamour e da fama que construiu nas pistas, Tony não era totalmente feliz, e isto fica evidente numa conversa com Stephanie, a bela dançarina interpretada por Karen Lynn Gorney, que abre os olhos do protagonista e, de quebra, expõe as diferenças sociais e culturais entre eles. Ela também vivia ali, no mesmo ambiente que Tony, mas queria mudar e estava batalhando pra isto. Ela queria crescer e amadurecer. Tony não sabia, mas ele também queria – e de fato Tony já tinha responsabilidades, trabalhava para ajudar a família e sentia que a fase de diversão não seria eterna (“A dança não vai durar pra sempre”, reflete). E é através de seu sentimento por Stephanie que Tony começa a mudar efetivamente, algo simbolizado sutilmente quando ele se enforca com uma roupa e, no plano seguinte, vemos a garota responsável por fisgar o rapaz. Ela seria o agente da mudança de Tony Manero.
Manero era uma espécie de líder de uma turma de garotos ligados em dança, drogas e sexo, e também era alvo do desejo das garotas, algo simbolizado pela personagem Annette, interpretada por Donna Pescow. Rebeldes, eles andavam em cima de uma ponte na volta das noitadas, desafiando o perigo, numa atitude típica da juventude que deseja quebrar regras e mudar o mundo. Mas os anos passam, as coisas mudam e cada um reage a sua maneira diante das dificuldades da vida. Numa cena de forte impacto, um dos amigos de Tony se suicida após descobrir a gravidez da namorada, na mesma ponte que tanto lhes deu alegria. E com esta tragédia, pelo menos para Tony, aquele período chegava ao fim. Esta mesma ponte simboliza a trajetória de mudança do protagonista, que alcança o outro lado da margem e passa a enxergar a vida de outra maneira. Ao ficar bravo porque os latinos não ganharam o primeiro lugar no concurso de dança, Tony apenas confirma sua mudança. A vida rebelde, o preconceito e a vitória a qualquer custo ficaram para trás. O jovem amadureceu. E é justamente por acompanhar o amadurecimento de Tony de maneira tão interessante e intensa que “Os Embalos de Sábado à Noite” é mais do que um belo (e competente) musical.
Ainda que tenha músicas empolgantes e cenas inesquecíveis nas pistas de dança, “Os Embalos de Sábado à Noite” se estabelece como um musical maior, que captou como poucos o espírito de seu tempo e ainda deixou uma mensagem marcante através do amadurecimento de seu protagonista. Todos nós passamos por esta fase na vida, onde tudo que queremos saber é onde será a próxima festa e com quem iremos nos divertir naquela noite. Com o passar dos anos, no entanto, esta diversão gradualmente dá lugar a outras preocupações, como a de constituir família e progredir como ser humano. Se você ainda é jovem, não se engane. Cedo ou tarde, este momento sempre chega, e pra todos nós.
Texto publicado em 19 de Setembro de 2011 por Roberto Siqueira
Leia novamente seu próprio texto pensando como uma mulher.
Você realmente acha que uma mulher depois de assistir esse filme HOJE é capaz de gostar do personagem do John Travolta?
E como assim você nem citou a cena de ESTUPRO da Anette no carro.
Odiei ver esse filme… Me disseram que era super legal de assistir e tudo que achei foi um filme pesado demais que mostra explicitamente como a sociedade via e tratava as mulheres, o que reflete até hoje.
CurtirCurtir
Eu vi este filme no cinema, quando tinha dezessete anos. Ele realmente causou um grande efeito ! O Tony Manero realmente era um personagem com o qual não podíamos deixar de nos identificar, mesmo com todos os seus defeitos . Os anos se passaram e eu vi o filme outras vezes. Ontem, depois de alguns anos sem ver, eu o vi mais uma vez. È estranho como o tempo acaba mudando a nossa percepção, valores, gostos! eu achei o Tony Manero um cara absolutamente detestável, egoísta,totalmente preconceituoso e misógino. Sim, misógino! isso fica provado no jeito como ele trata a moça que é apaixonada por ele, com aquele quase nojo que ele tem dela, e que fica patente naquela cena na qual ele permite que seus amigos, um por um, transem com ela dentro do carro, sem esboçar nenhuma reação ou ajudá-la, mesmo sabendo que ela estava esperando que ele interviesse, que ele se mostrasse preocupado com ela! Difícil imaginar cena mais deprimente. Acho que não foi só o fato dos anos terem passado para mim, mas também o fato dos anos terem feito as mulheres perceberem mais as pequenas e grandes violências que , por tantos anos, passaram despercebidas, minimizadas. Esta cena deprimente passou quase que despercebida na época, um pequeno e insignificante detalhe. Mas acho que ela chamaria muito mais atenção, se o filme tivesse sido feito nos dias de hoje. OU seja, Tony Manero não seria considerado tão “manero”.
CurtirCurtir
O objeto principal do filme, que muito poucos perceberam, foi a evolução da maturidade emocional de Tony. E por isso, muitos disseram que o final ficou em aberto. Podemos perceber o bombardeio de influências sobre o vendedor de tintas do Brooklin, começa logo no começo do filme e, quando a personagem Stefany entra em cena, as atitudes de Tony começam a mudar mais rapidamente. Mesmo que muito mentirosa, talvez por ser mais velha que Tony Maneiro, termina por influenciá-lo grandemente. A partir daí, ele já não consegue enxergar tanta beleza nas atitudes e brincadeiras de seus colegas, ou seja, já não compartilhava as mesmas ideias. A morte de um de seus colegas, foi o ápice. Trata-se de um momento de transição, que consolida sua personalidade sob influência da visão de futuro da bailarina de Manhattan. Tanta influência que o final do filme completa nosso pensamento. Na ocasião, Tony passa a um diálogo totalmente contraposto ao que dizia no começo do filme, quando implorava por um adiantamento para o final de semana, “o futuro é hoje a noite”. Nesse final, quase repetindo as mesmas aspirações de Stefany, demonstra finalmente sua evolução emocional prospectiva.
Fantástico filme, transcende os clichês que se repetem ano a ano.
Conseguiu de modo bastante sutil demonstrar as aspirações e rebeldias humanas e a evolução do ser humano.
Uma pena que poucos consigam perceber.
CurtirCurtir
SATURDAY NIGHT FEVER O AUGE DA DISCOTHEQUE ANOS 70.. ÉRAMOS FELIZES … SAUDADES.
CurtirCurtir
Qualquer coisa que você procurar dos anos 70, obrigatoriamente terá que incluir esse filme. Foi o máximo!
CurtirCurtir
Um grande filme, sem dúvida Lauro.
Um abraço e obrigado pelo comentário.
CurtirCurtir
OS EMBALOS DE SABADO A NOITE FOI CONSIDERADO UM ROCK MODERNO OU CLASSICO NOS ANOS 70.
PELO FATO QUE FOU FAZER UM TRABALHO SOBRE O ROCK DOS ANOS 70 E PRECISO DE UM COISA MARCANTE DESSA DECADA E EU PESSEI NESSE FILME PARA MEU TRABALHO.
E PRECISO SABER SE FOI UM RITMO GENERO ROCK!!
CurtirCurtir
O rock dos anos 70 tem inúmeras bandas importantes pra você incluir em seu trabalho Ana.
Os Embalos de Sábado a Noite é um grande filme daquela época, mas um trabalho sobre rock nos anos 70 precisa envolver muito mais do que isto.
Abraço.
CurtirCurtir
os embalos de sabado á noite, e a novela dancin days, foi uma época inesquecivel. gostaria muito que voltasse a boa musica, pois hoje só tem porcaria. odeio samba, pagode, sertanejo, axé, funk, rap e mpb. só gosto de musica antiga, pois antes havia sensibilidade pra fazer musicas. hoje ta um lixo esses sons, amo dança, musicas romanticas, adoro bee gees, harmony cats, freneticas e tudo em relaçao a discoteca. um abraço irelan.
CurtirCurtir
Olá Irelan,
Obrigado pela visita e pelo comentário.
Assim como você, também me sinto órfão de boa música (no meu caso, do bom e velho rock n’ roll). Ainda bem que a arte nunca morre e poderemos eternamente nos deliciar com as boas músicas lançadas antigamente.
Abraço!
CurtirCurtir
Olá Roberto…belíssimo comentário sôbre este incrivel filme marcou minha geração naquele final dos 70, época do nascimento do som tuchi tuchi e das boates hoje mais conhecidas como ‘baladas’ com a diferença das misturas de rítmo (pagode, axé, sertanejo, etc). Outro fato interessante é que além de revelar John Travolta o filme ainda ajudou a detonar a nova (e melhor) fase da carreira dos fantásticos irmãos Bee gees que se tornariam milionários em curto espaço de tempo! Um abraço
CurtirCurtir
Obrigado pelo elogio Francisco.
Abraço!
CurtirCurtir
CADE O NOME DO AUTOR
CurtirCurtir
Olá,
Meu nome aparece abaixo do título e depois da última imagem.
Abraço.
CurtirCurtir
O inicio do filme com o Travolta caminhando ao som do Bee Gees é inesquecivel! O filme é otimo, um clássico! Só não gosto muito do final!
Parabens pelo site!
CurtirCurtir
Olá Iuri,
Muito obrigado pelo comentário e pelo elogio. Desculpe a demora em responder, tive problemas com minha internet.
Seja bem-vindo ao Cinema & Debate, fique à vontade para comentar e volte sempre.
Abraço.
CurtirCurtir
Você não é a única.
O objeto principal do filme, que muito poucos perceberam, foi a evolução da maturidade emocional de Tony. E por isso, muitos disseram que o final ficou em aberto. Podemos perceber o bombardeio de influências sobre o vendedor de tintas do Brooklin, que começa logo no começo do filme e, quando a personagem Stefany entra em cena, as atitudes de Tony começam a mudar mais rapidamente. Mesmo que muito mentirosa, talvez por ser mais velha que Tony Maneiro, termina por influenciá-lo grandemente. A partir daí, ele já não consegue enxergar tanta beleza nas atitudes e brincadeiras de seus colegas, ou seja, já não compartilhava as mesmas ideias. A morte de um de seus colegas, foi o ápice. Trata-se de um momento de transição, que consolida sua personalidade sob influência da visão de futuro da bailarina de Manhattan. Tanta influência que o final do filme completa nosso pensamento. Na ocasião, Tony passa a um diálogo totalmente contraposto ao que dizia no começo do filme, quando implorava por um adiantamento para o final de semana, “o futuro é hoje a noite”. Nesse final, quase repetindo as mesmas aspirações de Stefany, demonstra finalmente sua evolução emocional prospectiva.
Fantástico filme, transcende os clichês que se repetem ano a ano.
Conseguiu de modo bastante sutil demonstrar as aspirações e rebeldias humanas e a evolução do ser humano.
CurtirCurtir