TOY STORY 3 (2010)

(Toy Story 3)

 

 

Filmes em Geral #87

Dirigido por Lee Unkrich.

Elenco: Vozes de Tom Hanks, Tim Allen, Michael Keaton, Joan Cusack, Bonnie Hunt, Timothy Dalton, R. Lee Ermey, John Ratzenberger, John Morris, Laurie Metcalf, Wallace Shawn, Don Rickles, Jodi Benson e Ned Beatty.

Roteiro: Michael Arndt.

Produção: Darla K. Anderson.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Antes mesmo de assistir ao último filme da impecável trilogia “Toy Story”, fui tomado por um sentimento nostálgico somente ao imaginar que, após acompanharmos a trajetória de Andy e seus queridos brinquedos nos excepcionais filmes anteriores, aquela seria a minha despedida de Woody, Buzz e companhia. Se me emocionei em “Toy Story” e quase não contive as lágrimas em “Toy Story 2” – especialmente no clipe que conta a história de Jesse e sua dona -, era muito provável que as lágrimas seriam inevitáveis em “Toy Story 3”. Mas eu não estava preparado para esta verdadeira catarse. A verdade é que a obra-prima dirigida por Lee Unkrich mexe em nossos sentimentos mais profundos, remetendo a mais nostálgica fase de nossas vidas.

Desta vez escrito por Michael Arndt, “Toy Story 3” traz Andy (voz de John Morris) já com 17 anos e prestes a ir para a Faculdade. Enquanto arruma seu quarto, ele decide levar apenas o cowboy Woody (voz de Tom Hanks) e deixar todos seus outros brinquedos no sótão, entre eles Buzz Lightyear (voz de Tim Allen), Jessie (voz de Joan Cusack) e o Sr. Cabeça de Batata (voz de Don Rickles). Mas, por engano, sua mãe confunde o saco que ele separou para os brinquedos e eles acabam no lixo. O grupo consegue escapar, se infiltra numa caixa onde está Barbie (voz de Jodi Benson) e acaba sendo levado para a creche Sunnyside, onde eles conhecerão novos brinquedos como Ken (voz de Michael Keaton) e o urso Lotso (voz de Ned Beatty).

Esbanjando criatividade, o roteiro de Arndt traz Woody novamente numa situação complicada, tendo que salvar os amigos antes da partida de Andy, o que nos leva a novas e empolgantes aventuras. Remetendo em alguns instantes a estrutura narrativa do primeiro filme (a reunião entre os brinquedos, a “fuga involuntária” da casa), Arndt tem ainda o cuidado de revelar o destino de personagens marcantes como Wheezy, a boneca de porcelana Beth e os soldados de plástico, num indício sutil do clima nostálgico que permeia a narrativa, acertando também nos momentos bem humorados, como ao “resetar” Buzz e trazer de volta sua adorável dedicação ao “comando estelar”, além da hilária mudança de seu idioma para o espanhol. Abordando temas como a inexorabilidade do tempo (como atestam o gordo e cansado Buster e o rosto adolescente de Andy) e a importância da amizade verdadeira, “Toy Story 3” emociona não apenas as crianças, mas também (e especialmente!) os adultos.

A espetacular seqüência de abertura dá o tom da narrativa, iniciando com a empolgante aventura (que descobriremos existir apenas na cabeça de Andy) envolvendo os principais personagens da trilogia e terminando nas gravações que mostram o crescimento do garoto. Esta oscilação entre a euforia e a nostalgia é uma das marcas de “Toy Story 3”, graças à direção firme de Unkrich que transforma o capítulo final da trilogia num festival de sensações. Contando com o bom trabalho do montador Ken Schretzmann, a narrativa transita muito bem entre emoções extremas, passando pela adrenalina das aventuras, pela tensão dos momentos de suspense e pela delicadeza de cenas tocantes, como o melancólico e sublime final, intercalando tudo isso com momentos de bom humor. Além disso, o trabalho de montagem se destaca também pela fluidez em diversos momentos, como na citada abertura e na apresentação do sistema de segurança de Lotso, que transforma Sunnyside numa prisão.

Tecnicamente, mais uma vez a qualidade das animações impressiona pela riqueza de detalhes, sendo capaz de dar vida aos brinquedos através da leveza de seus movimentos e da expressividade deles – observe a expressão de desaprovação de Woody quando chega a Sunnyside, por exemplo. Além disso, chega a ser quase inacreditável a capacidade de criação dos animadores da Pixar, que desenvolvem uma enorme variedade de brinquedos (muitos deles remetem diretamente a minha infância, aliás), assim como o roteiro novamente aproveita a oportunidade para criar gags divertidas baseadas nas características deles, como no sensacional encontro entre Ken e Barbie e no divertido desfile que ele faz pra ela, nas constantes piadas sobre a origem dele (“Não sou brinquedo de menina!”) e no corpo improvisado pelo Sr. Cabeça de Batata.

Ainda na parte técnica, vale destacar mais uma vez o excepcional design de som, que dá vida ao mundo criado pelos animadores e nos insere dentro dele com precisão. E se desta vez a bela “You’ve got a friend in me” soa ainda mais nostálgica devido às circunstâncias, a trilha sonora de Randy Newman se destaca também por pontuar com precisão as cenas de aventura e suspense, injetando adrenalina e tensão sempre na medida certa, além de mostrar criatividade nos acordes tipicamente espanhóis que embalam a divertida dança “caliente” de Buzz.

Voltando aos aspectos visuais, vale observar como a fotografia colorida e cheia de vida na chegada dos brinquedos à creche Sunnyside cria uma expectativa totalmente contrária à realidade do lugar, evidenciada somente pela reação dos brinquedos locais segundos antes da invasão das agitadas crianças que detonam todos eles. Esta subversão de expectativa, aliás, também acontece com o personagem Lotso, que surge como um urso tranqüilo e amigável – e a voz contida de Ned Beatty é essencial para isto -, mas lentamente se revela como o grande vilão da trama. Será ele o agente da mudança brusca da fotografia, que troca as cores vivas pelos tons obscuros durante todo o segundo ato após Woody ouvir a história de Lotso, em outra cena que transita de tons dourados para cores sombrias e sufocantes que, realçadas pela chuva, ilustram os sentimentos do urso abandonado.

Além de imprimir um ritmo delicioso à narrativa, Unkrich se destaca, por exemplo, na condução de seqüências empolgantes e visualmente belíssimas como a primeira fuga de Woody de Sunnyside, a acrobática saída de Buzz da sala Lagarta e a segunda fuga da creche, capaz de grudar o espectador na cadeira, especialmente quando os personagens são deixados no assombroso depósito de lixo – e confesso que cheguei a temer pelo destino dos heróis nesta sombria seqüência, que é certamente o momento mais tenso da narrativa. Através destes interessantes movimentos de câmera que acompanham as peripécias dos personagens, Unkrich confere agilidade e dinamismo ao longa, o que é essencial numa aventura infantil. Mas “Toy Story 3” está longe de direcionar seus esforços apenas para a fatia mais jovem do público. Por isso, quando os personagens escapam da difícil situação no depósito e conseguem voltar para casa, o final devastador se aproxima e o espectador já sabe o que esperar.

Quando Andy brinca pela última vez com seus queridos brinquedos e apresenta cada um deles para a garota, nós sabemos que também estamos nos despedindo daqueles personagens adoráveis. Sabemos ainda que, para Andy, não se trata apenas de deixar aqueles brinquedos legais para trás, mas também de despedir-se definitivamente dos áureos tempos da infância, época em que o mundo era filtrado pela pureza do olhar de uma criança. Por isso, a identificação do espectador adulto é inevitável e fica difícil segurar as lágrimas. Após o carro perder-se no horizonte e Andy deixar tudo isto para trás, aqueles momentos mágicos sobreviverão apenas na memória – e quem já passou por esta fase sabe bem o que é isto. Finalmente, esta cena final é ainda mais emblemática para aqueles que eram crianças no lançamento do primeiro “Toy Story”, já que, devido a distancia de 15 anos entre os filmes, estes jovens provavelmente também estavam na faculdade em 2010 e, portanto, o crescimento de Andy reflete a própria trajetória deles.

Ao contrário de Andy, que foi obrigado a deixar seus brinquedos para trás, as novas gerações podem comemorar, pois os filmes da trilogia “Toy Story” são brinquedos que podemos guardar eternamente e até mesmo voltar a “brincar” com eles sempre que quisermos. Esta é a magia do cinema. Esta é a magia da Pixar, que provou nesta trilogia ter o poder de – com o perdão do trocadilho – ir “ao infinito e além!”.

Texto publicado em 24 de Fevereiro de 2012 por Roberto Siqueira

19 comentários sobre “TOY STORY 3 (2010)

  1. Natanael barros 29 setembro, 2018 / 11:53 pm

    Assisti esse filme pela primeira vez agora em 2018… me acabei de chorar no final… na despedida… não aconselho a cardíacos.

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  2. Sergio Leone 29 janeiro, 2013 / 11:58 pm

    Aiás é de longe o filme mais regular da pixar, mas não é ruim e diverte

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  3. Sergio Leone 29 janeiro, 2013 / 11:55 pm

    Me desculpem, mas achei esse filme desnecessário. Há filmes com necessidade de desenvolvimento do desfecho como foi na trilogia do Senhor dos anéis, Kill Bill, Toy story 1 e 2 – o que não os considero continuações. Na minha opinião continuações são como por exemplo as do exterminador do futuro 1 e 2, de volta para o futuro, indina jones, star wars. Apesar de considerar essas ótimas, não sou muito fã de continuações.
    A pixar ESTAVA tão bem com a política anti-sequências, agora é só decepção. Toy Story 3 repete a receita dos brinquedos que se perdem do dono e tentam achar o caminho de volta; Há o vilão fofinho; tudo com um ar nostálgico carregado de uma enorme carga dramática. É de longe o melhor da pixar.
    Se for para intitular uma obra prima da pixar, o mérito seria para o cativante procurando nemo ou até mesmo o wall-e ou o originalíssimo monstros s.a.. Até o bom Ratatouille é melhor que aquele.
    Pra mim não passa de regular e olha que eu gosto de filmes nostálgicos.

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    • Roberto Siqueira 3 fevereiro, 2013 / 8:01 am

      Olá Sergio,
      Apesar de confuso (“É de longe o melhor da pixar” / “Pra mim não passa de regular”), acho que compreendi o que quer dizer.
      Mas discordo completamente. Encerrar a trajetória de crescimento de Andy era essencial para completar a mensagem de perda da inocência da trilogia.
      Pra mim, este é o melhor filme da trilogia, e olha que adoro os outros dois.
      Abraço.

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    • Sergio 6 fevereiro, 2013 / 11:19 pm

      Olá,
      Ficou confuso porque errei mesmo e tentei corrigir na frase acima.
      Repito não o achei ruim, e até chega a ser engraçado em alguns momentos.
      Só acho que este é supervalorizado.
      Sobre o site, legal esses espaços onde o assunto é cinema! Discutir cinema é sempre bom
      abraço.

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    • Roberto Siqueira 12 fevereiro, 2013 / 9:36 pm

      Obrigado pelo comentário e pelo elogio ao site Sergio.
      Abraço.

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  4. Anônimo 20 novembro, 2012 / 12:31 am

    Melhor filme de animação q já assisti e ponto final.
    E aproveitando, vc deveria fazer uma crítica de labirinto do fauno, belíssimo filme.

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    • Roberto Siqueira 20 dezembro, 2012 / 11:03 pm

      Farei quando chegar o ano dele.
      Abraço.

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  5. Antonio Júnior 9 maio, 2012 / 11:06 am

    Obra prima com cinco estrelas!!! Minha filha não se cansa de assistir e olhe que ela só tem 2 anos e seis meses.Bela crítica você escreve divinamente.Parece quando lemos suas criticas estamos é assistindo aos filmes!!!! Parabéns.

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    • Roberto Siqueira 9 maio, 2012 / 11:40 pm

      Olá Antonio,
      Obrigado pelo elogio, fico lisonjeado.
      Meu filho também tem 2 anos e adora Toy Story 3.
      Abraço.

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  6. Achilles de Leo 6 março, 2012 / 11:29 am

    Lindo! Lindo! Lindo! LINDÌSSIMA crítica, Beto! Voltei a sentir muitas das emoções que mexeram comigo quase dois anos atrás.

    Eu fui ao cinema com a minha mãe assistir a essa obra de arte. Eu tinha ACABADO de me mudar de casa, estava morando sozinho há menos de uma semana.

    Você consegue imaginar nossa reação a esse filme?

    Lembrando que eu tinha 23 anos quando o filme foi lançado. Sou um dos que era criança no lançamento do primeiro.

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    • Roberto Siqueira 23 março, 2012 / 10:43 pm

      Que legal Achilles, fiquei MUITO feliz que curtiu a crítica!
      Imagino como foi emocionante pra você, por toda a situação. Realmente é uma obra de arte, ainda mais valiosa para a sua geração, que teve o privilégio de crescer junto com Andy, ao lado de Woody, Buzz e Cia.
      Um grande abraço e obrigado pelo comentário.

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  7. Anônimo 25 fevereiro, 2012 / 2:15 pm

    Parabens pela critica, esse filme realmente mexe muito conosco. Me lembro que quando era guri, gostava muito de jogar futebol de botao, entao quando vim morar em londres, foi muito dificil deixa -los para tras, me lembro que eu nao aceitava a ideia de joga-los fora, por isso tambem os guardei numa caixa, como um respeito pelos todos os momentos felizes e inspiradores que eu tive. E por ter o poder de me lembrar novamente dessa epoca gostosa da minha vida, pra mim esse filme e nota dez.

    Vinicius Fernandes

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    • Roberto Siqueira 26 fevereiro, 2012 / 9:00 am

      Obrigado pelo elogio.
      Seu comentário é muito interessante Vinicius, uma história bem legal. Parabéns!
      Abraço.

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  8. Cross98 24 fevereiro, 2012 / 6:40 pm

    Legalzinho o filme, mas acho um grande exagero classificar ele como obra prima

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    • Roberto Siqueira 26 fevereiro, 2012 / 8:59 am

      Acredite Mateus, não é exagero.
      Quando você estiver adulto e olhar para o seu passado, este filme certamente trará lembranças deliciosas e emocionantes, pode acreditar.
      Abraço.

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