(North by Northwest)
Filmes em Geral #62
Dirigido por Alfred Hitchcock.
Elenco: Cary Grant, Eva Marie Saint, James Mason, Jessie Royce Landis, Leo G. Carroll, Josephine Hutchinson, Philip Ober e Martin Landau.
Roteiro: Ernest Lehman.
Produção: Herbert Coleman e Alfred Hitchcock (não creditado).
[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].
Contando com muitos dos componentes narrativos clássicos de Alfred Hitchcock, “Intriga Internacional” é um empolgante thriller de perseguição, que apresenta ainda um curioso subtexto sexual, bastante ousado para a época. Com a loira fatal, o famoso macguffin (neste caso, o agente “Kaplan”), o conturbado relacionamento entre mãe e filho e cenas recheadas com o mais puro suspense, o longa se estabelece como uma obra marcante, ainda que inferior às obras-primas lançadas um ano antes (“Um Corpo que Cai”) e um ano depois (“Psicose”) pelo mestre do suspense.
Confundido com um agente do governo conhecido como Kaplan, o publicitário Roger (Cary Grant) acaba seqüestrado por uma gangue de espiões, que tenta assassiná-lo. Após escapar milagrosamente, ele se envolve em novos incidentes, passando a ser procurado não apenas pelos espiões, mas também pelo governo americano. Mas, no caminho, ele encontra o auxilio da misteriosa Eve (Eva Marie Saint), que parece querer ajudá-lo.
Escrito por Ernest Lehman, o bom roteiro de “Intriga Internacional” conta a história de Roger, um homem inocente envolvido acidentalmente numa trama complexa. Como podemos notar, trata-se de mais uma versão da história favorita de Alfred Hitchcock. Desta vez, o homem é confundido com uma pessoa que não existe, inventada pelo governo para despistar uma rede de espiões, que, numa das coincidências do destino, passa a achar que Roger é o agente secreto e tenta assassiná-lo. A partir daí, o complexo roteiro envolve o personagem numa série de situações que só pioram sua condição, até que ele encontre a loira fatal Eve, dando início a outro subtexto da trama, com clara conotação sexual. Estes dois aspectos tornam a narrativa ainda mais interessante, e Hitchcock conduz tudo isto com precisão, criando momentos marcantes, como o primeiro encontro entre Eve e Roger e a fuga desesperada dele do prédio das Nações Unidas. Além disso, o diretor emprega interessantes movimentos de câmera, como aquele que revela os dois homens que arrastarão Roger para dentro do carro após ouvirem a palavra chave “Kaplan”, além de criar planos impressionantes, como aquele em que vemos as ruas do alto do prédio de onde Roger foge.
Ainda na parte técnica, os ternos e gravatas escolhidos denotam seriedade e profissionalismo ao grupo de criminosos, tornando-os mais temíveis. Já os detalhes da mansão de Townsend, como a biblioteca gigante que intimida Roger, revelam a boa direção de arte de William A. Horning e Merrill Pye. E se a fotografia de Robert Burks emprega cores vivas na maior parte do tempo, tornando-se obscura na medida em que se aproxima do tenso final, a trilha sonora de Bernard Herrmann pontua as cenas com precisão, como quando indica que Roger está sendo seqüestrado e quando embala o beijo romântico de Eve e Roger no trem.
Inicialmente, temos dúvida se Roger é ou não é a pessoa procurada, mas rapidamente temos a certeza de que se trata de um engano, muito por causa da boa atuação de Cary Grant, que nos convence de sua inocência. Seqüestrado e perseguido por engano, Roger se vê numa situação inusitada, procurado pelos espiões e também pela polícia, vivendo sob constante aflição enquanto tenta provar sua inocência. Entre os bons momentos do ator, vale destacar a cena em que Roger é largado bêbado num carro, em que, apesar da falta de realismo (o back projection não envelheceu bem), Grant faz bem o papel do homem alcoolizado e salva a estranha seqüência na estrada. O ator transmite a segurança que o personagem exige, se saindo bem nas cenas que exigem esforço físico e exibindo ainda charme diante das mulheres. Outro aspecto interessante do personagem é o profundo respeito que Roger demonstra pela mãe, que não acredita nele durante a investigação do caso da bebedeira, fazendo o personagem perder crédito diante da polícia (outro tema muito abordado por Hitchcock, a conturbada relação entre mãe e filho).
Enquanto isto, Eve, a loira do trem interpretada com sensualidade por Eva Marie Saint, faz o típico papel da mulher fatal, envolvendo Roger ao mesmo tempo em que parece tentar salvá-lo. Seus diálogos picantes no trem têm clara conotação sexual, confirmando a ousadia do mestre já demonstrada em outros filmes e escancarada aqui. Só que o olhar dela após beijá-lo indica algo suspeito, confirmado pelo bilhete que ela lê em seguida. Eve trabalha para o falso “Townsend” e, por isso, evita o contato mais íntimo com Roger na despedida, pois não quer se envolver emocionalmente. Mas, no fim das contas, a moça já estava apaixonada por ele, passando a ajudá-lo ao mesmo tempo em que é obrigada a dormir com o principal perseguidor dele – e aí reside a ousadia temática do longa, que, assim como em “Interlúdio”, obriga a personagem a dormir com o inimigo.
Um dos problemas do longa está na montagem do costumeiro colaborador de Hitchcock, o bom George Tomasini, que desta vez erra a mão ao esticar demais algumas cenas. Por outro lado, Tomasini acerta e muito nas empolgantes seqüências de ação, como a famosa cena no milharal e a perseguição final no monte Rushmore, as duas melhores do longa, conduzidas com maestria por Hitchcock. Repare, por exemplo, a primeira delas. Enquanto Roger aguarda por “Kaplan”, o plano diminui o personagem na estrada, ilustrando o quanto ele estava isolado naquela situação, até que um avião surge no horizonte e inicia uma verdadeira caçada em campo aberto. Observe como Hitchcock constrói o momento com calma, primeiro fazendo alguns carros passarem pelo local, e depois, após a chegada de outro homem, prolongando ao máximo o momento enquanto Roger tenta puxar conversa até ser interrompido pela chegada do ônibus que levará aquele estranho – destaque para a composição visual da cena em que vemos aqueles dois homens solitários na estrada. Quando o avião repentinamente vem na direção dele, o susto é inevitável. Finalmente, vale destacar que toda a cena é conduzida apenas com o som diegético, sem apelar para a trilha sonora, o que é bastante interessante. O único problema está na irreal batida do avião num caminhão. Já na cena final, a fotografia obscura de Robert Burks aumenta a tensão enquanto Roger tenta resgatar Eve na mansão de Vandamm (James Mason), o falso “Townsend” que persegue “Kaplan”, em outra cena conduzida com precisão pelo diretor, que trabalha nos pequenos detalhes para aumentar o suspense até chegar à eletrizante perseguição noturna que fecha a narrativa.
Com pequenos problemas, especialmente no realismo de algumas cenas, “Intriga Internacional” é um thriller de perseguição eficiente, mas que nunca chega a ser brilhante. Ainda assim, diverte e apresenta cenas marcantes, dividindo a narrativa em duas vertentes claras: a ação física e empolgante durante a perseguição e a conotação sexual ousada da relação entre Roger e Eve. Por isso, mesmo com pequenos problemas, trata-se de um grande filme.
Olá, Roberto. Ótima crítica. Li não sei onde que na tomada do trem entrando no túnel representa o ato sexual, mesmo que seja só uma ideia. Será?
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Pode ser Celso.
Abraço.
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Olá Roberto, ótima crítica; também concordo que o filme tem uma trama complexa e que hitchcock soube dar ritmo muito bem, com cenas marcantes para época. A conotação sexual nos diálogos entre Roger e Eve, não nos deixa perceber sua real intensão e torna o filme mais atraente, com várias possibilidades de desfecho. Outro detalhe que me chamou atenção é o figurino, como o mestre do suspense sabe vestir bem seus personagens. O também apresenta uma boa composição de cenário e uma fotografia sofisticada para época, com ótimos lances de câmera e uma trilha sonora envolvente que faz o filme falar por si só.
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Olá Fernando,
Obrigado pelo elogio e pelo comentário, quase uma pequena crítica (muito interessante, aliás). 😉
Fique à vontade para comentar sempre que quiser.
Um grande abraço.
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Olá Roberto, mais uma ótima análise. Mesmo não sendo uma obra prima do nível de Psicose e Janela Indiscreta, ainda assim este ‘Intriga’ é um clássico do suspense que influenciou diretamente a ‘chuva’ de filmes sobre espionagem que surgiram na década de 60, principalmente os da série James bond. Enfim mais um grande momento deste genial Hitchcock. Grande Abraço!
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Olá Francisco,
Obrigado pelo elogio e pelo comentário. Estava fazendo falta por aqui.
Abraço!
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