MELHOR É IMPOSSÍVEL (1997)

(As good as it gets)

5 Estrelas 

Videoteca do Beto #177

Dirigido por James L. Brooks.

Elenco: Jack Nicholson, Helen Hunt, Greg Kinnear, Cuba Gooding Jr., Skeet Ulrich, Shirley Knight, Yeardley Smith, Lupe Ontiveros, Missi Pyle, Maya Rudolph, Lawrence Kasdan, Julie Benz, Harold Ramis, Kathryn Morris, Todd Solondz e Jesse James.

Roteiro: Mark Andrus e James L. Brooks.

Produção: James L. Brooks, Bridget Johnson e Kristi Zea.

Melhor é Impossível[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Recordista de indicações ao Oscar, Jack Nicholson levou seu terceiro prêmio após sua brilhante atuação neste “Melhor é Impossível”, que, com seus personagens simultaneamente problemáticos e agradáveis, conquista o espectador quase que da mesma maneira como o protagonista conquista a personagem brilhantemente interpretada por Helen Hunt. Assim, não são raros os momentos graciosos que são quebrados por alguma grosseria e vice-versa, numa mistura eficiente de instantes dramaticamente densos e outros recheados de humor negro; e é ao balancear estes polos opostos com tanto cuidado que o longa dirigido por James L. Brooks alcança seu sucesso.

Escrito pelo próprio Brooks ao lado de Mark Andrus, “Melhor é Impossível” narra o cotidiano do obsessivo-compulsivo e preconceituoso escritor Melvin Udall (Jack Nicholson), um homem repleto de cinismo e sarcasmo que adora tirar uma onda com seu vizinho homossexual Simon (Greg Kinnear) e que faz questão de ser sempre atendido pela mesma garçonete no restaurante onde almoça todos os dias. A garçonete é Carol (Helen Hunt), uma mãe solteira que se desdobra para cuidar do filho, que sofre com uma grave doença respiratória.

Desenvolvendo muito bem seus personagens, o roteiro de “Melhor é Impossível” ajuda a humanizar cada um deles, demonstrando aos poucos as qualidades e defeitos de pessoas que facilmente poderiam tornar-se caricatas e odiáveis em mãos menos cuidadosas – e na pele de atores menos talentosos. Neste caso, o que ocorre é exatamente o contrário. Os personagens conquistam o espectador justamente por escancararem seus defeitos de maneira tão humana, o que naturalmente os aproximam da plateia.

Atrás das câmeras, Brooks faz um trabalho discreto e eficiente que busca valorizar as atuações através do uso de planos americanos e closes, empregando ainda o zoom para realçar momentos de impacto dramático e saindo-se muito bem na condução de cenas fortes como aquela em que um grupo de jovens de rua espanca Simon (numa rápida participação dos atores Skeet Ulrich e Jamie Kennedy, de “Pânico”, na qual se destaca o ótimo trabalho de maquiagem que torna realistas os machucados no rosto dele na cena seguinte no hospital). Igualmente discreta, a fotografia de John Bailey aposta em cenas diurnas e filtros que realçam cores leves, ao passo em que a gostosa trilha sonora de Hans Zimmer apresenta um tema principal inspirado, mas que também surge apenas em momentos pontuais. Desta forma, quem acaba chamando mais a atenção é o trabalho do montador Richard Marks, que transita muito bem entre o drama de Carol com a doença do filho, as rotinas de Melvin e o trabalho de Simon e Frank, integrando os personagens de maneira orgânica e mantendo a narrativa sempre atraente e fluída.

Planos americanosGrupo de jovens de rua espanca SimonCores levesNo entanto, é inegável que o grande atrativo de “Melhor é Impossível” é mesmo o seu elenco talentoso e inspirado, que oferece performances simultaneamente divertidas e tocantes. Vivendo um personagem preconceituoso e (desculpe o termo) escroto, Nicholson tem um desempenho excepcional, saindo-se muito bem na difícil tarefa de conquistar a empatia da plateia mesmo na pele de alguém tão desprezível. Destilando veneno em muitas de suas frases sarcásticas, Melvin poderia tornar-se ainda mais irritante por sofrer de TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), o que faz com que ele sente sempre na mesma mesa do restaurante, evite pisar nas linhas do chão, deteste ser tocado por outras pessoas, organize milimetricamente os sabonetes da mesma marca em seu armário e feche a porta do apartamento cinco vezes. E se ainda assim nós gostamos dele, grande parte do mérito é mesmo do lendário ator.

Senta sempre na mesma mesaEvita pisar nas linhas do chãoOrganiza milimetricamente os sabonetesPersonagem complexo, Melvin consegue ser egoísta e egocêntrico e, ao mesmo tempo, é capaz de agir com surpreendente gentileza e encantar Carol com a bela frase “Você me faz querer ser um homem melhor”, somente para, minutos depois, estragar tudo com outra frase detestável. Este comportamento imprevisível fica ainda mais claro quando ele choca uma fã na editora, escancarando a intrigante diferença entre o autor sensível e o ser humano desprezível que conflitam dentro dele.

Mas se Nicholson surge solto e diverte-se no papel, Hunt não fica atrás, demonstrando excelente química com o consagrado ator numa atuação sensível e poderosa. Externando os traumas ocasionados por relacionamentos passados (“Não vou dormir com você!”, diz ela para Melvin), Carol emociona pela maneira como admite sua carência num belíssimo diálogo com a mãe, num dos grandes momentos da atuação de Hunt, que se destaca ainda na reação dramaticamente poderosa de Carol após Melvin mencionar seu filho no restaurante, que dá os primeiros sinais de sua vulnerabilidade e, especialmente, quando demonstra a alegria genuína da personagem diante do médico que oferece tratamento para seu filho, num momento tocante. Lentamente, Carol vai reencontrando a felicidade, algo simbolizado até mesmo por suas roupas (figurinos de Molly Maginnis), que evoluem lentamente das cores sem vida de seu uniforme para o vestido vermelho e chamativo que ela usa durante um jantar.

Belíssimo diálogo com a mãeReação dramaticamente poderosaAlegria genuínaCom seus trejeitos e a forte tendência para o overacting, Cuba Gooding Jr. diverte-se como Frank, o amigo engraçado e falastrão de Simon que se impõe fisicamente diante de Melvin, enquanto Kinnear demonstra muito bem a sensibilidade de Simon, emocionando em momentos especiais como quando vê seu rosto desfigurado pela primeira vez num espelho ou quando, com a ajuda de Carol, se empolga após conseguir romper o bloqueio criativo. Aliás, sua bagunçada casa reflete não apenas sua mente agitada (essencial em sua profissão), mas também sua instabilidade emocional, o que ressalta o bom design de produção de Bill Brzeski.

Amigo engraçado e falastrãoSensibilidade de SimonBagunçada casaQuem também tem participação importante na narrativa é o cachorro de Simon, explorado com competência pela câmera de Brooks, como no close que capta sua reação após Melvin receber a notícia que terá que devolvê-lo – numa das primeiras cenas que escancaram a fragilidade daquele homem solitário, que se esconde sob aquela capa de cinismo e sarcasmo. E fechando o elenco, temos a simpática mãe de Carol interpretada por Shirley Knight e a participação do diretor Lawrence Kasdan como o Dr. Green.

Quando o casal se desentende e se separa durante a viagem, sabemos que estamos perto do final conciliador, típico das comédias românticas. Mas até mesmo este clichê funciona muito bem em “Melhor é Impossível”, justamente pela maneira sincera e coerente que os personagens se comportam, buscando a reaproximação sem exigir que o outro mude completamente. E o que é mais interessante, o espectador sabe que eles continuarão exibindo os mesmos defeitos, e mesmo assim nós torcemos pelo sucesso daquela relação. Afinal, somos mesmo assim, repletos de defeitos e virtudes e eternamente buscando alguém que nos compreenda em toda nossa complexidade e vulnerabilidade.

Cachorro de SimonSimpática mãe de CarolCasal se desentendeFilme com alma e coração, “Melhor é Impossível” beneficia-se das atuações de alto nível para tocar o espectador sem jamais pender para o melodrama ou soar piegas, divertindo e emocionando com a mesma eficiência. Não é o caso de dizer que melhor que isso é impossível. Mas quase.

Melhor é Impossível foto 2Texto publicado em 20 de Outubro de 2013 por Roberto Siqueira

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