STAR WARS EPISÓDIO I: A AMEAÇA FANTASMA (1999)

(Star Wars: Episode I – The Phantom Menace)

3 Estrelas 

 

Videoteca do Beto #232

Dirigido por George Lucas.

Elenco: Liam Neeson, Ewan McGregor, Natalie Portman, Jake Lloyd, voz de Ahmed Best, Ian McDiarmid, Oliver Ford Davies, Hugh Quarshie, Keira Knightley, Pernilla August, voz de Anthony Daniels, voz de Kenny Baker, voz de Frank Oz, Samuel L. Jackson, Ray Park, Silas Carson, Terence Stamp, voz de Andy Secombe, voz de Brian Blessed e voz de Lewis Macleod.

Roteiro: George Lucas.

Produção: Rick McCallum.

star-wars-episodio-i-a-ameaca-fantasma[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Quando o famoso letreiro começou a subir a tela escura dos cinemas 16 anos depois de “Star Wars Episódio VI: O Retorno de Jedi” encerrar a primeira trilogia a empolgação foi inevitável para os milhões de fãs espalhados pelo mundo. Afinal de contas, a saga criada por George Lucas é um dos maiores símbolos do fascínio que a sétima arte pode provocar nas pessoas. No entanto, com o desenrolar do longa a alta expectativa se transforma e, nos casos mais graves, acaba revertendo-se em decepção, ainda que “A Ameaça Fantasma” cumpra seu papel principal e prepare o terreno para os longas seguintes, o que é pouco para transformá-lo num grande filme, mas o suficiente para salvá-lo.

Novamente escrito por George Lucas, que também retornava a direção, “Star Wars Episódio I: A Ameaça Fantasma” adota a estrutura de prequel para nos levar ao início da história contada nos três filmes lançados anteriormente, quando a Federação Comercial bloqueia as rotas para o planeta Naboo e os Jedis Qui-Gon Jinn (Liam Neeson) e Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor) são enviados pela rainha Amidala (Natalie Portman) para fazer um acordo, mas o plano não sai como previsto e eles acabam se refugiando no distante planeta Tatooine, onde descobrem um garoto especial que parece ser o escolhido para trazer o equilíbrio para a Força. Seu nome é Anakin Skywalker (Jake Lloyd).

Analisando friamente, a missão de “A Ameaça Fantasma” não era nada fácil, já que, por mais inspirada que fosse a abordagem de George Lucas, resgatar uma saga adorada por milhões de pessoas obviamente poderia provocar grandes decepções, tamanha a expectativa criada tantos anos depois. No entanto, inspiração não é exatamente a palavra mais adequada para descrever o roteiro de Lucas, que constrói uma narrativa rasa e aposta todas as fichas na parte visual para ter sucesso. Ainda assim, o longa traz momentos bem interessantes ao nos permitir conhecer a origem de personagens tão queridos como C-3PO (voz de Anthony Daniels), R2D2 (voz de Kenny Baker) e o próprio Obi-Wan, além de pavimentar o caminho da construção do arco dramático de um dos personagens mais icônicos da história do cinema.

Outro aspecto interessante do roteiro (e de toda a saga, aliás) são as articulações políticas e seu impacto na sociedade, que escancaram a alegoria que “Star Wars” claramente representa e que muitos fãs parecem ignorar. Por outro lado, o desnecessário conceito dos midi-chlorians é bem questionável, soando como um recurso de última hora de Lucas para justificar certas escolhas, numa espécie de comprovação científica de algo intangível, como a indicação de que Anakin teria potencial para tornar-se um Jedi mais poderoso até do que Yoda, o que também justificaria a relutância dos Jedis em treiná-lo e desenvolver sua capacidade, percebendo que todo este poder poderia se transformar em algo trágico se canalizado de forma errada.

Para delírio dos fãs, aliás, os Jedis impõem respeito logo na abertura de “A Ameaça Fantasma”, desfilando golpes enquanto fogem do planeta Naboo. Sempre sereno e transmitindo a habitual virilidade, Liam Neeson encarna Qui-Gon com naturalidade e forte presença na tela, o que torna sua morte ainda mais surpreendente, especialmente por representar o fim da linha para um ator de seu calibre na saga, mas ao menos a cena serve para confirmar que Obi-Wan está pronto, o que teria enorme importância nos outros episódios, especialmente por que caberia a ele a missão de treinar o promissor Anakin. E por falar em Obi-Wan, Ewan McGregor também se sai bem como o jovem Jedi, assumindo um papel de grande responsabilidade sem sentir o enorme peso do personagem que vive e criando empatia tanto com Qui-Gon quanto com Anakin.

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Mesmo criança, Anakin já desponta como alguém confiante e destemido, muito também por conta da boa atuação de Jake Lloyd. À vontade no papel de um verdadeiro mito, Lloyd consegue transmitir características importantes na formação da personalidade de Anakin, com suas expressões marcantes e seu jeito questionador aliando-se à coragem e a sua curiosidade e sede de aprender. Obviamente, uma personalidade tão forte poderia ser trabalhada de forma positiva ou negativa e o restante da saga se encarregaria de demonstrar isso. No entanto, sua participação decisiva no confronto espacial no clímax da narrativa realça a importância do personagem e o status de lenda que ele alcançaria muito em breve, para o bem e para o mal. Neste sentido, é louvável que Lloyd consiga transmitir empatia mesmo vivendo uma espécie de embrião de um dos maiores vilões da história. E assim como ocorre em outros momentos da saga, Lucas insere pitadas de conceitos inspirados no cristianismo ao trazer a mãe de Anakin afirmando que ele não tem pai, numa clara alusão ao messias.

Entre os destaques do elenco, vale citar ainda a amável Natalie Portman que empresta doçura e carisma a Padmé, especialmente quando conversa com o menino Anakin, contrastando com suas rígidas expressões na pele da suposta rainha Amidala – e a revelação de que Padmé na realidade é a rainha não surpreende devido a maneira pouco cuidadosa que Lucas trabalha a questão e pela forma que ela se comporta diante de Anakin, indicando a reviravolta através de diálogos e gestos que demonstram sua autoridade e sabedoria. Ian McDiarmid também transmite autoridade em seu olhar e suas expressões faciais na pele de Palpatine, que articula sua indicação para determinado cargo importante e evidencia seu poder de persuasão que seria crucial nos outros episódios – repare também como quando os Jedis comentam que os Siths sempre surgem em dois e questionam se quem teria sido destruído seria o mestre ou o aprendiz a câmera imediatamente foca em Palpatine, sugerindo sua conexão com eles.

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Diante de tantos personagens interessantes é realmente uma pena que Lucas tenha apostado novamente no desnecessário alívio cômico. Assim, logo no início somos apresentados ao personagem que quase arruína toda a experiência de assistir “A Ameaça Fantasma”. Com sua voz irritante e seu comportamento extremamente infantil, Jar Jar Binks (voz de Ahmed Best) não agrega em momento algum do longa, incomodando constantemente o espectador pela quebra de ritmo e de clima que suas intervenções representam. Um exemplo claro ocorre na conversa durante um jantar na casa de Anakin sobre a situação dos escravos e o sonho do jovem garoto de libertar aquele povo, repentinamente interrompida pelo comportamento de Jar Jar Binks, o que supostamente era para ser engraçado, mas acaba soando totalmente deslocado e sem propósito.

No entanto, se a falta de criatividade do roteiro e a presença de Jar Jar Binks não conseguem arruinar a experiência, muito se deve obviamente à força dos personagens e do universo criado por Lucas nos longas anteriores, mas é inegável também que a qualidade visual de “A Ameaça Fantasma” contribui bastante para salvá-lo. Particularmente preocupado em apresentar ao mundo as maravilhas da ILM, Lucas aproveita todo o aparato tecnológico que tem a disposição para explorar os planetas imaginados pelo design de produção de Gavin Bocquet e que ganham vida com os excepcionais efeitos visuais, nos transportando para aqueles locais e criando sequências visualmente marcantes, que chamam a atenção também pelo contraste entre os tons azulados adotados pelo diretor de fotografia David Tattersall no espaço e os tons quentes no senado e no árido planeta Tatooine, que por sua vez destoam do festival de cores que dominam Naboo, graças também aos figurinos escolhidos por Trisha Biggar, que mantém o padrão mais sóbrio na capital, apostando em roupas mais exóticas em Naboo e em roupas mais velhas e desgastadas em Tatooine, demonstrando as diferenças entre eles. Este contraste também se manifesta nas casas simples que dominam o deserto de Tatooine e nos enormes prédios que formam o skyline da capital, refletindo bem as desiguais condições de vida impostas pelo Império e que dão margem para diversas análises sócio-econômicas e políticas da alegoria que “Star Wars” representa.

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Colaborando nesta ambientação, o igualmente competente design de som se destaca tanto nos momentos de forte impacto como explosões e tiroteios quanto pela criatividade e atenção aos detalhes que compõem os pequenos e sensíveis efeitos sonoros criados para equipamentos como os utilizados na corrida e personagens como a dupla Sebulba (voz de Lewis Macleod) e Watto (voz de Andy Secombe) – repare o som da batida das asas dele, por exemplo. Já a trilha sonora do mestre John Williams nos lembra dos longas anteriores ao marcar presença constante, sublinhando diversos momentos com precisão e conferindo uma aura épica a batalha final. Da mesma forma, a montagem da dupla Ben Burtt e Paul Martin Smith homenageia a primeira trilogia ao utilizar fades, sendo muito importante também em momentos chave como a batalha onde alterna entre o espaço, Naboo e o “truelo” de sabres de luz num ritmo sempre interessante ou a empolgante corrida na qual alterna entre os diversos competidores e a plateia, neste que certamente é um dos momentos mais inspirados da direção de Lucas.

Presenteando os fãs com alguns momentos marcantes como o citado “truelo” de sabres de luz entre dois Jedis e o lorde Sith Darth Maul vivido de maneira discreta por Ray Park, Lucas se destaca especialmente na batalha final, nem tanto pelo conflito ocorrido em terra firme, mas especialmente pela enérgica batalha espacial, repleta de movimentos de câmera interessantes que nos jogam pra dentro do confronto – e repare como nem mesmo no momento mais tenso da narrativa Jar Jar Binks dá sossego ao espectador, com suas gags nada inspiradas que só servem para desconcentrar a plateia. Novamente, Lucas encerra a narrativa com uma festa, evidenciando que a estrutura da nova trilogia traria similaridades com a anterior (já que o episódio IV também terminava com uma festa) e realçando sua preocupação em jogar o espectador pra fora da sala de projeção com a sensação de alegria, ainda que neste caso ela possa soar falsa e não resistir ao tempo – e felizmente este desfecho artificialmente alegre não se repetiria, cedendo espaço para um tom mais sombrio que lentamente dominaria a nova trilogia.

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Apesar de ter seus bons momentos, “A Ameaça Fantasma” é claramente prejudicado pelo erro de tom na abordagem de Lucas, especialmente quando Jar Jar Binks entra em cena com seu humor descabido e nada inspirado. A infantilização da série já anunciada em “Star Wars Episódio VI: O Retorno de Jedi” através dos ewoks ainda persistia aqui. Por tudo isso, “A Ameaça Fantasma” até funciona como um filme de preparação para a construção da mitologia. O problema é que em 1999 ela já estava formada no imaginário de muita gente, o que não impediu muitos fãs de se deliciarem ao verem seus queridos personagens na telona – em muitos casos, pela primeira vez. 

star-wars-episodio-i-a-ameaca-fantasma-foto-2Texto publicado em 30 de Setembro de 2016 por Roberto Siqueira

STAR WARS EPISÓDIO VI: O RETORNO DE JEDI (1983)

(Star Wars: Episode VI – The Return of the Jedi)

 

Videoteca do Beto #71

Dirigido por Richard Marquand.

Elenco: Mark Hamill, Harrison Ford, Carrie Fisher, Billy Dee Williams, Alec Guinness, Anthony Daniels, Kenny Baker, Peter Mayhew, Sebastian Shaw, David Prowse, James Earl Jones, Ian McDiarmid, Frank Oz e Michael Pennington.

Roteiro: George Lucas e Lawrence Kasdan, baseado em história de George Lucas.

Produção: Howard G. Kazanjian.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Visivelmente buscando agradar o público mais jovem e apostando alto nos resultados da bilheteria, “Star Wars Episódio VI: O Retorno de Jedi” só não é uma decepção porque consegue finalizar, ainda que sem grande brilho, a maravilhosa saga espacial de George Lucas. Infelizmente, investe numa narrativa leve, que escancara o apelo infanto-juvenil crescente na saga, e por isso jamais explora o potencial que o capítulo final da série realmente oferecia após o excepcional “O Império Contra-Ataca”.

O temível Darth Vader (David Prowse, voz de James Earl Jones), supervisionado de perto pelo poderoso Imperador (Ian McDiarmid), acompanha a construção da nova Estrela da Morte, uma estação que será capaz de aniquilar as tropas rebeldes do universo. Enquanto isso, Luke Skywalker (Mark Hamill) parte para libertar Han Solo (Harrison Ford), a princesa Leia (Carrie Fisher), R2D2 (Kenny Baker), 3-CPO (Anthony Daniels) e Chewbacca (Peter Mayhew) das mãos do cruel Jabba. Após a fuga, todos se envolvem numa batalha galáctica contra o império antes que este conclua a construção da Estrela da Morte.

Após o excelente segundo filme da série, que além de explorar com competência o potencial sombrio do universo Star Wars, apresentava ainda uma revelação empolgante, responsável por elevar a níveis insuportáveis a ansiedade dos fãs para o capítulo final, a saga espacial de George Lucas chegava ao seu capítulo final. Infelizmente, porém, todo o excelente trabalho feito no filme anterior não foi explorado em “O Retorno de Jedi”. Nitidamente, a série preferiu seguir pelo caminho mais lucrativo, adotando uma narrativa mais leve na tentativa de atrair o público jovem (responsável pelas grandes bilheterias da época). Sendo assim, não faltam cenas que abusam do bom humor, o que contrasta diretamente com o tom pessimista de “O Império Contra-Ataca”, como podemos perceber na humorada cena do ritual em que 3-CPO é declarado uma divindade e se recusa a salvar seus amigos da fogueira, quando o mesmo 3-CPO diz para R2D2 que “não é hora para heroísmo” na batalha no planeta dos ewoks ou quando Han grita “consegui!” somente para ver a porta se fechar na sua cara em seguida. Além disso, Lucas infantiliza de vez a série ao inserir na narrativa os ewoks, uma espécie de ursinhos de pelúcia sem a menor graça (ele já havia feito algo parecido ao inserir anões peludos em “THX 1138”, seu filme de estréia). Por outro lado, o roteiro, baseado em história de George Lucas e escrito pelo próprio Lucas, auxiliado por Lawrence Kasdan, apresenta interessantes rimas narrativas com os filmes anteriores, como quando Han diz para Leia “eu te amo” e recebe um “eu sei” como resposta e quando Luke corta a mão de Darth Vader na batalha de sabres de luz.

Todos estes problemas de roteiro poderiam ser amenizados nas mãos de um grande diretor. Só que “grande diretor” não é uma definição adequada para Richard Marquand. Apesar de acertar a mão nas cenas que exigem mais ação, como as batalhas no espaço e no planeta dos ewoks, o diretor erra na condução da narrativa ao estender demais o resgate de Han Solo, prejudicando a seqüência mais interessante do longa, que é o ataque à Estrela da Morte e o esperado confronto final entre o império e os rebeldes. Além disso, Marquand também prefere preservar o tom leve da narrativa, evitando nos chocar, por exemplo, quando não mostra o resultado do ataque feroz do monstro criado por Jabba contra uma vítima indefesa que cai em seu covil por acidente, o que por conseqüência, enfraquece este vilão diante do espectador quando Luke o enfrenta no mesmo local. Ainda assim, o diretor tem seus acertos, como quando diminui o comandante em cena, após bronca de Vader por causa do atraso na construção da nova Estrela da Morte, ilustrando sua impotência diante do grande vilão. Marquand também acerta ao nos colocar sob o ponto de vista de Luke e Leia na empolgante seqüência da perseguição em alta velocidade na floresta a bordo das motos voadoras. E finalmente, o diretor merece crédito também pela condução do esperado confronto entre Darth Vader e Luke Skywalker, numa seqüência carregada de tensão, até pelo arco dramático vivido pela dupla.

Mas se apresenta problemas de roteiro e direção, não podemos dizer o mesmo quando falamos dos aspectos técnicos de “O Retorno de Jedi”. Mantendo a tradição da série, os efeitos visuais da Industrial Light & Magic são excelentes, como podemos notar quando as naves sobrevoam o deserto e, principalmente, nas batalhas no espaço. A fotografia de Alan Hume adota cores vivas, refletindo o tom alegre da narrativa, mas acerta no tom sombrio das cenas que se passam dentro da Estrela da Morte e também no palácio de Jabba. Aliás, os diversos monstros do palácio de Jabba, incluindo o próprio vilão, são bastante realistas para a época, o que reforça a qualidade dos aspectos visuais do longa, perceptível também na interessante cidade dos ewoks, com casas e passarelas dispostas nas árvores. Vale notar ainda como a roupa vermelha dos guardas na chegada do Imperador à Estrela da Morte remete ao aspecto demoníaco daquele vilão poderoso. Não é à toa também que Luke está todo de preto no confronto final com seu pai, ilustrando visualmente o conflito interno que o personagem estava vivendo. Estes pequenos detalhes demonstram o bom trabalho de Aggie Guerard Rodgers e Nilo Rodis-Jamero, responsáveis pelos figurinos. Também se destaca a bela direção de arte de Fred Hole e James L. Schoppe, que capricha no visual interno e externo das naves, no palácio de Jabba e, principalmente, no belíssimo visual dos diversos planetas em festa após a derrota do império e a libertação da galáxia. O som e a trilha sonora também são espetaculares. A trilha de John Williams mantém a marcante música tema da série e suas empolgantes variações, enquanto o som se destaca nas cenas no espaço, com as naves cortando a galáxia, e no duelo entre Luke e Vader, onde podemos distinguir perfeitamente o ruído dos sabres de luz e a voz dos personagens. A montagem de Sean Barton, Duwayne Dunham e Marcia Lucas tem papel fundamental no sucesso das cenas de batalha, mantendo a dinâmica entre os planos sem confundir o espectador, além de alternar entre as duas batalhas (no espaço e no planeta) num ritmo dinâmico e que consegue manter as duas seqüências interessantes.

Interessantes também são os icônicos personagens da série Star Wars, novamente interpretados com competência por todo o elenco. E mais uma vez o destaque fica para Harrison Ford na pele de Han Solo. Observe, por exemplo, a reação irônica de Han quando Luke diz que vai salvá-los no deserto ou sua cara de decepção quando Leia diz que sente a presença de Luke após a destruição da Estrela da Morte. Leia, novamente interpretada por Carrie Fisher, que finalmente assume seu amor por Han quando parte para resgatá-lo no planeta Tatooine. E ainda que não tenha o peso da revelação bombástica de “O Império Contra-Ataca”, até por que os momentos que a precedem apontam claramente para esta possibilidade, a revelação de Yoda sobre Leia pode provocar alguma surpresa no espectador. Da mesma forma, a revelação de Luke para Leia não provoca um choque tão grande na moça, que reage com naturalidade, como se já imaginasse tudo aquilo. Em compensação, quando Luke se retira e Han se aproxima, Fisher demonstra com competência o conflito de sentimentos da personagem. Darth Vader está novamente sombrio, muito por causa da poderosa voz de James Earl Jones e do visual caprichado do personagem. Quem também está bastante sombrio é Ian McDiarmid como o Imperador, se destacando na conversa que tem com Luke, com expressões faciais que buscam intimidar o jovem Jedi. E finalmente chegamos ao grande herói da série Star Wars, interpretado com carisma por Mark Hamill. Logo em sua chegada ao palácio de Jabba, Luke demonstra seu poder, agora já treinado como um cavaleiro Jedi, ainda que para se tornar um verdadeiro Jedi ele precisa derrotar Vader. Hamill demonstra bem a confiança de Luke, com o olhar determinado e a voz firme. Em outro momento, quando Yoda confirma que Vader é seu pai, Luke reage com certa decepção e inconformismo, e esta reação é verossímil por causa da boa atuação de Hamill.

Se não entrega um resultado maravilhoso, “O Retorno de Jedi” pelo menos cumpre o que se espera do encerramento da série, ao concluir o arco dramático de Luke Skywalker e Darth Vader, quando o vilão se volta contra o Imperador para proteger seu filho e o mata. Anakin Skywalker estava de volta para o lado bom da “força” e o próprio aspecto visual do ex-vilão, quando Luke retira sua máscara, reflete isto. Seu rosto branco, embora desfigurado, ilustra a paz interior que ele agora sentia. Paz também sente o espectador ao ver o final feliz da série, mas assim como Darth Vader em seu momento final, os mais exigentes podem sentir um gosto amargo, porque após o sensacional segundo filme, este encerramento certamente se revela inferior à expectativa.

Embora entregue aquilo que se propõe a fazer e feche a trilogia de maneira satisfatória, “O Retorno de Jedi” não consegue repetir o excelente resultado de “O Império Contra-Ataca”, limitando-se a encerrar a narrativa de maneira burocrática e voltada para o público jovem. Ainda assim, ganha pontos importantes por representar o encerramento de uma história criativa, interessante e que marcou um momento importante na história do cinema mundial.

Texto publicado em 14 de Outubro de 2010 por Roberto Siqueira

STAR WARS EPISÓDIO V: O IMPÉRIO CONTRA-ATACA (1980)

(Star Wars: Episode V – The Empire Strikes Back)

 

Videoteca do Beto #70

Dirigido por Irvin Keshner.

Elenco: Mark Hamill, Harrison Ford, Carrie Fisher, Billy Dee Williams, Alec Guinness, Anthony Daniels, Kenny Baker, David Prowse, Peter Mayhew, James Earl Jones (Darth Vader – voz), Frank Oz (Yoda – voz), Jeremy Bulloch e Clive Revill (Imperador Cos Palpatine – voz).

Roteiro: Leigh Brackett e Lawrence Kasdan, baseado em história de George Lucas.

Produção: Gary Kurtz.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Adotando um tom sensivelmente mais sombrio e desenvolvendo melhor os personagens que em “Star Wars Episódio IV: Uma Nova Esperança”, George Lucas, que abriu mão até mesmo da direção para assumir a produção executiva e ter maior controle sobre a obra, entrega o melhor filme da trilogia neste maravilhoso “Star Wars Episódio V: O Império Contra-Ataca”, que além de ter uma narrativa ainda mais interessante, conta com uma revelação bombástica que abalou os alicerces de toda a trilogia e certamente fez muitos fãs saltarem das cadeiras nos cinemas de todo o mundo.

Comandadas pelo temível Darth Vader (David Prowse, voz de James Earl Jones), as forças do império atacam impiedosamente os membros da resistência que se encontram refugiados num planeta distante. Após conseguir escapar, os membros partem para o ponto de encontro, mas Luke Skywalker (Mark Hamill) decide alterar sua rota na tentativa de encontrar o mestre jedi Yoda (voz de Frank Oz), que poderá ensiná-lo a dominar “a força” e torná-lo um cavaleiro jedi. Ao mesmo tempo, Darth Vader parte em busca do rapaz com a intenção de convencê-lo a mudar para o lado negro da “força”.

Conforme planejado por George Lucas antes mesmo do início da trilogia, “Star Wars Episódio V: O Império Contra-Ataca” apresenta uma narrativa mais elaborada que seu antecessor, ao nos revelar outros aspectos e motivações daqueles interessantes personagens apresentados no primeiro filme. Sendo assim, algumas respostas vagamente respondidas anteriormente agora aparecem de maneira bastante clara, como os motivos do grande interesse de Vader por Skywalker e as razões pelas quais Kenobi (Alec Guinness) praticamente adota o jovem no início da jornada. Este aspecto da narrativa claramente ajuda os atores a explorarem ainda mais o potencial dramático de seus personagens e praticamente todos oferecem um desempenho memorável. Hamill, por exemplo, se sai muito bem na pele de Skywalker, demonstrando com exatidão a determinação daquele jovem na tentativa de se tornar um jedi, mas principalmente, sua obstinação em defender seus parceiros das forças do mal. O ator se destaca ainda nos momentos bem humorados, como quando Luke ganha um beijo de Leia na frente de Han Solo (Harrison Ford) e cruza os braços atrás da cabeça com um ar de satisfação. Já Harrison Ford confirma que é de longe o melhor ator do elenco, interpretando de maneira firme e determinada o simultaneamente durão e carismático Han Solo. Além disso, o ator se destaca naquela que é uma de suas maiores especialidades (o que ficaria claro na série “Indiana Jones”) ao provocar o riso de maneira natural, principalmente durante suas brigas com a princesa Leia. Leia que é novamente interpretada por Carrie Fisher, que demonstra empatia com Ford, apesar de não saber se quer mesmo ficar com Han ou Luke. Mudando para o lado negro da “força”, Darth Vader continua ameaçador, com sua capa preta e sua voz poderosa (voz de James Earl Jones) mantendo sua enorme capacidade de intimidar seus adversários. Sua crueldade aparece, por exemplo, quando mata sem hesitar um comandante que falhou numa missão. A partir dali, o espectador já sabe que pode esperar qualquer coisa deste temível vilão. E fechando os destaques do elenco, Alec Guinness novamente demonstra serenidade nas poucas aparições de Kenobi, Anthony Daniels garante os momentos de alivio cômico com as tiradas do robô C3PO e Frank Oz é o responsável pela marcante voz do mestre Yoda.

No comando de toda esta gente está Irvin Keshner, o homem escolhido por Lucas para tocar seu grande projeto. Felizmente, o diretor dá um verdadeiro show, especialmente nas sensacionais cenas no espaço, onde as naves cortam o universo em alta velocidade com a câmera acompanhando seu trajeto. Keshner nos leva por dentro de asteróides e em volta de planetas com incrível realismo, graças também ao excepcional trabalho de efeitos visuais da Industrial Light & Magic, além da montagem ágil de Paul Hirsch e Marcia Lucas, que aumenta o clima de urgência. Os montadores continuam utilizando os fades e as transições de imagens que remetem aos seriados de TV, mantendo o tom episódico da trilogia, apresentam um interessante raccord através da neve quando Luke e Han estão esperando resgate, mas se destacam mesmo nas cenas de perseguição no espaço, alternando com dinamismo entre os interessantes planos de Keshner. Nestas seqüências, vale prestar atenção também no incrível trabalho de som e efeitos sonoros, que nos permite identificar cada barulho de tiro, cada fala dita pelos personagens e o som das naves cortando o espaço. O som se destaca também na tensa seqüência do congelamento de Han, através do barulho das máquinas trabalhando. Voltando a Keshner, o diretor ainda utiliza a câmera para nos transmitir as sensações dos personagens, por exemplo, na cena em que Han, Leia, os robôs e Chewbacca (Peter Mayhew) sentem um tremor num suposto asteróide e descobrem, minutos depois, que na realidade estão dentro da barriga de um monstro espacial.

E se “O Império Contra-Ataca” nos transporta para lugares fascinantes, é porque a boa direção de Keshner conta também com o excelente apoio de sua equipe técnica. Além dos já citados fabulosos efeitos visuais da Industrial Light & Magic, merece destaque a direção de fotografia de Peter Suschitzky, que realça inicialmente cores frias (com muito gelo e neve na seqüência inicial) que gradualmente são alteradas para tons obscuros (com a predominância do preto), realçando o clima mais sombrio deste segundo filme. Os figurinos de John Mollo, além de criarem o visual marcante de Darth Vader, ajudam na ambientação do espectador ao universo “Star Wars”, através das roupas espaciais dos personagens. Obviamente, a direção de arte (créditos para Leslie Dilley, Harry Lange e Alan Tomkins) também colabora, ao criar o visual arrebatador de cidades incríveis, como aquela em que vive o divertido e ambíguo Lando Calrissian, interpretado com carisma por Billy Dee Williams. Finalmente, a trilha sonora marcante de John Williams está novamente presente, agora com uma variação interessante (e sombria) quando Darth Vader está em cena.

Escrito por Leigh Brackett e Lawrence Kasdan (baseado em história de George Lucas), o roteiro mostra logo na introdução seu tom obscuro, quando informa que as forças do império forçaram a fuga dos membros da resistência de seu planeta, contrariando o final alegre do primeiro filme. Além disso, introduz de maneira correta dois personagens importantes na narrativa. O primeiro (e menos importante deles) é o imperador Cos Palpatine (voz de Clive Revill), que dita às regras para Darth Vader e deixa claro sua importância somente pelo fato do grande vilão temê-lo e respeitá-lo. O segundo é o fascinante Yoda, uma espécie de guru espiritual que não aparenta ter a força que realmente tem. Seu aspecto físico provoca até mesmo um choque no espectador, que esperava, com base nas respeitosas menções anteriores ao seu nome, alguém imponente. Porém Yoda prova que a verdadeira força do ser humano está na mente e encanta o espectador durante o treinamento de Luke. E ao contrário de “Uma Nova Esperança”, desta vez o roteiro desenvolve muito bem os personagens, nos mostrando suas verdadeiras motivações e deixando claro que Vader e Skywalker são os dois lados da mesma força, numa interessante representação do bem e do mal existente no universo. Além disso, o arco dramático de Luke Skywalker finalmente se completa, no momento da bombástica revelação de Darth Vader, que explica uma série de situações insinuadas sutilmente até então. A importância do pai de Luke para Kenobi e para o universo fica clara e o jovem sabe, a partir daquele instante, que passará a viver um intenso conflito interior na busca da defesa do universo (e Hamill demonstra bem este choque na cena, auxiliado também pelo close de Keshner). Vale observar como toda a composição da cena aumenta ainda mais o impacto da revelação. Após um intenso duelo de sabres de luz (repare que até mesmo as cores das armas representam a luta entre o bem e o mal), os dois personagens, à beira de um abismo, discutem até que Vader, filmado em ângulo baixo para aumentar a sensação de poder, diz a famosa frase “Eu sou sei pai!”. Luke está em choque e o espectador também.

“Star Wars Episódio V: O Império Contra-Ataca” apresenta um momento histórico do cinema, parodiado inúmeras vezes desde então, que é capaz até hoje de chocar aqueles que jamais ouviram falar desta revelação. Com sua atmosfera sombria e seu final obscuro que, ao contrário do longa anterior, deixa o terreno preparado para sua continuação, George Lucas arrebatou de vez os corações cinéfilos e os deixou mais que ansiosos para acompanhar o encerramento desta verdadeira saga espacial.

Texto publicado em 12 de Outubro de 2010 por Roberto Siqueira

STAR WARS EPISÓDIO IV: UMA NOVA ESPERANÇA (1977)

(Star Wars: Episode IV – A New Hope)

 

Videoteca do Beto #69

Dirigido por George Lucas.

Elenco: Mark Hamill, Harrison Ford, Carrie Fisher, Peter Cushing, Alec Guinness, Anthony Daniels, Kenny Baker, Peter Mayhew, David Prowse, Phil Brown, Shelagh Fraser, Alex McCrindle, Eddie Byrne e James Earl Jones (Darth Vader – Voz).

Roteiro: George Lucas.

Produção: Gary Kurtz.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Com uma narrativa simples, que serve de introdução ao complexo universo da trilogia Star Wars, efeitos especiais magníficos e personagens que personificam a eterna luta ente as forças do bem e do mal, “Star Wars Episódio IV: Uma Nova Esperança” é o marco inicial de um momento histórico do cinema, quando os grandes estúdios perceberam a importância do público jovem e passaram a priorizar produções voltadas para este público. Mas ao contrário da maioria das produções contemporâneas, o longa dirigido por George Lucas exala criatividade, levando o espectador numa viagem inesquecível por cenários e personagens fascinantes.

O jovem Luke Skywalker (Mark Hamill) se vê envolvido numa verdadeira guerra intergaláctica quando seu tio (Phil Brown) compra os robôs C3PO (Anthony Daniels) e R2D2 (Kenny Baker) e encontra com eles uma mensagem da princesa Leia Organa (Carrie Fisher) para Obi-Wan Kenobi (Alec Guinness), alertando sobre os planos do poderoso império liderado pelo temível Darth Vader (David Prowse, voz de James Earl Jones). Luke e Kenobi se juntam então ao mercenário Han Solo (Harrison Ford) e ao feioso Chewbacca (Peter Mayhew) e partem para enfrentar as forças do mal.

“Star Wars Episódio IV: Uma Nova Esperança” é uma grande aventura. Falar sobre ele hoje, mais de trinta anos após o seu lançamento, não é tarefa fácil, principalmente porque não é possível medir o tamanho de seu impacto na cultura cinematográfica com exatidão. Mas para se ter uma pequena idéia da importância do filme, basta dizer que a ópera espacial de George Lucas marca (ao lado de Tubarão, de seu amigo Spielberg) o inicio dos blockbusters, com sua narrativa ágil, voltada para o público jovem, repleta de efeitos especiais e muita ação. Mas ao contrário de muitos dos filmes atuais do gênero, a narrativa de “Uma Nova Esperança” é muito interessante e os efeitos especiais, ainda que impecáveis, não são um fim, mas apenas um meio utilizado para colaborar com o andamento da trama. “Uma Nova Esperança” é também o responsável por nos apresentar aos encantadores personagens do universo “Star Wars”. Alguns deles nos acompanharão por toda a trilogia, enquanto outros ficarão pelo caminho, mas é incrível notar como praticamente todos conseguem deixar sua marca na memória do espectador. Neste primeiro filme da trilogia, estes personagens não são plenamente desenvolvidos e, por isso, nós pouco sabemos sobre seu passado e suas motivações. Sabemos que a princesa Leia se rebela contra o império e que Darth Vader quer destruir determinado planeta, mas não sabemos por que o vilão deseja fazer aquilo. E qual a natureza da relação entre Kenobi e o pai de Skywalker? Algumas respostas até começam a aparecer de maneira sutil, mas o primeiro filme serve mesmo apenas como preparação para o restante da trilogia.

Ainda assim, os personagens de “Uma Nova Esperança” se destacam. A começar pelo vilão da história, provavelmente presente em quase todas as listas de grandes vilões da história do cinema. A caracterização de Darth Vader é perfeita, desde o figurino completamente preto (figurinos de John Mollo), passando pela voz firme e ameaçadora de James Earl Jones e terminando com seu sabre de luz vermelha, numa completa personificação do mal. Já Luke Skywalker é exatamente o oposto do vilão e seu figurino branco ajuda a reforçar esta idéia. Interpretado pelo carismático Mark Hamill, Luke é a força que equilibra o universo na eterna luta do bem contra o mal. Hamill demonstra muito bem a gradual transformação do personagem, inicialmente inocente, no grande herói da narrativa. No entanto, ainda que algumas dicas sejam dadas no primeiro filme, seu arco dramático só se completará mesmo no segundo filme (mas vamos deixar este assunto para a crítica de “O Império Contra-Ataca”). Já a princesa Leia, além de corajosa e determinada, demonstra um interessante conflito de sentimentos ao não saber se gosta mais de Han Solo ou de Luke Skywalker e Carrie Fisher demonstra este dilema com competência. Além disso, suas constantes discussões com Han servem como alívio cômico para a narrativa, desafogando a tensão em diversos momentos (e nestas cenas, Fisher consegue contracenar muito bem com o talentoso Harrison Ford). Ford, aliás, que aparece somente com quase uma hora de projeção, o que é suficiente para que ele roube a cena e demonstre todo seu talento, compondo um Han Solo egoísta, representando com exatidão o estereótipo do malandro, ao buscar sempre uma solução que melhor lhe convenha, independente de prejudicar os outros ou não. E finalmente, Alec Guinness demonstra segurança na pele do jedi Obi-Wan Kenobi, transmitindo muita segurança nos ensinamentos do veterano para o jovem Luke. Seu duelo de sabres de luz com Darth Vader é tenso, porém jamais alcança a intensidade de outro duelo similar que aconteceria no segundo filme da trilogia, não por causa do ator e sim por causa da carga dramática infinitamente maior no segundo duelo. Vale citar ainda os apaixonantes robôs C3PO e R2D2, interpretados por Anthony Daniels e Kenny Baker, além de Chewbacca, vivido por Peter Mayhew, cuja aparência assustadora é inversamente proporcional à bondade de seu coração.

Além dos fascinantes personagens, “Uma Nova Esperança” conta ainda com a empolgante trilha sonora de John Williams, tão marcante que até mesmo quem nunca assistiu ao filme é capaz de reconhecê-la. A fotografia de Gilbert Taylor destaca cores sem vida no planeta Tatooine, conferindo um visual árido, que reflete a vida dura daquelas pessoas constantemente ameaçadas pelo império. Por outro lado, quando a ação se passa na nave de Darth Vader, a fotografia sombria, que destaca o azul escuro e o preto, representa a maldade que paira sobre o local. Todo este cuidado com o aspecto visual é impressionante, desde as inúmeras criaturas que cruzam pela narrativa (como o perigoso Jabba) até as imponentes naves que cortam em alta velocidade o espaço sideral, atestando a qualidade dos sensacionais efeitos visuais da Industrial Light & Magic. E obviamente, as seqüências de perseguição e combate no espaço marcam alguns dos grandes momentos do longa, graças à condução segura e competente de George Lucas.

E chegamos então ao grande idealizador de “Star Wars”. O criativo cineasta pertence à geração que marcou o cinema norte-americano, no movimento que ficou conhecido como “nova Hollywood”. Mas ao contrário de Coppola e Scorsese, que seguiram outro caminho, preferindo filmes sombrios e personagens extremamente complexos, Lucas (assim como o amigo Spielberg) seguiu pelo caminho do chamado “cinema-pipoca”, voltado para o público jovem, mas que nem por isso subestima a inteligência de seu espectador. Neste primeiro episódio da velha trilogia, Lucas nos apresenta um visual esplêndido nas cenas espaciais, graças aos belos planos e enquadramentos do diretor. Repare também como quando Luke e Kenobi chegam numa vila para negociar com Han a utilização de uma nave, o plano geral de Lucas destaca o belo trabalho de direção de arte de Leslie Dilley e Norman Reynolds, que cria uma vila diferente e impressionante, repleta de detalhes em cada uma de suas imponentes construções. Lucas é responsável também pelo bom roteiro de “Uma Nova Esperança”, que além de conter interessantes reviravoltas, como quando Han inesperadamente retorna para ajudar Luke, faz pequenas menções ao pai de Skywalker, deixando claro o peso que sua ausência tem na vida do rapaz. A narrativa é coesa e muito bem conduzida pelo diretor, auxiliado também pela boa montagem do trio Richard Chew, Paul Hirsch e Marcia Lucas, que imprime um ritmo mais lento no primeiro ato, acelerando a partir do segundo e chegando ao clímax no terceiro, já num ritmo de tirar o fôlego bastante coerente com uma aventura. Colabora com esta sensação de urgência a câmera ágil de Lucas, especialmente nas batalhas espaciais, alternando, sem jamais soar confusa, entre os planos abertos que nos mostram as naves e os planos fechados que ilustram a tensão dos pilotos. A montagem utiliza ainda com freqüência o fade e a transição de imagens que se sobrepõem na tela, dando um ar episódico proposital à narrativa. O diretor queria que o filme se parecesse com os seriados norte-americanos e este efeito dá esta sensação. Talvez o único problema de “Uma Nova Esperança” seja o seu final pouco aberto à continuação, que não deixa a sensação de “quero mais” esperada para um primeiro filme de trilogia. Além disso, sua narrativa não consegue desenvolver os personagens completamente, mas este não chega a ser um problema, já que este desenvolvimento seria feito com maestria no segundo filme e foi planejado pelo diretor. Ainda assim, o longa consegue um resultado bastante satisfatório, se estabelecendo como uma aventura capaz de nos transportar para outro universo de maneira mais que eficiente.

Responsável por criar uma verdadeira legião de fãs e preparar o terreno para o maravilhoso “O Império Contra-Ataca”, “Star Wars, uma nova esperança” jamais alcança os níveis de tensão e o aspecto sombrio de sua seqüência, mas ainda assim consegue agradar o espectador ao nos apresentar personagens importantes, cenários magníficos e uma história capaz de prender a atenção com sua narrativa ágil, inteligente e bem conduzida. Assim como o poderoso ataque da estrela da morte, George Lucas deixou sua marca neste importante filme de estréia da trilogia “Star Wars”.

Texto publicado em 10 de Outubro de 2010 por Roberto Siqueira

INDIANA JONES E A ÚLTIMA CRUZADA (1989)

(Indiana Jones and the Last Crusade)

 

Videoteca do Beto #62

Dirigido por Steven Spielberg.

Elenco: Harrison Ford, Sean Connery, Denholm Elliott, Alison Doody, John Rhys-Davies, Julian Glover, River Phoenix, Michael Byrne, Kevork Malikyan, Richard Young, Alexei Sayle e Paul Maxwell.

Roteiro: Jeffrey Boam, baseado em estória de George Lucas e Menno Meyjes.

Produção: Robert Watts.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Após iniciar a saga do arqueólogo Indiana Jones com o maravilhoso “Os Caçadores da Arca Perdida”, Steven Spielberg adotou um tom mais obscuro e, conseqüentemente, menos interessante no segundo filme da série, o apenas razoável “Indiana Jones e o Templo da Perdição”. Felizmente, o talentoso diretor volta a utilizar com força total as principais características da série neste delicioso “Indiana Jones e a Última Cruzada”, misturando com eficiência o bom humor e as engenhosas seqüências de ação, e de quebra, ainda introduz o tema “relacionamento entre pais e filhos”, algo recorrente em sua filmografia.

Após descobrir que seu pai (Sean Connery) havia sido capturado pelos nazistas enquanto buscava encontrar o santo Graal, o arqueólogo Indiana Jones (Harrison Ford), acompanhado de seu amigo Marcus Brody (Denholm Elliott), parte em busca do precioso artefato e, principalmente, para tentar salvar seu pai. Ao desembarcar em Veneza, encontra a ajuda da misteriosa Dra. Elsa Schneider (Alison Doody) e novamente se envolve numa série de aventuras.

Definitivamente, “Indiana Jones e a Última Cruzada” é um legítimo representante da série que fez tanto sucesso nos anos oitenta, como podemos notar desde o clássico início com o logo da Paramount se transformando numa montanha. A linha vermelha no mapa enquanto vemos a imagem do avião, o envolvimento com uma mulher, o chapéu, o chicote e a empolgante trilha sonora também continuam presentes. Spielberg mantém ainda outra característica marcante da série, abusando do bom humor. Aliás, se “O Templo da Perdição” se perdia em meio ao clima pesado demais, este “A Última Cruzada” é o mais leve e engraçado dos três filmes. O diretor também dá um show logo na seqüência de abertura, quando o jovem Indy (River Phoenix) foge em cima de um trem com um precioso artefato, abusando da criatividade durante a atrapalhada fuga do rapaz, além de utilizar animais de verdade, sem efeitos digitais, o que somado aos tradicionais truques mecânicos (outra marca da série), confere muito mais realismo à cena. O diretor também demonstra seu talento na condução de cenas extremamente empolgantes de ação, como quando os nazistas perseguem os Jones de moto e na seqüência do deserto em que Indy faz malabarismos para conseguir escapar dos alemães. Além disso, o diretor utiliza a câmera com função narrativa, como no momento em que o zoom na placa “Berlim” indica o caminho que os heróis seguiram. Finalmente, a seqüência final dentro da caverna é carregada de tensão enquanto Indy desvenda os mistérios em busca do cálice e se encerra de forma emocionante quando o Sr. Jones finalmente chama o filho de “Indiana”, deixando claro que a vida deles era muito mais importante que aquele artefato religioso.

Spielberg também inova ao apresentar uma excelente introdução mostrando a juventude de Indy, que serve como base para o fio condutor da narrativa: o relacionamento entre pai e filho. Além disso, serve também para apresentar traços marcantes da personalidade dele, como o medo de cobras e a tomada rápida de decisão, além de revelar como ele passou a utilizar o chicote e o chapéu. Tudo isto é mérito também do bom roteiro de Jeffrey Boam, baseado em estória de George Lucas e Menno Meyjes, que divide a narrativa em duas linhas principais. A primeira delas se concentra na busca pelo Graal e abre espaço para as sensacionais aventuras do arqueólogo. Já a segunda linha narrativa olha, ainda que de forma superficial e bem humorada, para os problemas de relacionamento entre pai e filho que, como dito, é um tema recorrente nos filmes de Spielberg. Além disso, apresenta diversos momentos que remetem ao primeiro filme, a começar pelo plano do professor Jones dando aula, seguido pela referência à Arca da Aliança, a morte de um vilão que se transforma em esqueleto (que claramente lembra o rosto derretido) e, finalmente, até mesmo os próprios vilões nazistas estão presentes nos dois filmes.

Entre o elenco o destaque vai para Harrison Ford, que dá outro show na pele do arqueólogo Indiana Jones, e Sean Connery, que vive o pai de Indy. É impressionante notar como Ford se sente à vontade no papel do carismático herói. Ator e personagem se misturam e nem sequer podemos imaginar outro ator em seu lugar. Todos os trejeitos, olhares e até mesmo o timing cômico do personagem soam perfeitos graças ao talento de Ford. Repare, por exemplo, seu olhar de satisfação quando Elsa descobre que a página com o mapa foi arrancada do diário ou o seu sorriso de alivio quando Hitler autografa o diário. Já Sean Connery mostra seu talento desde sua primeira aparição, formando uma dupla perfeita com Ford. Famoso por interpretar James Bond (o pai cinematográfico de Indiana Jones), ninguém melhor do que ele para interpretar o pai de Indy e impor respeito. A química dos dois atores é perfeita, sendo responsável por diálogos deliciosos e cheios de sarcasmo, presenteando ainda o espectador com pelo menos dois momentos hilários, quando Henry Jones incendeia acidentalmente uma sala nazista e quando ele encontra uma passagem secreta, provocando a queda imediata de Indy pela escada. Mas apesar de cômica, a relação dos dois tem um traço de ressentimento perceptível em alguns momentos, como num diálogo expositivo que explica a morte da Sra. Jones. Observe, por exemplo, como o Sr. Jones chama Indy de “Júnior” diversas vezes, provocando a irritação do filho, como se ainda o visse como um menino. Note também como em diversos momentos Indy toma atitudes que lhe enche de orgulho próprio, mas seu pai olha com desaprovação, provocando sua imediata mudança de feição. A troca de olhares entre Ford e Connery, aliás, também provoca momentos muito engraçados, como quando eles conversam com os nazistas sobre o diário e quando o Sr. Jones diz que Elsa fala enquanto dorme, deixando claro que também dormiu com ela. No único momento em que tenta se abrir com o pai, Indy fica sem palavras, e novamente o roteiro toca na difícil relação entre pai e filho de maneira bem humorada, algo que se repetiria na cena em que Indy supostamente cai do penhasco, provocando a confissão de seu pai (“Achei que tinha te perdido”). Nesta cena, aliás, Spielberg cria um pequeno suspense antes de revelar, novamente com bom humor, a salvação de Indy. Fechando o elenco, temos ainda Alison Doody, que vive a sensual e perigosa Elsa Schneider com elegância, Denholm Elliott, interpretando o engraçado Marcus Brody e o retorno do fascinante Sallah, interpretado novamente com competência por John Rhys-Davies.

Também merece destaque o trabalho técnico feito em “Indiana Jones e a Última Cruzada”, a começar pela montagem de Michael Kahn, que tem papel fundamental nas espetaculares seqüências de ação, alternando entre os vários planos com agilidade. Além disso, mantém a narrativa num ritmo sempre empolgante, o que é essencial numa aventura. Kahn ainda faz algumas transições interessantes, como no momento em que através do chapéu o jovem Indy se transforma no adulto Indiana Jones. A direção de arte de Stephen Scott, auxiliada pelos ótimos figurinos de Joanna Johnton e Anthony Powell e pela bela direção de fotografia de Douglas Slocombe, capricha na ambientação do espectador, criando três ambientes completamente diferentes. A beleza estonteante de Veneza contrasta com a gélida seqüência em território alemão e austríaco, ao passo em que o deserto tem um visual mais seco, refletindo o crescente desconforto de Indy na medida em que avança em sua missão. Slocombe também capricha na fotografia obscura dentro da caverna, iluminada somente com velas e tochas, além de carregar nos tons escuros como o preto e o vermelho que, auxiliado pelas tochas, conferem um ar infernal ao desfile nazista, simbolizando o mal encarnado naqueles vilões. Finalmente, merece destaque também o bom trabalho de som e efeitos sonoros, perceptível principalmente nas seqüências de ação.

Como não poderia deixar de ser, “Indiana Jones e a Última Cruzada” termina de forma bem humorada, revelando o nome completo de Indy e a origem de seu “Indiana”. Podemos citar ainda outros diversos momentos engraçados, como o barulho de Indy quebrando o piso enquanto um senhor carimba papéis, a fuga dos Jones de avião (“Nos atingiram!”) e a seqüência seguinte, quando o Sr. Jones diz que “Estão tentando nos matar! […] É uma experiência nova pra mim” e ouve Indy responder que “Acontece comigo toda hora!”. A mistura de ação e bom humor se revela a receita perfeita para esta aventura deliciosa, embalada por dois personagens extremamente carismáticos e por um roteiro muito inteligente.

Spielberg acerta novamente na condução de mais esta maravilhosa aventura do arqueólogo Indiana Jones. Aproveitando o carisma de seu herói e de seus atores, o diretor aborda seu tema preferido de forma bem humorada e envolve novamente o espectador, através de seqüências de ação incrivelmente criativas e, acima de tudo, de uma narrativa muito envolvente.

Texto publicado em 26 de Agosto de 2010 por Roberto Siqueira

INDIANA JONES E O TEMPLO DA PERDIÇÃO (1984)

(Indiana Jones and the Temple of Doom)

 

Videoteca do Beto #31

Dirigido por Steven Spielberg.

Elenco: Harrison Ford, Kate Capshaw, Jonathan Ke Quan, Amrish Puri, Roshan Seth, Philip Stone, Roy Chiao, David Yip, Ric Young, Chua Kah Joo, Philip Tan e Dan Aykroyd.

Roteiro: Willard Huyck e Gloria Katz, baseado em estória de George Lucas.

Produção: Robert Watts.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Segundo filme da deliciosa saga do arqueólogo, “Indiana Jones e o Templo da Perdição” infelizmente apresenta um resultado claramente inferior ao primeiro longa, se salvando somente pelo carisma do protagonista e pelas engenhosas seqüências de ação que caracterizam a série. Steven Spielberg dirige aqui um filme mais sombrio, menos realista e, conseqüentemente, menos interessante. Nada, porém, que comprometa o filme ao ponto de classificá-lo como um fracasso total. Longe disso. O grande pecado é que ele não atinge a excelente expectativa, inevitavelmente criada após o maravilhoso filme que o precedeu.

O arqueólogo Indiana Jones (Harrison Ford) escapa de Shangai, acompanhado de Willie Scott (Kate Capshaw) e do pequeno Round (Jonathan Ke Quan), mas na fuga é forçado a parar na Índia, onde encontra um povoado que lhe solicita resgatar as pedras roubadas por um feiticeiro que escraviza as crianças do local. Na busca destas pedras, ele encontrará diversos obstáculos e enfrentará poderes mágicos vindos do fanatismo de um culto obscuro que sacrifica seres humanos.

O início empolgante em Shangai, seguido pela clássica linha vermelha que acompanha o avião no mapa, além é claro do logo da Paramount se transformando no primeiro plano do filme, dão a sensação de que vamos presenciar outra maravilhosa produção, tão qualificada quanto “Os Caçadores da Arca Perdida”. Porém esta sensação se desfaz logo na primeira grande cena de ação, repleta de momentos irreais, mas que por outro lado, revela o ponto positivo de “Templo da Perdição”, o humor refinado. Os momentos bem humorados aparecem em número maior que no primeiro filme, como na cena em que Willie pergunta desesperada para Indy se ele sabe pilotar, e ele responde: “Não. Você sabe?”. Logo em seguida, quando pulam do avião num bote e conseguem pousar (?!), caindo de um penhasco (numa das seqüências absurdamente irreais) e aparentemente conseguem se salvar, Indy diz que “não foi tão ruim assim”, somente para depois despencar dentro de um rio. Em outro trecho bastante engraçado, Willie se desespera com os animais na selva, enquanto Indy joga cartas com Round e comenta com o garoto que o problema dela é a gritaria. A cena do jantar no palácio também garante boas gargalhadas.

O garoto interpretado por Jonathan Ke Quan, aliás, é extremamente divertido, com um ótimo timing cômico. Já Kate Capshaw exagera nas caretas e gritos de Willie Scott, tornando a personagem muito irritante. Por outro lado, os apuros que ela passa garantem boas risadas, o que reforça o argumento de que o humor é o destaque do longa. Felizmente, o carisma inegável de Harrison Ford garante a simpatia do espectador. Novamente muito confortável no papel do arqueólogo, seu ótimo senso de humor, suas engraçadas reações e até mesmo suas caretas (bem mais comedidas que de sua parceira, porém muito eficientes) garantem a diversão. Até mesmo porque Indiana Jones continua sendo um herói diferente, tomando decisões erradas, que comprometem sua segurança, o que é sempre divertido e garante autenticidade ao herói. Observe, por exemplo, a cena em que ele joga uma pedra em um homem que maltrata as crianças escravas, somente para chamar a atenção dele e de todos os outros presentes, já que de nada adiantaria tomar aquela atitude intempestiva. Em outro momento, após escapar de ser esmagado junto com Willie e Round, ele volta para pegar o chapéu, numa atitude que somente Indy seria capaz de tomar. Este enorme carisma do herói é o que evita a antipatia da platéia pelo filme, mesmo com o tema sombrio abordado.

Notavelmente mais sombrio, o longa afunda o herói em um mundo que explora coisas claramente repugnantes, como um ritual (uma espécie de magia negra) que sacrifica seres humanos e a escravidão de crianças. A fotografia vermelha (Direção de Douglas Slocombe) durante as cenas do ritual soa muito apropriada, numa referencia clara ao inferno. Por outro lado, a ótima trilha sonora (John Williams) característica de Indy garante alguns momentos de alegria e, especialmente na cena em que Indy finalmente coloca a mão nas pedras dentro do altar, alcança momentos poderosos. Finalmente, a espetacular seqüência nos carrinhos de trem é de uma criatividade e engenhosidade incrível, garantindo emoção e ação de alta qualidade, apesar de alguns pequenos exageros, perdoáveis neste caso. E perdoáveis justamente porque a criatividade, nesta cena, não faltou, o que não permite que o espectador se atente aos detalhes exagerados. “Templo da Perdição” apresenta ainda uma referência sensacional ao primeiro filme, quando novamente um homem habilidoso empunhando uma espada chega para atacar Indy. Ele repete a mesma cara de desdém e leva à mão para sacar a arma. O detalhe é que aqui ele não estava com ela, tornando a cena muito bem humorada.

Em resumo, o problema de “Templo da Perdição” não é necessariamente o exagero de algumas cenas de ação, também existentes no primeiro filme, mas sim a falta de criatividade do roteiro.  Se a narrativa fosse mais envolvente e criativa, as seqüências irreais passariam batidas, como acontece em “Os Caçadores da Arca Perdida”. O roteiro de Willard Huyck e Gloria Katz é extremamente fraco, sem criatividade, o que prejudica o resultado final do filme. Desta forma, a enorme quantidade de cenas irreais soa falsa e exagerada, sendo salva apenas pelo enorme carisma do personagem principal, que é realmente sensacional. Além disso, os poucos efeitos especiais que aparecem no filme soam apenas razoáveis hoje, mas na época funcionavam muito bem. Exatamente por isso que os efeitos mecânicos funcionam de maneira muito mais eficiente, pois jamais envelhecem ou perdem o realismo.

Infelizmente menos inspirado e atraente que “Caçadores da Arca Perdida”, o segundo filme do arqueólogo Indiana Jones consegue algum sucesso somente pelo enorme carisma de seu personagem principal. Apesar da boa direção de Steven Spielberg, principalmente nas engenhosas cenas de ação, o roteiro fraco e pouco criativo compromete até mesmo estas cenas, chamando à atenção para o exagero, que no primeiro longa soava até mesmo charmoso. Sombrio em demasia, “Indiana Jones e o Templo da Perdição” não consegue jamais alcançar a qualidade esperada, e exatamente por isso, decepciona. Felizmente, o herói que o inspira, assim como seus produtores, também comete erros e acertos, e exatamente por isso, a esperança de um filme melhor para a seqüência da saga renasce.

PS: Vale destacar que ainda não assisti “A Última Cruzada”, assim como não havia assistido aos dois primeiros filmes da série, o que esclarece minha última frase da crítica.

Texto publicado em 29 de Dezembro de 2009 por Roberto Siqueira

OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA (1981)

(Raiders Of The Lost Ark) 

 

Videoteca do Beto #24

Dirigido por Steven Spielberg.

Elenco: Harrison Ford, Karen Allen, Paul Freeman, Ronald Lacey, John Rhys-Davies, Alfred Molina, Denholm Elliott, Wolf Kahler, Don Fellows, William Hootkins, Fred Sorenson e Anthony Higgins. 

Roteiro: Lawrence Kasdan, baseado em estória de George Lucas e Philip Kaufman. 

Produção: Frank Marshall. 

 

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

O talentoso diretor Steven Spielberg tinha o sonho de dirigir um filme da série James Bond. Quando decidiu aceitar a oferta de seu amigo George Lucas, que estava se dedicando a outro projeto (nada mais nada menos que “Guerra nas Estrelas”), Spielberg realizou seu sonho e esta maravilhosa aventura chamada “Os Caçadores da Arca Perdida” ganhou vida nas telas, dando início a saga de um dos maiores heróis da história do cinema: Indiana Jones.

Tudo tem início quando o arqueólogo Indiana Jones (Harrison Ford) é contratado para encontrar a Arca da Aliança, que segundo as escrituras sagradas do cristianismo, continha os dez mandamentos que Moisés trouxe do Monte Horeb. Diz a lenda que quem possuir a arca será invencível, e por isso, Indiana terá que evitar que ela caia nas mãos do temível exército alemão, liderado por Adolf Hitler.

O grande mérito da aproximação que o herói Indiana Jones consegue criar com o público reside no fato de que ele parece sempre vulnerável. E isto ocorre porque Indiana é alguém de carne e osso, que comete erros e acertos, e não um super-herói que acerta em todas as decisões e jamais dá a sensação de que corre algum risco. Indiana, por muitas vezes, toma decisões erradas, que pioram ainda mais as coisas, como podemos perceber logo no início do filme, quando ao voltar de um local sagrado onde consegue um artefato indígena, ele passa o artefato para seu colega que se encontra do outro lado de um buraco onde só é possível passar com ajuda, somente para que este o abandone à beira deste abismo. É claro que além desta vulnerabilidade, a excelente atuação de Harrison Ford também é diretamente responsável pelo sucesso do icônico personagem. Sarcástico, ele encarna o arqueólogo de forma tão incrível que mal podemos imaginar outro ator na pele dele. Lembrando a dupla identidade comum em outros heróis (Superman, por exemplo), Indiana aparece como um professor sério e tímido na universidade, mas se transforma completamente quando está na pele do arqueólogo aventureiro. Toda a concepção do personagem é ótima. O chapéu e o chicote se tornaram marcas tão fortes que hoje em dia, qualquer pessoa, mesmo que não tenha visto o filme, sabe de quem se trata somente ao ver a sombra deles. Indiana é um herói que evita, a qualquer custo, trazer problemas para si, como fica claro na engraçada cena em que mata um especialista em espada com um tiro. Ele sempre opta por resolver a situação da forma mais simples possível. Egoísta, Indiana sempre vai tentar salvar sua pele, mas como não é infalível (e sabemos disso), muitas vezes toma decisões erradas e a situação piora ainda mais. E o fato de não sabermos se Indiana vai tomar a decisão correta torna ainda mais plausível um possível fracasso dele, o que aumenta a carga de tensão nas muitas cenas em que corre perigo.

O bom roteiro de Lawrence Kasdan é repleto de dicas e recompensas. Diversas situações ou objetos que aparecem terão reflexo no restante da narrativa, dando uma sensação de prazer ao espectador mais atento, como por exemplo, a mão queimada pelo artefato que serve de cópia para os alemães ou a capacidade de Marion (Karen Allen, em boa atuação) de tomar bebidas alcoólicas. Além disso, o roteiro espalha pelo filme diversos momentos bem humorados, o que, desde que bem realizado, é sempre bem vindo em filmes de ação. Observe, por exemplo, a cena em que Sallah (John Rhys-Davies, muito bem como o fiel amigo de Indiana) olha para o poço das almas e vê algo se mexendo no escuro. Quando a tocha cai e ele percebe que são cobras, dá um grito de susto e em seguida se desculpa com Indiana (“Sorry Indy!”), pois sabe que o amigo as detesta. Outro engraçado momento é a fuga de Indiana da América do Sul, sendo perseguido por índios ferozes e gritando para o amigo ligar o motor do avião.

Outro grande destaque da produção são os excelentes efeitos visuais, conseguidos através de movimentos mecânicos, em uma época onde os efeitos de computadores ainda engatinhavam. Por isso, as trucagens utilizadas para conseguir estes efeitos soam bastante reais, exatamente porque eram feitas com dublês e em estúdio. A enorme carga de ação do longa garante seqüências extremamente interessantes, como por exemplo, a empolgante cena da perseguição no caminhão. Fica evidente ali que os movimentos são reais. Sabemos que o ator (ou o dublê) realmente passou por baixo do caminhão, o que aumenta nossa aflição na cena. Além disso, o filme conta ainda com efeitos absolutamente inovadores na época, como o rosto derretendo (mérito principalmente da maquiagem) e as luzes saindo da arca. A maravilhosa trilha sonora de John Williams é destas trilhas que se tornaram tão famosas que até mesmo quem não viu o filme a reconhece.

Completando o bom trabalho técnico, a direção de fotografia de Douglas Slocombe destaca cores opacas, refletindo bem o local árido que é o deserto no Cairo, a excelente direção de arte de Leslie Dilley cria cenários absolutamente encantadores como o poço das almas, os belíssimos figurinos de Deborah Nadoolman dão um visual perfeitamente coerente com o ambiente (além de colaborar sensivelmente para o já citado visual de Indiana), e finalmente, a montagem de Michael Kahn ajuda a manter o ritmo ágil e empolgante da narrativa, além de criar duas seqüências muito famosas durante toda a saga de Indiana (o logo da Paramount se transformando no primeiro plano do longa e a linha vermelha marcando no mapa a trajetória das viagens do herói).

E finalmente, é claro que para que tudo isto funcionasse de forma tão perfeita seria necessária uma direção competente. E Spielberg merece todos os créditos por isso. Sua direção é segura, conduzindo a narrativa de forma coerente e extraindo grandes atuações do elenco. O diretor cria ainda planos belíssimos e cenas inesquecíveis, como Indiana fugindo da bola gigante, a fuga do poço das almas, a perseguição no caminhão e a abertura da arca. Não podemos dizer que “Os Caçadores da Arca Perdida” seja um filme perfeito. Os defeitos existem, como uma cena pouco verossímil em que Indiana viaja em cima de um submarino por muitos dias, mas a fantasia que cria e a forma que mexe com a imaginação compensam qualquer erro.

A deliciosa aventura “Os Caçadores da Arca Perdida” consegue misturar ação, suspense e bom humor, alcançando um resultado maravilhoso. É inevitável nossa identificação com o carismático personagem principal e, por isso, embarcamos juntos com ele nesta viagem maravilhosa através da imaginação. A grande direção de Spielberg e a ótima atuação de Harrison Ford criaram, junto com toda a equipe, um herói clássico, muito próximo de todos nós, e exatamente por isso, inesquecível.

 

Texto publicado em 08 de Dezembro de 2009 por Roberto Siqueira