DUMBO (1941)

(Dumbo)

 

Filmes em Geral #49

Videoteca do Beto #148 (Filme comprado após ter a crítica divulgada no site e transferido para a Videoteca em 06 de Janeiro de 2013)

Dirigido por Ben Sharpsteen.

Elenco: Verna Felton, Cliff Edwards, Herman Bing, Billy Bletcher, Edward Brophy, Jim Carmichael, Hall Johnson Choir e Noreen Gammill.

Roteiro: Joe Grant e Dick Huemer.

Produção: Walt Disney (não creditado).

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Apesar da qualidade de seus primeiros filmes, os estúdios Disney enfrentavam grande dificuldade financeira na época do lançamento de “Dumbo”. Em meio à forte crise provocada pela guerra mundial, as pessoas não freqüentavam mais o cinema como antes e nem mesmo o inovador “Fantasia” e a obra-prima “Pinóquio” conseguiram reverter este quadro, deixando “Branca de Neve e os Sete Anões” como o único sucesso efetivo de bilheteria do estúdio até então. Além disso, Walt empregou seus melhores recursos na produção de “Bambi”, que seria lançado apenas em 1942, após longos 6 anos em produção. Sobrou para “Dumbo” a equipe dos “velinhos” do estúdio, que ficou com a responsabilidade de criar um filme menor, mais barato e que, ironicamente, salvou o estúdio, tornando-se um grande sucesso de bilheteria.

Escrito por Joe Grant e Dick Huemer, “Dumbo” conta a história de um bebê elefante que nasceu com orelhas enormes e, por isso, é alvo do preconceito dos outros animais e até mesmo de seres humanos no circo onde vive. Após ser separado de sua mãe, que, desesperada para defender o filho, atacou um grupo de meninos, ele encontra o ratinho Timóteo, que o ajuda a recuperar a auto-estima perdida e dar a volta por cima, transformando-se no grande astro do circo.

Apesar da boa qualidade da animação, “Dumbo” apresenta um trabalho claramente mais rústico que “Pinóquio”, o que é reflexo da crise financeira que a Disney enfrentava na época, que forçou a redução do orçamento de “Dumbo”. Para compensar o menor nível de detalhes, o longa aposta inicialmente num visual alegre, repleto de cores fortes, além dos belos planos do diretor Ben Sharpsteen, notáveis, por exemplo, quando o trem viaja durante a noite ou na montagem do circo sob forte chuva. Além disso, “Dumbo” é repleto de momentos tocantes, sempre embalados pela linda trilha sonora de Frank Churchill e Oliver Wallace, como quando as cegonhas trazem os filhotes dos animais logo no início, conquistando o espectador imediatamente. A trilha sonora, aliás, é um dos destaques do filme, mantendo a tradição Disney de espalhar diversas canções pela narrativa, além de pontuar muito bem as cenas, como quando muda para um tom triste após as cegonhas irem embora, ilustrando o sentimento da elefanta que não recebeu seu bebê. E é justamente nestes momentos que tocam o coração e na simplicidade da narrativa que reside o sucesso do longa.

Observe, por exemplo, a linda cena do “nascimento” de Dumbo. Após acompanharmos o sofrimento da mamãe elefanta, a desajeitada e atrasada cegonha chega para entregar seu filhote, provocando a emoção genuína no espectador, que já partilhou com ela o sofrimento por não ter o seu bebê e agora é agraciado pela chegada de Dumbo. Pequeno e frágil, o personagem título conquista o espectador rapidamente, o que será essencial para o sucesso da narrativa (observe, por exemplo, que, assim como Bambi, Dumbo também tem medo dos raios e se protege da chuva embaixo de sua mãe). Por isso, quando suas enormes orelhas aparecem e provocam o espanto das outras elefantas, o espectador até pode estranhar, mas já foi conquistado pelo pequeno elefante e torcerá por ele até o final. Neste momento, aliás, tem inicio o tema principal do filme, que é o respeito (ou a falta dele) ao diferente. Para aqueles que acusam a Disney de ser conservadora, pode ser surpreendente constatar que Walt já debatia o preconceito naquela época.

Independente do que as pessoas pensam e de qualquer tipo de preconceito, uma mãe sempre amará seu filho (estou me referindo às mães de verdade, não a estes monstros que vemos nos telejornais hoje em dia). Por isso, é compreensível (e até mesmo previsível) que mamãe elefanta se revolte (repare o olho vermelho dela) e ataque os meninos que caçoam de Dumbo no circo, o que ocasionará sua prisão, acusada de ser louca. Na prisão, vale observar a composição visual dos planos que ilustram a sintonia entre mãe e filho, com as sombras da grade formando listras na elefanta, da mesma forma que a lona do circo aparece atrás de Dumbo. Esta conexão é reforçada ainda pelo movimento do corpo deles, que é idêntico. Solitário e abandonado, Dumbo encontrará auxilio no animado Timóteo, personagem que funciona como alívio cômico numa narrativa que caminhava para um clima pesado demais. Suas intervenções, como quando assusta as elefantas fofoqueiras, são sempre divertidas e quebram o ritmo denso da narrativa. E até mesmo o jovem Dumbo contribui para esta atmosfera bem humorada, quando destrói o circo ao participar de um número, mas este acidente acaba aumentando seu drama e iniciando o conflito principal da narrativa, o que traz de volta o clima pesado para a história. Transformado em palhaço, ele faz enorme sucesso, mas chora de tristeza. O longa alterna com eficiência entre os momentos divertidos e dramáticos, nos fazendo sorrir em cenas como esta do circo e nos emocionando em momentos belíssimos, como quando Dumbo visita a mãe na cela, momentos antes dos palhaços afirmarem que “elefantes não têm sentimentos”. Eles não podiam estar mais errados.

Ainda que na maior parte do tempo Ben Sharpsteen apresente uma direção discreta, ele é competente na condução de cenas marcantes, como a interessante seqüência em que Dumbo e o ratinho ficam bêbados, seguida por imagens psicodélicas de elefantes cor-de-rosa que simulam a bebedeira da dupla, confirmando novamente a ousadia de Walt Disney (lembre-se que em “Pinóquio” ele já havia mostrado os garotos fumando e jogando sinuca). E da mesma maneira que o ritmo da narrativa alterna entre momentos divertidos e dramáticos, a fotografia alterna das cores fortes do início para cores mais tristes no segundo ato, refletindo a tristeza de Dumbo e sua mãe até mesmo através do maior número de cenas noturnas, voltando para tons mais alegres no final. Se “Dumbo” não é um filme perfeito, seus pequenos problemas podem até passar despercebido diante da beleza da história narrada. É verdade que animais se comunicando verbalmente com seres humanos é algo que soa irreal mesmo num universo fantasioso (como acontece quando o ratinho conversa com o dono do circo). Além disso, é difícil acreditar no número que “empilha” sete elefantes no circo. Mas são problemas pequenos demais para atrapalhar um filme tão belo.

Quando Dumbo parece desolado e perdido, o sermão de Timóteo para os corvos serve também para atingir a platéia, num momento que resume a bela mensagem do filme. Através da pena mágica (um artifício usado para dar confiança ao protagonista), ele e os corvos conseguem devolver a auto-estima para o elefante, que aprende a voar. Pra finalizar, a seqüência ainda apresenta a melhor música do filme, a empolgante “When I See an Elephant Fly”, que em português tem o delicioso refrão: “fiquei um mês sem poder falar ao ver elefante voar”. Dumbo volta para o circo, faz sucesso, fica rico e recebe sua mãe de volta. Um final feliz, para um filme idem, que ainda consegue deixar uma bela mensagem para o espectador.

Com simplicidade e muita imaginação, “Dumbo” consegue agradar, mostrando que uma história simples pode ser tão eficiente quanto qualquer outra, dependendo da forma como é contada. É interessante que o filme que fala sobre o preconceito tenha tido pouco investimento do estúdio e poucos recursos técnicos, pois reafirma a mensagem de que a forma é menos importante do que o conteúdo. E não é o caso de dizer que ficarei um mês sem poder falar, mas de fato foi uma delícia ver este elefantinho voar.

Texto publicado em 06 de Abril de 2011 por Roberto Siqueira

4 comentários sobre “DUMBO (1941)

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