(Field of Dreams)
Videoteca do Beto #59
Dirigido por Phil Alden Robinson.
Elenco: Kevin Costner, Amy Madigan, Gaby Hoffman, Ray Liotta, Timothy Busfield, James Earl Jones, Burt Lancaster, Frank Whaley, Dwier Brown, Fern Persons, Michael Milhoan, Steve Eastin, Charles Hoyes, Art LaFleur, Lee Garlington, Mike Nussbaum e James Andelin.
Roteiro: Phil Alden Robinson, baseado em livro de W.P. Kinsella.
Produção: Charles Gordon e Lawrence Gordon.
[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].
Quão injusta é a morte? É triste pensar que jamais resolveremos algo que ficou pendente quando alguém nos deixa. Aquela bebida com um amigo depois do expediente, aquele churrasco com a família, aquela viagem tão sonhada, nada disto é possível se um dos participantes se vai. Pior ainda é quando estamos brigados, distantes ou com alguma situação mal resolvida. O remorso corrói aquele que fica, ainda que a recíproca fosse verdadeira numa situação inversa. A chance de reconciliar-se com o passado e realizar os sonhos é o tema deste belíssimo “Campo dos Sonhos”, dirigido por Phil Alden Robinson e que exemplifica perfeitamente como o cinema pode ser mágico. Quando os créditos começam a aparecer na tela, além de enxugar as inevitáveis lágrimas, o espectador pode tirar algumas lições, como aproveitar cada segundo da vida, fazer tudo que tiver vontade e não deixar nada pra depois. E principalmente, não se desentender com quem ama por besteiras.
O fazendeiro Ray Kinsella (Kevin Costner) caminha pelo seu milharal em Iowa quando ouve uma misteriosa voz que lhe diz “Se você construir, ele virá”. Após ter uma visão de um campo de beisebol no meio de suas plantações, ele entende que deverá construir este campo para que seu grande ídolo do beisebol no passado volte a jogar. O detalhe é que “Shoeless” Joe Jackson (Ray Liotta), o jogador em questão, está morto há muitos anos. Após construir o campo, a mágica acontece e Ray descobre que este local pode realizar muitos outros sonhos. Dentre eles, estaria algo que nem mesmo Ray poderia imaginar.
A trama de “Campo dos Sonhos” é simples. Homem de família estruturada, Ray vive muito bem com a esposa Annie (Amy Madigan) e a filha Karin (Gaby Hoffman). Na infância, foi criado pelo pai devido o falecimento de sua mãe e se acostumou a ouvir histórias sobre beisebol desde pequeno. O problema é que o beisebol se tornou algo como jogar o lixo na rua, como ele mesmo afirma. E então, na adolescência, Ray, após brigar com o pai, sai de casa dizendo que jamais respeitaria alguém cujo ídolo era um bandido. Ele se referia a “Shoeless” Joe Jackson, o ídolo de seu pai que foi suspenso por “entregar um campeonato”. Não houve tempo para reconciliação. Seu pai morreu antes que Ray se desculpasse. Já adulto e pai de família, Ray não esconde a mágoa por não ter acertado esta situação. É quando, no meio de seu milharal, uma misteriosa voz começa a mudar sua vida. A câmera se aproxima de Ray praticamente no mesmo nível do milharal e a voz surge como um sussurro no ouvido do protagonista e do espectador com as palavras “Se você construir, ele virá”. Um momento absolutamente marcante. Como podemos notar, não se trata de um longa apenas sobre beisebol. Por isso, mesmo que jamais tenha ouvido falar no esporte, o espectador pode ser completamente envolvido pela narrativa. Pense, por exemplo, nos seus grandes ídolos do esporte (seja ele futebol, voleibol ou outro qualquer) e entenderá o fascínio de Ray ao ver “Shoeless Joe” jogando em seu campo. Mérito da boa direção de Phil Alden Robinson, que conduz a narrativa com segurança e permite este envolvimento do espectador, criando ainda belos planos que exploram a imensidão dos milharais e lindos campos de Iowa, além do visual esplêndido nas cenas noturnas do iluminado campo de beisebol – graças também à boa direção de fotografia de John Lindley. Observe também como logo no início, o vídeo com imagens antigas e fotos introduz perfeitamente o espectador a trama, já dando pistas do problema de relacionamento entre Ray e seu pai. Ainda na parte técnica, a trilha sonora do ótimo James Horner tem um tom mágico, fabuloso, que se encaixa perfeitamente ao clima do filme. Além disso, conta com canções alegres e empolgantes que demonstram os sentimentos de Ray quando parte com sua perua Kombi em busca de Terence Mann (James Earl Jones).
Mas se na direção Robinson é competente com discrição, no roteiro seu grande trabalho é ainda mais notável. Além de mostrar a capacidade do esporte de marcar momentos de nossas vidas, o excelente roteiro, baseado em livro de W.P. Kinsella (qualquer semelhança não é mera coincidência), envolve o espectador de tal forma que este jamais questiona o que vê, deixando-se levar nesta viagem singular. Afinal de contas, “Campo dos Sonhos” não é um filme para entender lógica ou cientificamente, é um filme para sentir. E em seu último ato, desarma completamente as defesas do espectador e torna as lágrimas em algo inevitável. Seu ritmo delicioso e envolvente é mérito também da montagem de Ian Crafford, que além de ser direta, conta ainda com interessantes momentos, como a seqüência em que o plano do campo de beisebol coberto de neve indica a passagem do tempo antes da primeira aparição de “Shoeless” Joe. A cena que segue, aliás, é outro grande momento do longa, quando Karin interrompe a importante conversa sobre as finanças do casal para dizer “Papai, tem um homem no seu campo”. O espectador é levado pela narrativa sem saber muito bem pra onde, descobrindo depois que é para um final mágico e incrivelmente belo, um acerto de contas com o passado que leva a completa redenção de Ray. E apesar do grande tema central de “Campo dos Sonhos” ser revelado somente em seus minutos finais, podemos notar sua presença em diversos momentos da narrativa através de pequenos diálogos que remetem ao relacionamento entre Ray e seu pai, John Kinsella (Dwier Brown). Ray deixa claro, em conversas com Annie e Terence Man, a importância que sei pai teve em sua vida e a angústia que sentia por não ter conseguido se acertar com ele antes de sua partida. Além disso, ao dizer para Annie que tinha medo de estar ficando igual ao velho John, Ray ratifica que não desistiria da construção do campo, por mais absurda que pudesse parecer. Trata-se do dilema de qualquer ser humano que sente estar chegando a uma fase decisiva de sua vida sem ter realizado seus sonhos e desejos.
Seria essencial que o ator escolhido para viver Ray conquistasse a platéia e fizesse com que o espectador fosse cúmplice da busca do personagem, e Costner é muito competente nesta tarefa, graças à sua grande atuação e ao seu inegável carisma. Por isso, o espectador jamais questiona as atitudes de Ray, por mais absurdas e ilógicas que pareçam. Sua busca obstinada por algo que nem ele conseguia identificar com clareza comove e traz pra junto dele o espectador. O ator também mostra competência no timing cômico em diversos momentos, como quando sua mulher pergunta “se construir o que, quem virá?” e ele responde desapontado que “a voz não disse…” ou quando Annie questiona o que fazer caso a voz apareça enquanto ele está fora e ele responde ironicamente “pegue o recado”. A cumplicidade do casal, aliás, é essencial para o sucesso da narrativa e a dupla Costner/Amy Madigan se sai muito bem, demonstrando excelente química. Somente com o suporte de uma esposa como Annie um homem seria capaz de fazer o que Ray faz. Observe o sorriso de satisfação dele ao olhar para o campo assim que fica pronto e dizer “criei algo completamente ilógico”. Ele não desistiu de seu sonho, por mais absurdo que fosse, e se sentiu recompensado por isto. Madigan, por sua vez, se sai muito bem como a espontânea e confidente Annie, destacando-se na divertida discussão sobre livros numa escola, que serve também como uma crítica ao puritanismo.
Quem também está bem é Ray Liotta no papel do lendário “Shoeless” Joe Jackson. Mantendo sempre um ar misterioso e ao mesmo tempo de deslumbramento, Liotta transmite perfeitamente a alegria do ex-jogador ao voltar a pisar num campo de beisebol, chegando a perguntar se ali era o paraíso. A cômica resposta de Ray “Não. É Iowa” será substituída no final por uma reflexão emocionada do fazendeiro, que ao ouvir seu pai dizer que o paraíso é o lugar onde os sonhos se realizam, enquanto vê sua esposa e filha brincando na varanda, responde “talvez aqui seja mesmo o paraíso”. James Earl Jones demonstra com competência a amargura de Terence Mann, um homem assombrado pela importância de seu passado diante de uma sociedade completamente diferente (e muito mais hipócrita). Sua revolta com os dias atuais fica clara quando grita para Ray “voltar aos anos sessenta”. O mundo é totalmente diferente pra ele hoje e o idealismo dos anos sessenta infelizmente não sobreviveu. A presença marcante de Earl Jones garante mais algumas seqüências de bom humor, como a “arma” de Ray ao invadir seu apartamento e a conversa dos dois antes de comprar um cachorro-quente. Sem falar na sua engraçada reação ao pensar o que diria para seu pai quando este anuncia seu desaparecimento no jornal. Completando o elenco, temos Burt Lancaster na pele do médico Moonlight Graham. Sua presença tem um tom mágico, reforçado pela nevoa que cai sobre a noite, pelo ar nostálgico dos carros antigos espalhados pelas ruas e até mesmo pelo anúncio de “O Poderoso Chefão” no cinema da cidade – o que é mérito também da boa direção de arte de Leslie McDonald. E a história do médico que quase foi jogador de beisebol é tocante, mostrando como às vezes, por mais que algo pareça ter dado errado, pode acabar sendo o melhor caminho. “Se eu tivesse sido médico por cinco minutos, isto sim teria sido uma tragédia filho”, diz ele, sem jamais negar o desejo frustrado de conseguir pelo menos uma rebatida como jogador de beisebol.
Quando Ray, já retornando pra casa, revela para Mann o motivo de sua mágoa com seu pai, fica claro para o espectador o quanto ele ainda sofre com a atitude intempestiva tomada na juventude. A morte de seu pai impediu sua reconciliação, e nas palavras sempre sábias de Terence Mann, “esta é sua penitência”. Mas felizmente, “Campo dos Sonhos” fala de redenção e reconciliação, e o acerto entre pai e filho acontece da forma mais inesperada e surpreendente possível. Ray, revoltado pelo fato de Mann ter sido convidado pelos jogadores a ir com eles para o misterioso milharal, questiona duramente seu ídolo “Shoeless” Joe e este responde: “É melhor ficar por aqui Ray”. O arrepio começa a subir nos espectadores mais atentos. Tudo indicava este final espetacular, de redenção. E Joe continua, dizendo “Se você construir… ele virá” e olha para o campo, onde vemos John Kinsella retirando a máscara e os acessórios. Então Ray, emocionado, desentala de sua garganta a frase “Quer jogar um pouco, pai?” e o choro é inevitável, independente do fato do espectador ter ou não perdido seus entes queridos. A mistura de sonho e realidade é perfeita, mexendo com sentimentos, elevando as emoções e desarmando completamente o espectador, que já não consegue mais pensar racionalmente sobre o que vê. O tema abordado, e principalmente, a forma como é abordado, supera pequenos detalhes. Obviamente, pessoas que já perderam os pais podem ter um impacto ainda maior nesta cena final, mas posso dizer – e aqui abro espaço para um comentário extremamente pessoal – que eu sempre me emociono demais nesta cena, e graças a Deus, tenho meus pais vivos.
Singelo e absolutamente tocante, “Campo dos Sonhos” é uma pérola, por vezes esquecida, que tem a incrível capacidade de fazer com que o espectador se envolva de tal forma com a narrativa que nada mais lhe importa. Muito bem dirigido e interpretado, é um filme mágico, que toca o lado mais sensível do ser humano, por mais frio que este possa ser. “Campo dos Sonhos” é mais que uma celebração do beisebol. É uma celebração do perdão, da reconciliação e da própria vida.
PS: Quando a jovem Karin diz que as pessoas viriam ver o campo de todos os lugares, estava inconscientemente fazendo uma profecia que transcende o filme, já que o “Campo dos Sonhos” em Iowa é visitado anualmente por milhares de fãs ainda nos dias de hoje.
Parabéns excelente critica , o filme é belíssimo.
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Obrigado Carlos.
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Já vi o filme inúmeras vezes e não me canso nunca. Choro todo o tempo! Teu comentário toca no ponto certo: é um filme para sentir. Parabéns.
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Muito obrigado Maria.
Um abraço.
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Campo dos Sonhos é um filme sensível e que acerta em cheio no tema “pais e filhos”. Mas é impossível para qualquer cinéfilo no mundo não se emocionar com a curta e memorável participação do inesquecível Burt Lancaster em seu último filme no cinema, sobretudo na cena em que um personagem lhe diz “thanks, doc” e Burt nos olha generosamente antes de sair de cena pela última vez! http://www.bauderesenhas.com.br/news/campos-dos-sonhos/
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um bom filme , merecia o oscar no ano fraco que foi 89
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Realmente 1989 não foi um ano tão farto. Mas Campo dos Sonhos é um filme memorável.
Abraço.
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Morreu hoje o dono da ideia do “Frescobol” e outras coisas mais é com 87 anos mas quem ocupara o lugar destas pessoas recentemente foi chico anizio com 81 anos quem ocupara o lugar destas pessoas com o mesmo talento com o mesmo sucesso pessoas que elas mesma não faz ideia de seu sucesso e não virarão filme e não foram reconhecido mundialmente só se fazer um filme contado agora .
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Não entendi muito bem a linha de raciocínio Moacir.
Abraço.
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Gostou então la vai mais uma se trata do TRAGRIBOL é o futebol de trator num campo onde 5 tratores de um lado e do outro e uma bola gigante e ela deve ser empurrada pra dentro do gol e o canasauro vai dar muitos pulinhos comemorando porque biribol ele ja esta devendo então meu amigo é só filmar dono do “sonhos de um homem do campo “com direito a tragribol biribol e canasauro juntos .
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Olá Moacir.
Acho que está procurando no lugar errado. Não sou diretor de cinema, apenas escrevo sobre filmes, ok?
Abraço.
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Venham pra região de araçatuba ver o campo de sonho do homem do campo de hoje com meio ambiente e agronegóço num futuro e desenvolvimento regional jamais visto e com o personagem “Canasauro ” podera ainda mais alegrar com um bom filme incluindo tudo isso pra dar muito mais alegria nas telinha do cinema.
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Olá Moacir.
Interessante sua mensagem, se puder nos enviar mais detalhes, agradecemos.
Abraço.
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Parabens, Roberto. Excelente descriçao do filme.
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Obrigado Renato!
Agradeço pela visita, pelo elogio, seja bem vindo ao Cinema & Debate e volte sempre.
Grande abraço.
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Olá. Agradeço pelo interesse, mas prefiro manter o Cinema & Debate focado no cinema.
Em todo caso, agradeço pela visita e pelos elogios ao conteúdo do blog.
Sejam bem vindos ao Cinema & Debate e voltem sempre.
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