007 NA MIRA DOS ASSASSINOS (1985)

(A View to a Kill)

3 Estrelas 

Videoteca do Beto #204

Dirigido por John Glen.

Elenco: Roger Moore, Christopher Walken, Grace Jones, Tanya Roberts, Patrick Macnee, Willoughby Gray, Patrick Bauchau, Robert Brown, Lois Maxwell, Desmond Llewelyn, Dolph Lundgren, David Yip, Fiona Fullerton, Maud Adams, Alison Doody e Walter Gotell.

Roteiro: Richard Maibaum e Michael G. Wilson, baseado em história de Ian Fleming.

Produção: Albert R. Broccoli e Michael G. Wilson.

007 Na Mira dos Assassinos[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Já contestado pelo peso da idade (na época, o ator estava com 57 anos), Roger Moore faria neste “007 Na Mira dos Assassinos” sua última aparição na pele de James Bond. Mesmo sem jamais alcançar o carisma de Sean Connery, o ator deixou sua contribuição para a franquia, criando um 007 mais cômico que seu antecessor e que, mesmo distante em tom e sem o mesmo charme, funcionava em muitos momentos. É uma pena, portanto, que os últimos trabalhos de Moore não estejam à altura de suas melhores aparições, nas quais ao menos o ator compensava as falhas da narrativa com atuações mais interessadas.

Escrito por Richard Maibaum e Michael G. Wilson novamente com base em história de Ian Fleming, “007 Na Mira dos Assassinos” narra à tentativa de James Bond (Roger Moore) de impedir que o milionário Max Zorin (Christopher Walken) controle o mercado de produção de chips através da execução de um plano que envolve a destruição de todas as indústrias do Vale do Silício, na Califórnia.

Em sua despedida da série, Roger Moore mais parece se divertir e relaxar na pele do personagem do que se preocupar em oferecer novas nuances a James Bond, saindo-se bem em alguns diálogos que denunciam seu tom quase sempre irônico, mas escancarando a flagrante falta de vigor nas lutas corporais. Claramente fora de forma e atuando quase no piloto automático, Moore oferece aqui sua pior atuação na pele de 007, numa despedida melancólica que dificulta a tarefa de apontar algum momento de destaque, com exceção dos comentários marcados por seu humor peculiar e pelo cavalheirismo na primeira noite com Sutton (Tanya Roberts), na qual Bond respeita o momento da moça e não dorme com ela – e a expressão de Moore evidencia esta abordagem respeitosa.

Entre gritos e expressões características da mocinha indefesa, Tanya Roberts oferece uma performance patética na pele de Stacey Sutton, não convencendo como uma moça rica e poderosa que decide bater de frente com Zorin e sequer conseguindo criar empatia com Moore, o que talvez explique a falta de cenas românticas entre os personagens. Já Grace Jones compõe May Day de maneira bastante caricata, mas a personagem ao menos funciona por representar alguma ameaça a Bond. Fechando os destaques femininos do elenco, “007 Na Mira dos Assassinos” marca também a última aparição de Lois Maxwell como a simpática Moneypenny – o que, com o perdão do infame trocadilho, é uma pena.

Roger Moore se diverte e relaxaMocinha indefesaMay DayVoltando ao elenco masculino, Patrick Macnee vive o simpático Tibbett, o amigo enviado para auxiliar Bond e que, passando-se por seu criado, vive alguns dos raros momentos bem humorados que realmente funcionam na narrativa. Repare, por exemplo, como Tibbett acaricia os cavalos após se esconder junto a eles no estábulo, num pequeno detalhe que demonstra o cuidado do ator na composição do personagem, já que para esconder-se ali por tanto tempo era necessário no mínimo que ele criasse alguma empatia com os animais.

Sorridente na frente de Bond e sério longe dele, Christopher Walken compõe um vilão interessante na pele de Max Zorin, demonstrando classe nas conversas em eventos públicos como a festa em seu palácio e evidenciando seu lado psicótico ao explicar seu plano para os parceiros. Aliás, a conversa com empresários para explanar o plano Main Strike remete diretamente a “007 Contra Goldfinger”, especialmente quando um deles se recusa a aceitar a proposta e é sumariamente assassinado.

Sublinhando a trama, a trilha sonora também convencional de John Barry surpreende apenas na sequência inicial em que o compositor ousa e insere um trecho de uma versão cover de “California Girls”, dos Beach Boys, fazendo uma brincadeira com as manobras radicais de James Bond sobre a neve e a água. Além disso, a dançante música tema do Duran Duran tem a cara dos anos 80 e traz uma boa energia para a série.

Tentando recuperar o tom mais sério após a piada “007 Contra Octopussy”, John Glen e seu diretor de fotografia Alan Hume ignoram o sol característico da Califórnia e apostam num visual mais obscuro que confere uma aura sombria a narrativa. Ainda assim, o diretor encontra espaço para criar belos planos, especialmente ao enquadrar toda a imponência da ponte Golden Gate em San Francisco e o charme de Paris, que finalmente é explorada na série. Além disso, o ótimo Peter Lamont capricha novamente no design de produção de ambientes como o luxuoso palácio de Zorin, a espaçosa e bem decorada casa de Sutton, a detalhada clínica que esconde o segredo do cavalo Pegasus e a impressionante mina que surge já no ato final.

Para balancear a falta de agilidade de Moore nos confrontos físicos, Glen tenta criar cenas de ação ainda mais mirabolantes, como a perseguição que inicia na Torre Eiffel e segue pelas ruas de Paris. Só que o convencional segmento de abertura envolvendo uma perseguição de esqui na neve já deixa claro que “007 Na Mira dos Assassinos” não trará grandes novidades neste aspecto também. O diretor tenta ainda utilizar a câmera para ampliar a tensão, como quando uma arma surge em primeiro plano enquanto Bond entra na casa de Sutton ao fundo, sinalizando a presença dos capangas de Zorin para o espectador, que passa a saber mais do que o personagem – o que é sempre eficiente na criação de uma atmosfera tensa. E finalmente, a morte de Tibbett no lava rápido é conduzida de maneira interessante pelo diretor.

Zorin, vilão interessanteImpressionante minaArma em primeiro planoMas o destaque das cenas de ação fica mesmo para o incêndio na prefeitura seguido pela perseguição envolvendo um carro de bombeiros e, principalmente, para a impactante destruição da mina, na qual o diretor utiliza planos subjetivos que nos colocam na posição dos personagens em diversos instantes enquanto a água domina o local sob os tiros alucinados do impiedoso Zorin. Além delas, a luta no alto da ponte Golden Gate também é tensa e diverte, mas a gritante lentidão de Moore e os efeitos visuais datados prejudicam a cena, ainda que no segundo caso a evolução em relação aos filmes anteriores seja perceptível.

Perceptível também é a tentativa de melhorar a imagem da franquia depois de seguidas derrapadas, mas infelizmente “007 Na Mira dos Assassinos” não conseguiu este feito. Roger Moore perdia aqui a sua licença para matar (ainda que, em certos momentos, tenha nos matado de vergonha), mas, para a alegria dos inúmeros fãs, James Bond ainda teria vida longa nas telonas.

007 Na Mira dos Assassinos foto 2Texto publicado em 29 de Maio de 2014 por Roberto Siqueira

007 CONTRA OCTOPUSSY (1983)

(Octopussy)

2 Estrelas 

Videoteca do Beto #203

Dirigido por John Glen.

Elenco: Roger Moore, Maud Adams, Louis Jourdan, Kristina Wayborn, Kabir Bedi, Steven Berkoff, David Meyer, Tony Meyer, Desmond Llewelyn, Robert Brown, Lois Maxwell, Walter Gotell, Vijay Amritraj e Albert Moses.

Roteiro: George MacDonald Fraser, Richard Maibaum e Michael G. Wilson, baseado em histórias de Ian Fleming.

Produção: Albert R. Broccoli.

007 Contra Octopussy[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Com uma sequência de abertura de tirar o fôlego e um ato final que poderia ser empolgante, “007 Contra Octopussy” tinha tudo para se tornar um dos bons filmes da franquia 007, não fossem os problemas narrativos apresentados entre estes dois momentos de impacto. Com boas cenas de ação e alguns personagens carismáticos, o segundo filme dirigido por John Glen apresenta uma pequena evolução em relação ao trabalho anterior do diretor, mas ainda peca em detalhes cruciais que tornam o longa bastante irregular, especialmente ao perder o senso do ridículo em momentos embaraçosos até mesmo para o mais fervoroso fã do agente secreto britânico.

Escrito a seis mãos por George MacDonald Fraser, Richard Maibaum e Michael G. Wilson com base em duas histórias de Ian Fleming (“Octopussy” and “The Property of a Lady“), “007 Contra Octopussy” inicia com o assassinato do agente 009 (Andy Bradford) após este roubar a réplica de uma relíquia soviética. Convocado para investigar o caso, James Bond (Roger Moore) acaba descobrindo um plano que poderia resultar na explosão de uma bomba atômica e numa provável guerra mundial.

Apesar da menção inicial a Cuba, o inimigo principal do governo britânico continua sendo a União Soviética em “007 Contra Octopussy”, com a diferença que, desta vez, outro histórico adversário finalmente entra em cena: a Alemanha. Outra vez envolvendo uma bomba atômica que irá dizimar milhões de inocentes, a trama tenta seguir elementos básicos da fórmula de sucesso da série, apostando em espetaculares cenas de ação, mulheres sensuais, pitadas de bom humor (que aqui raramente funcionam) e um inimigo comum ao espectador britânico e norte-americano. No entanto, a falta de inspiração de algumas gags (como o ridículo jacaré mecânico utilizado por Bond) e a latente ausência de um vilão prejudicam bastante a narrativa.

Partindo de uma Berlim inicialmente obscura e opressora, a fotografia de Alan Hume estabelece um forte contraste com o visual colorido e vivo de Nova Déli, na Índia, especialmente no plano inicial que enquadra toda a beleza do Taj Mahal. Da mesma forma, o excelente design de produção de Peter Lamont se destaca na criação de ambientes realmente impactantes como a sala de reuniões dos generais soviéticos e o aconchegante quarto de Octopussy, o que também estabelece corretamente a atmosfera de cada local. Reforçando a imagem que pretende passar em cada ambiente, John Glen retrata cada povo de maneira bastante estereotipada (o que também é uma marca da série), trazendo os sorridentes indianos aglomerados em volta do rio, os efusivos russos discutindo estratégias de guerra e os alemães, quando não são sisudos, surgem comendo salsichas e tomando cerveja num carro de família – o que certamente deve deliciar grande parte do público norte-americano, ainda que esteja bem longe da realidade.

Berlim inicialmente obscuraColorido de Nova DéliSala de reuniões dos generais soviéticosMas, convenhamos, realismo é algo que os filmes de James Bond jamais tentaram retratar. Neste aspecto, “007 Contra Octopussy” ganha pontos ao trazer na abertura uma estilosa fuga de 007 num jato sendo perseguido por um míssil, que se torna ainda mais interessante pela maneira como é montada por Peter Davies e Henry Richardson. Vale destacar ainda a ótima partida de gamão entre Bond e Kamal, que realça toda a esperteza do protagonista, além é claro da perseguição repleta de ação e humor nas ruas de Nova Déli. Já a perseguição com elefantes simplesmente não funciona, primeiro pela falta de dinamismo e depois pelas piadas sem graça, como quando Bond, acredite ou não, surge imitando Tarzan. Outro momento que falha nos dois sentidos ocorre quando Bond surge disfarçado de gorila e, segundos depois, já aparece sem o disfarce e saindo do trem. Além de não ser nada engraçada, a cena ainda tira o espectador da narrativa. Uma coisa é ter cenas de ação mirabolantes, outra são coisas impossíveis de acontecer.

Aliás, desta vez Roger Moore descamba de vez para o pastelão na pele de James Bond, intercalando momentos glamourosos como na citada partida de gamão com outros em que ridiculariza o personagem ao surgir vestido de palhaço ou disfarçado de gorila. Ao menos, Moore mantém a postura confiante e até desleixada diante do perigo e o senso de humor peculiar, superando ainda as limitações impostas pela idade na divertida sequência em que anda em cima de um trem em movimento, num momento que funciona quando se apoia nas trucagens e em efeitos mecânicos, falhando apenas quando recorre aos datados efeitos visuais.

Numa sacada inteligente, o tema de 007 tocado na flauta de Vijay (Vijay Amritraj) anuncia a chegada do agente em Nova Déli, num dos bons momentos da trilha sonora de John Barry, que se destaca ainda na composição romântica inspirada na música tema “All Time High” (uma das raras da franquia que não tem o mesmo nome do filme) que embala os momentos íntimos de Bond com as duas mulheres que cruzam o seu caminho – e é claro que ele dorme com ambas.

Apresentada durante o leilão que coloca Bond no caminho de Kamal, a sensual Magda vivida por Kristina Wayborn vive até melhores momentos ao lado do agente do que a personagem título, dentre os quais se destaca a primeira noite que eles passam juntos e, especialmente, a despedida pela manhã em que ela desce da sacada pendurada no próprio vestido. Por sua vez, Octopussy é cercada de mistérios. Evitando revelar seu rosto na primeira aparição dela no Palácio, o diretor mantém o suspense até o instante em que Maud Adams surge com seus olhos penetrantes para participar pela segunda vez da série. Classuda, com tom de voz controlado e bastante educada, Octopussy se torna uma personagem intrigante, impondo respeito e chamando a atenção sempre que entra em cena. É uma pena, portanto, que tenha tão pouco espaço na narrativa, aparecendo menos até mesmo que sua colaboradora Magda – e a personagem também é prejudicada pelo roteiro, que a enfraquece consideravelmente no decorrer da narrativa.

Estilosa fuga de 007 num jatoBond imitando TarzanOctopussy cercada de mistériosOctopussy, aliás, é a primeira vilã feminina da série. No entanto, ela não chega a ser de fato uma vilã, acolhendo Bond desde o primeiro instante e tornando-se sua parceira ao longo da narrativa, especialmente após descobrir que foi enganada por Kamal, o intermediador interpretado por Louis Jourdan. E é exatamente na falta de um grande vilão que reside um dos grandes problemas do fraco roteiro de “007 Contra Octopussy”. Teoricamente, a vilã seria a personagem título, mas na prática o homem a ser perseguido é mesmo o caricato e unidimensional General Orlov de Steven Berkoff, já que Kamal tem apenas a função de negociador. Só que Orlov raramente é confrontado por Bond, a não ser num embate que dura poucos segundos dentro de um trailer já no ato final. Assim, o mistério envolvendo os vilões acaba soando como um artifício raso utilizado para encobrir o vazio da narrativa neste aspecto.

Ainda que no íntimo o espectador sempre espere que Bond salve o dia, a sequência final no circo tem certa carga de tensão, mesmo com a escancarada tentativa de destruir a imagem do personagem ao trazê-lo em disfarces tão risíveis, assim como funciona a absurda cena final em que Bond luta do lado de fora de um avião, numa sequência exagerada, mas bem conduzida pelo diretor.

Infelizmente, estas boas cenas de ação não são suficientes para compensar os tropeços da narrativa e a falta de senso do ridículo de muitos momentos dela. Talvez por isso, Ian Fleming resolveu não misturar as duas histórias que inspiraram “007 Contra Octopussy”. Ao contrário dos alemães na época separados pelo muro, elas não foram criadas para coexistir.

007 Contra Octopussy foto 2Texto publicado em 28 de Maio de 2014 por Roberto Siqueira

007 CONTRA O HOMEM COM A PISTOLA DE OURO (1974)

(The Man with the Golden Gun)

4 Estrelas 

Videoteca do Beto #199

Dirigido por Guy Hamilton.

Elenco: Roger Moore, Christopher Lee, Maud Adams, Britt Ekland, Richard Loo, Yiu Lam Chan, Hervé Villechaize, Lois Maxwell, Desmond Llewelyn, Clifton James, Bernard Lee, Marne Maitland  e Marc Lawrence.

Roteiro: Richard Maibaum e Tom Mankiewicz, baseado em romance de Ian Fleming.

Produção: Albert R. Broccoli e Harry Saltzman.

007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Após tropeçar em “Com 007 Viva e Deixe Morrer”, Guy Hamilton volta a boa forma neste interessante “007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro” que, mesmo com falhas, consegue resgatar a essência dos bons filmes da série graças a mescla mais equilibrada entre as boas cenas de ação e os momentos de humor, passando também pela narrativa coesa e por personagens mais carismáticos – entre eles, o ótimo vilão interpretado por Christopher Lee.

O roteiro escrito pelos experientes Richard Maibaum e Tom Mankiewicz inspirado em romance de Ian Fleming parte de uma premissa muito interessante ao trazer o icônico James Bond (Roger Moore) recebendo uma curiosa ameaça de morte através da inscrição “007” numa bala de ouro enviada ao Serviço Secreto Britânico. Após M (Bernard Lee) sugerir que ele peça demissão ou tire férias, Bonde decide investigar o caso e acaba descobrindo a ligação entre o sequestro de um cientista que descobriu como captar energia solar e o assassino profissional que o ameaçou conhecido como Francisco Scaramanga (Christopher Lee).

Ao colocar Bond sob a mira de um perigoso assassino, “007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro” faz uma interessante inversão de papeis que torna sua narrativa mais envolvente, num verdadeiro jogo de gato e rato repleto de momentos inspirados, como quando Bond utiliza uma estranha anomalia para se passar por Scaramanga e, assim, conseguir conversar com o poderoso Hai Fat (Richard Loo). Desta forma, passamos a temer constantemente pelo destino do agente secreto, especialmente quando percebemos que Scaramanga é um vilão bem mais ameaçador do que os que estamos acostumados na série.

Explorando desta vez o lado exótico das locações em Macau e Hong Kong, Guy Hamilton e seus diretores de fotografia Ted Moore e Oswald Morris criam um primeiro ato bastante sombrio, repleto de cenas noturnas e ambientes fechados que ajudam a criar uma atmosfera mais séria, ilustrando bem a ameaça ao protagonista. Além disso, Hamilton utiliza a câmera de maneira inteligente para dar dicas essenciais ao espectador, seja na maneira quase idêntica que filma o segmento de abertura e o ato final, chamando nossa atenção para qualquer detalhe que não seja similar, seja ao realçar o navio Queen Elizabeth encalhado no porto de Hong Kong através de planos gerais e de uma narração diegética, indicando um local que seria importante para a narrativa no futuro, no qual um diálogo expositivo entre Bond e seus companheiros de Serviço Secreto basicamente explica a trama e as motivações dos personagens para a plateia.

Intercalando entre as ações de James Bond e Scaramanga, os montadores Raymond Poulton e John Shirley são responsáveis também por imprimir um ritmo dinâmico nas cenas de ação (que abordarei em instantes), assim como é importante também o design de som, ainda que este só se destaque mesmo no ato final, ao demonstrar a potencia das explosões que destroem o esconderijo de Scaramanga e o impacto delas na ilha. Compondo uma trilha sonora repleta de toques orientais, John Barry volta à franquia sem grande destaque, economizando também na utilização do tema clássico de 007, que, como de costume, surge somente em momentos pontuais.

Adotando um tom mais cômico que o de costume, Guy Hamilton consegue um balanço eficiente que mantém o espectador atento sem jamais permitir que ele relaxe, ainda que a divertida participação do xerife J. W. Pepper (Clifton James) de “Com 007 Viva e Deixe Morrer” renda boas gargalhadas. Mas estes momentos não tiram o foco principal da narrativa nem quebram a tensão gerada sempre que Scaramanga entra em cena. Mas e quanto a James Bond?

Estranha anomaliaNavio Queen ElizabethBond mais virilLogo na primeira luta em Istambul, Roger Moore já demonstra evolução no que tange aos aspectos físicos e parece muito mais convincente do que no longa anterior, o que confere uma nova dimensão para o personagem. Só que na busca por soar mais viril, o ator parece passar da conta em certos instantes, como quando ameaça o fabricante de armas Lazar (Marne Maitland) para obter informações, assim como faz com a Srta. Anders (Maud Adams, que voltaria em “007 Contra Octopussy”), chegando a agir violentamente no segundo caso, numa abordagem que foge do estereótipo de herói tradicional, mas que por outro lado nos faz questionar onde foi parar o 007 que utilizava seu charme a favor nestes momentos. Por outro lado, esta agressividade também rende bons momentos, como quando Bond acerta um chute num adversário ainda nos cumprimentos pré-luta de um torneio, quebrando a regra de maneira surpreendente e divertida.

Quem também quebra regras é o próprio longa ao trazer uma moça completamente nua numa piscina enquanto fala com Bond. Ainda que a água dificulte a visão, é a primeira vez que vemos uma mulher completamente nua na série. Aliás, é difícil dizer qual é a mais bela entre as bondgirls de “007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro”. Enquanto a Srta. Anders de Maud Adams revela uma vulnerabilidade tocante sendo facilmente descartada pelo vilão, a agente secreta Goodnight interpretada por Britt Ekland nos diverte com suas trapalhadas que, por outro lado, enfraquecem profissionalmente a personagem.

Quem nunca perde força é o vilão, um homem inteligente e cruel, capaz de matar o poderoso Hai Fat a sangue frio e, no segundo seguinte, assumir o comando de seu império. Discreto e realmente perigoso, Christopher Lee compõe Scaramanga como um homem fino que esconde suas cruéis ambições sob aquela carcaça de elegância, chegando a soar carismático em diversos momentos, especialmente nos diálogos com Bond em que demonstra sua inteligência. Observe, por exemplo, sua clareza e fluência enquanto apresenta o inventivo sistema de captação de energia solar – que, aliás, também impressiona pela criatividade das instalações concebidas pelo design de produção de Peter Murton. Na pele de um ator talentoso como Lee, James Bond encontra um antagonista à altura.

Vulnerabilidade tocanteAtrapalhada GoodnightScaramanga inteligente e cruelCom um vilão respeitável e Roger Moore claramente mais a vontade no papel de 007, Hamilton concentra esforços no desenvolvimento de cenas de ação empolgantes, como a excelente perseguição de carros que culmina na espetacular travessia de Bond de um lado para o outro do rio antes de chegar ao local onde Scaramanga fugiria em seu criativo carro voador. No entanto, o destaque fica mesmo para o duelo final que remete a cena de abertura dentro dos ambientes preparados por Scaramanga, numa rima narrativa elegante que funciona também dramaticamente justamente porque o espectador sabe exatamente os perigos que aguardam James Bond, enquanto o próprio personagem ainda terá que descobri-los. Após uma tensa perseguição, chegamos ao momento crucial em que Hamilton enquadra o suposto boneco de 007 por trás, realçando os dedos inteiros em sua mão e anunciando que aquele é o verdadeiro James Bond, numa solução eficiente que conclui muito bem o duelo ao som do tiro fatal do agente secreto que finalmente vence Scaramanga.

O ato final ainda nos traz um último instante de alta tensão enquanto Bond tenta retirar o Solex, com a montagem intercalando entre sua ação, as trapalhadas de Goodnight e a nuvem que encobre o sol momentaneamente. Já o ataque final do anão Nick Nack (Hervé Villechaize) poderia tranquilamente ser descartado, pois não agrega em nada à narrativa.

Ao contrário de Nick Nack, “007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro” agrega bastante à filmografia de James Bond, com sua narrativa envolvente e seu marcante vilão. A música tema pouco inspirada e recheada com uma deselegante conotação sexual a gente até perdoa.

007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro foto 2Texto publicado em 22 de Maio de 2014 por Roberto Siqueira