DE VOLTA PARA O FUTURO (1985)

(Back to the Future) 

 

 

Videoteca do Beto #33

Dirigido por Robert Zemeckis.

Elenco: Michael J. Fox, Christopher Lloyd, Lea Thompson, Crispin Glover, Thomas F. Wilson, Claudia Wells, Mark McClure, Wendie Jo Sperber, George DiCenzo, Lee McCain, James Tolkan e Billy Zane.

Roteiro: Robert Zemeckis e Bob Gale.

Produção: Neil Canton e Bob Gale. Produção Executiva de Steven Spielberg.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

A curiosidade comum à maioria dos filhos sobre a época em que seus pais eram jovens é o fio condutor desta produção absolutamente encantadora dirigida por Robert Zemeckis e produzida por Steven Spielberg. Como eles eram? O que faziam? Será que tinham os mesmos dilemas, dúvidas e preocupações? Como se divertiam? Todas estas respostas são apresentadas ao jovem McFly de forma maravilhosa, explorando ao máximo um roteiro incrivelmente inteligente e original. “De Volta para o Futuro” é uma obra-prima da ficção que mostrou a cara dos anos oitenta como poucas obras fizeram.

A trama do filme é criativa e eficiente. O jovem Marty McFly (Michael J. Fox) aciona acidentalmente uma máquina do tempo criada pelo seu amigo e cientista Dr. Emmett Brown (Christopher Lloyd), retornando ao ano de 1955, onde conhece seu pai, ainda jovem, e posteriormente sua mãe. O problema é que ela acaba se apaixonando por ele e, conseqüentemente, colocando em risco sua própria existência. Desta forma, Marty deverá criar uma maneira para que seus pais se encontrem e fiquem juntos, evitando alterar o curso da história e permitindo o seu próprio nascimento.

Lendo assim, da forma que está, parece complicado. Mas o roteiro perfeito escrito por Robert Zemeckis e Bob Gale faz com que tudo se torne mais simples. Sem nenhum furo, ele consegue fazer com que todas as cenas tenham importância na trama, normalmente apresentando elementos que refletem em outros instantes da narrativa. Não é raro encontrar em uma mesma cena dois ou três elementos que podem ter importância em eventos futuros (ou refletirem atitudes do passado). Note, apenas como exemplo, como o verso do papel onde Jennifer (Claudia Wells) anota seu telefone será de suma importância para que Marty consiga voltar aos anos oitenta posteriormente. Além disso, o roteiro não perde as excelentes oportunidades criadas pela viagem no tempo e oferece piadas impagáveis, como aquela em que Marty toca “Johnny B. Goode”, fazendo com que o primo de Chucky Berry ligue imediatamente pra ele, e logo em seguida, quando Marty toca guitarra com o marcante estilo roqueiro de ser e assusta a platéia, somente para dizer que “eles não estava preparados para aquilo ainda, mas os filhos deles iriam adorar”. Genial.

É claro que a competente direção de Robert Zemeckis também tem muita importância. A começar pelo travelling inicial, que nos mostra os muitos relógios do Dr. Brown (ou “Doc”) simbolizando o tempo, tão importante na narrativa, e as noticias no jornal, rádio e televisão, que servem para nos situar no ano de 1985. Além disso, é perceptível já no primeiro plano do filme a enorme criatividade do Dr. Brown, através da parafernália criada para dar comida ao seu cachorro (não por acaso chamado Einstein) e fazer café. Vale à pena observar também como ao chegar ao centro da cidade, em 1955, Zemeckis diminui Marty em um plano geral que, além de mostrar como era a cidade na época (destacando o ótimo trabalho de direção de arte de Todd Hallowell), ilustra como Marty está perdido naquele local. O diretor cria outro plano excepcional na primeira vez em que pai e filho, agora com a mesma idade, aparecem juntos, colocando-os lado a lado. Este plano é de um simbolismo imenso. Podemos comparar as gerações e até mesmo a personalidade de cada um deles, além de observar o misto de encanto e susto do garoto ao ver o pai tão jovem. Zemeckis também tem mérito na criativa forma utilizada para viajar no tempo. O uso do carro, que lembra uma nave espacial, é genial, pois permite que ele viaje junto e sirva para voltar novamente ao presente.

Outro segredo da enorme empatia que o filme cria no espectador está na química perfeita entre o jovem Marty e o cientista “Doc”. Mérito das excelentes atuações de Michael J. Fox, que esbanja jovialidade e simpatia, e Christopher Lloyd, com seu jeito maluco e exagerado que casa muito bem com o personagem (seu visual se inspirou em Einstein, que dá nome ao seu já citado cachorro). Sempre inquieto, seu olhar arregalado e sua energia refletem muito bem a ansiedade do criativo cientista, sempre em busca de novas descobertas. Já o jovem Marty é o elo perfeito entre o filme e o público. É maravilhoso acompanhar, através do olhar dele, como seus pais eram jovens normais, que tinham paixões, dilemas, dúvidas e até mesmo vícios. Sua família problemática (tio preso, pai recatado e sufocado pelo chefe, mãe alcoólatra e irmãos inúteis) colabora com nossa imediata identificação com o personagem, além é claro do inegável carisma de Fox. E aqui o filme também cria conexões com o passado, já que a forma de agir no presente apenas reflete atitudes tomadas na juventude do casal. Repare como Lorraine McFly (Lea Thompson) recorda com nostalgia a forma que conheceu George (Crispin Glover), que nem sequer presta atenção, pois está ligado no programa de televisão. O desempenho do casal, aliás, merece grande destaque. Crispin Glover oferece um ótimo desempenho como o fracassado George, deixando claro como os traumas da juventude refletiam em sua vida de adulto. Por outro lado, a excelente atuação de Lea Thompson cresce muito durante a juventude de Lorraine. Observe a forma apaixonada com que ela olha para Marty, com a fala ofegante, demonstrando ansiedade ao pedir que ele a convide para o baile. Em outro momento, seu sorriso mistura embaraço e satisfação, ao ouvir Marty falar sobre a possibilidade de um dia ela e George terem filhos. E mesmo quando representa Lorraine já adulta ela não compromete, primeiro passando uma imagem de mãe conservadora, e depois, como reflexo das mudanças no passado, se mostrando uma mãe moderna e muito mais feliz. Lorraine era uma garota como outra qualquer, impulsiva, apaixonada e romântica. Como muitos jovens, tinha vícios (fumava e bebia, o que provoca um choque em Marty), porém, como a maioria dos adultos, pedia ao filho que não tivesse. Lorraine fazia tudo que posteriormente, já como adulta e mãe, proibia os filhos de fazer. Esta atitude, que normalmente é uma forma de tentar proteger os filhos, acaba tendo um efeito contrário em muitos casos, e é interessante notar como até mesmo este tema o filme aborda de forma inteligente e divertida. Finalmente, merece destaque o excepcional desempenho de Thomas F. Wilson como o cruel Biff.

Somente para não deixar passar batido, vale a pena destacar a excepcional maquiagem, notável tanto nos jovens atores, quando estes estão interpretando os pais de Marty, como no envelhecimento de Christopher Lloyd (repare seu pescoço e suas rugas no rosto). A bela trilha sonora é mérito de Chris Hayes e Alan Silvestri. Destaca-se também a excelente montagem de Harry Keramidas e Arthur Schmidt, que mantém um ritmo perfeito para o filme, misturando momentos de ficção, humor, aventura, ação e drama, sempre na medida certa. Existem momentos de ação, aliás, que deixam o espectador grudado na cadeira, como a perseguição em que Marty foge e, acidentalmente, “inventa” o skate e a seqüência angustiante que marca sua volta para 1985 (observe a inteligente transição feita através do plano do relógio). Além disso, o final coerente com as atitudes de Marty no passado (seus pais estão muito bem na vida e Biff é empregado de George), ainda deixa em aberto a seqüência da trilogia.

Explorando com muito talento a enorme curiosidade que os filhos têm de saber como eram os pais na juventude, o filme aproveita para deixar algumas mensagens interessantes. A mais importante delas é a de que as atitudes da juventude ecoam no resto de sua vida. George, por exemplo, era um jovem sem autoconfiança e isto refletia num adulto completamente indefeso e submisso. Pequenas mudanças de atitude no passado mudariam todo o curso de sua história, como o filme mostraria mais pra frente.

Sempre fico me perguntando o que eu faria se tivesse a oportunidade de viajar no tempo. Qual seria minha escolha, a nostalgia do passado ou o mistério do futuro? Mais divertido ainda é pensar que meu primeiro filho, que hoje está na barriga da mamãe, poderia voltar no tempo e testemunhar a enorme alegria que sua chegada nos proporcionou. Viajar nesta interessante premissa é só uma das muitas possibilidades que “De Volta para o Futuro” oferece. Experimente, por exemplo, rever o filme, observando pequenos detalhes que passaram batidos na primeira vez. Será sempre uma experiência divertida e reveladora. Clássico absoluto dos anos oitenta, esta maravilhosa aventura brinda o espectador com uma das idéias mais criativas já exploradas pelo cinema. Com personagens fascinantes, estimula nossa imaginação e nos diverte de uma forma intensa, inteligente e absolutamente inesquecível.

Texto publicado em 05 de Janeiro de 2010 por Roberto Siqueira

15 comentários sobre “DE VOLTA PARA O FUTURO (1985)

  1. joao furtado 21 fevereiro, 2013 / 6:17 pm

    Roberto Siqueira parabens pelo otimo roteiro, sou de manaus Am e muito apaixonado por esse filme, abraço

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    • Roberto Siqueira 21 fevereiro, 2013 / 10:15 pm

      Obrigado pelo elogio João.
      Abraço.

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  2. Mateus Aquino 5 agosto, 2012 / 3:08 pm

    Que filme, que filme. Acabei de assistir ele pela 1ª vez e adorei, nossa , absolutamente perfeito, não é preciso falar que é um dos melhores que ja vi. Abração

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    • Roberto Siqueira 13 setembro, 2012 / 10:13 pm

      Que legal que gostou.
      Abraço.

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  3. francisco 10 maio, 2011 / 11:09 am

    Este filme foi um dos primeiros a contrariar minhas expectativas que o cinema não produziria mais obras-primas a partir da década de 80. Parabéns à este inteligentíssimo Zemeckis que nos proporcionou esta “fábula” científica sensacional que não canso de rever. Mais uma vez, parabéns Roberto, pelo comentário táo genial quanto o próprio filme ! A tarja de Obra-prima é justíssima na minha opinião…Um abraço e obrigado !

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    • Roberto Siqueira 15 maio, 2011 / 9:16 pm

      Olá Francisco,
      Muito obrigado pelo elogio e concordo, este filme de fato merece o selo “obra-prima”.
      Abraço.

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  4. Cristiano Contreiras 12 agosto, 2010 / 11:10 am

    Ótimo texto sobre um clássico inesquecível. Eu tenho o box especial de colecionador com 4 dvds. Sempre revejo, o filme marcou minha infância – principalmente, o primeiro.

    Abraço

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    • Roberto Siqueira 12 agosto, 2010 / 9:26 pm

      Também tenho este box Cristiano, é sensacional!
      Abraço.

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  5. Davi 10 janeiro, 2010 / 7:41 am

    AAA acho que já vi antes. BTW, tenho 15 anos mas pareço ter 45. Amo clássicos e vou ver – ou rever – o filme agora, principalmente depois desta crítica maravilhosa que faz mesmo a gente querer ver o filme e comprar aquelas edições em livro que tem nos EUA.

    🙂

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    • Roberto Siqueira 10 janeiro, 2010 / 9:12 am

      Obrigado pelos elogios Davi.
      Este filme com certeza vale a pena rever e ter em casa.
      Um grande abraço, seja bem vindo ao Cinema & Debate e volte sempre.

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  6. Lourran Machado 6 janeiro, 2010 / 1:18 pm

    Excelente crítica e excelente filme. Sem dúvidas, Back to the Future é um dos meus filmes favoritos. Típico filme que deve ser visto inúmeras vezes, pois consegue ser divertido e inteligente ao mesmo tempo. É um clássico!

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    • Roberto Siqueira 6 janeiro, 2010 / 6:58 pm

      É verdade Lourran. Um filme para ser visto, e revisto, e revisto… Obrigado pelo elogio.
      Grande abraço.

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