MAD MAX 2 – A CAÇADA CONTINUA (1981)

(The Road Warrior)

 

Videoteca do Beto #56

Dirigido por George Miller.

Elenco: Mel Gibson, Bruce Spence, Michael Preston, Max Phipps, Vernon Wells, Kjell Nilsson, Emil Minty, Virginia Hey, William Zappa, Steve J. Spears, Syd Heylen, Moira Claux, David Downer e Arkie Whiteley.

Roteiro: Terry Hayes, George Miller e Brian Hannat.

Produção: Byron Kennedy.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Goste ou não de “Mad Max 2 – A Caçada Continua”, segundo filme da trilogia apocalíptica dirigida por George Miller e estrelada por Mel Gibson, uma coisa é certa: o espectador não sairá indiferente ao que viu. Utilizando um impressionante visual, que se tornou cult com o passar dos anos, o decadente mundo futurista retratado por Miller incomoda, chegando até mesmo a ser repulsivo e sufocante. Incomoda também a falta de diálogos do longa, algo proposital num mundo onde o relacionamento humano está extremamente desgastado. Por isso, apesar da importância do primeiro “Mad Max”, que até mesmo confere bagagem dramática para esta seqüência, este segundo filme se estabelece como o melhor da trilogia, já que o terceiro “Mad Max – Além da Cúpula do Trovão” é o responsável pela queda vertiginosa de qualidade da série.

Num futuro não muito distante, o bem mais precioso da terra passa a ser a gasolina, em virtude de uma guerra nuclear que acabou com os campos petrolíferos do Oriente Médio. Com o precioso combustível é possível se deslocar, fugir ou perseguir alguém. Sem ele, não é possível conseguir nada. É quando Max (Mel Gibson), um homem misterioso e amargurado pelo terrível passado, decide ajudar uma comunidade a defender sua refinaria contra uma gangue de motoqueiros em troca de gasolina.

Todas as palavras que precisam ser ditas em “Mad Max 2” estão resumidas na pequena e excelente introdução do filme, através de um vídeo que recorda a estória do primeiro “Mad Max” e conta como a guerra nuclear devastou o planeta. A partir dali, toda e qualquer palavra será desnecessária. As ações falam por si. Pra piorar, Max é sabidamente um personagem amargurado, de poucas palavras, devastado pela tragédia do passado que retirou as duas pessoas mais importantes de sua vida. Portanto, é absolutamente coerente e compreensível que o roteiro de Terry Hayes, George Miller e Brian Hannat se ressinta de palavras, o que inteligentemente abre espaço para a ação, tão bem conduzida pelo diretor.

Logo na primeira cena George Miller aproveita para matar a sede dos fãs, numa seqüência de perseguição muito bem dirigida e de tirar o fôlego, ainda que momentos depois, ele não resista ao susto barato, quando Max examina um caminhão abandonado e uma mão, seguida por uma cabeça, aparece repentinamente com um acorde alto da trilha sonora, provocando o susto forçado no espectador. Miller também não poupa o espectador ao mostrar o resultado deste novo e violento mundo, com pedaços de corpos mutilados, um estupro coletivo e muitas mortes, como na forte cena em que o garoto-fera (Emil Minty) mata com o bumerangue um dos integrantes da gangue. E ainda que valorize bastante a parte visual, Miller também cria planos simbólicos, como na cena após o terrível estupro, em que Max aparece para vingar o casal e o plano demonstra a grandeza do personagem ao torná-lo gigante na tela. Finalmente, o diretor volta a utilizar, assim como no primeiro filme, uma quantidade menor de frames para transmitir a sensação de velocidade, além de expor todo o excelente trabalho técnico de sua equipe através de planos distantes da Refinaria, inteligentemente apresentados como sendo a visão de Max.

Ainda sobre o esplêndido aspecto visual de “Mad Max 2”, devemos destacar que o visual árido do longa é resultado da fotografia sem vida de Dean Semler, que explora muito bem as locações em meio ao deserto, além de captar com precisão as sensacionais perseguições nas estradas. A empoeirada refinaria e os remendados automóveis e motocicletas atestam o ótimo trabalho de Direção de Arte de Graham Walker. Repare como cada detalhe é bem trabalhado nos cenários, como o ônibus que funciona como portão e toda a estrutura interna da refinaria. Também merecem destaque os interessantes figurinos de Norma Moriceau, com adereços extravagantes nos selvagens motoqueiros e a roupa preta de Max (que como afirmei na crítica de “Mad Max”, simboliza o estado de espírito do personagem), além das roupas brancas das pessoas dentro da refinaria, numa clara alusão ao conflito entre o bem e o mal representado no longa. Finalmente, o excelente trabalho de som é notável nas perseguições, com o nítido som dos carros, motos, caminhões e até mesmo do “helicóptero” cortando o céu, e a trilha sonora de Brian May, até mesmo pela falta de diálogos, marca presença em boa parte da narrativa e mantém um ritmo frenético que colabora com o clima de tensão.

Entre o elenco, o principal destaque vai mesmo para Mel Gibson, que tem atuação discreta, porém muito coerente com o personagem. Este não é o tipo de papel que exige muito do ator, mas Gibson é competente dentro da proposta do personagem. Afetado pelo trágico passado, Max é alguém que praticamente não fala, e o ator transmite muito bem a amargura do nômade, que claramente evita o contato com outras pessoas, como podemos notar quando se recusa a ficar na Refinaria. Solitário por natureza, percebemos até mesmo através de seu carro que Max é alguém completamente adaptado ao mundo em que vive. Seu Interceptor V8 é preparado contra invasores, com faca escondida próximo ao tanque e dispositivo anti-roubo de gasolina, prestes a explodir ao primeiro toque que não seja do próprio Max. Sua única companhia é um cachorro, já que este não fará perguntas e nem forçará Max a pronunciar uma única palavra que não queira. Ainda assim, o desespero daquelas pessoas para encontrar um salvador fez com que apostassem tudo em Max, que inicialmente recusou o rótulo. Obviamente, ele não ajudaria ninguém a não ser que tivesse alguma compensação e só decidiu levar o caminhão quando perdeu tudo que tinha, inclusive seu carro.Sem mais nada a perder e com sede de vingança (novamente, o tema recorrente da série), finalmente resolve dirigir o caminhão. E observe como na conversa em que Pappagallo fala a respeito da fuga, o plano da areia descendo pelo marcador de tempo indica o surpreendente desfecho da perseguição, já que a areia teria papel fundamental na fuga. Dentro do elenco, podemos citar ainda Bruce Spence, com uma atuação modesta na pele do capitão Gyro, responsável pelo mais engenhoso meio de transporte do longa (uma espécie de helicóptero para duas pessoas, feito com resto de material) e Michael Preston, que tem boa atuação como Pappagallo, o líder dos habitantes da refinaria, com destaque para o momento em que questiona a razão da amargura de Max (“Você não é nada!”).

Numa das poucas vezes em que abre a boca pra falar algo, Max demonstra sua coragem (“Se quiserem sair daqui, falem comigo”), facilmente compreendida se pensarmos que este homem não tem mais o que perder na vida. Na realidade, temos a constante sensação de que Max desafia a morte, como quando vai buscar o caminhão sabendo que na volta enfrentará sozinho os perigosos motoqueiros. Esta, aliás, é uma das melhores seqüências do longa, extremamente bem conduzida por George Miller, que confere um ritmo frenético à cena, graças também aos cortes rápidos que revelam o bom trabalho de montagem do trio Michael Balson, David Stiven e Tim Wellburn. Acompanhada pela agitada trilha sonora, a perseguição alterna entre planos aéreos, que dão uma visão panorâmica da perseguição, e planos fechados do rosto de Max, que transmitem sua tensão na angustiante corrida para chegar à refinaria, o que permite ao espectador compreender perfeitamente o que se passa na tela. Já a espetacular seqüência da perseguição final inicia com um impressionante travelling aéreo e, a partir daí, exibe um festival de imagens em alta velocidade, alternando planos diversos de dentro e de fora do caminhão com o uso da câmera lenta, permitindo ao espectador apreciar cada detalhe da frenética perseguição, como atropelamentos e manobras (entre elas, um sensacional giro em 180 graus do caminhão em alta velocidade). Tudo isto, pontuado por uma trilha empolgante e coroado com um final surpreendente, que revela a inteligente estratégia adotada pelos integrantes da refinaria para conseguir fugir com o precioso bem.

Pra finalizar, é importante dizer que “Mad Max 2” é um excelente filme de ação, com um ritmo muito forte e imagens marcantes, baseadas num roteiro simples, mas que diz muito mais através de imagens do que de palavras. Exibindo um futuro ainda mais sombrio que no primeiro filme da série, conta com um visual singular para despejar no espectador uma chuva de sensações, e com isso, fazer com que ele jamais saia indiferente ao que viu.

Texto publicado em 30 de Abril de 2010 por Roberto Siqueira

8 comentários sobre “MAD MAX 2 – A CAÇADA CONTINUA (1981)

  1. Alisson Giovani Netto 14 março, 2022 / 8:44 am

    faz 30 anos que assisto esse filme e ainda uma coisa que nunca entendi por completo, por que o tanque estava cheio de areia?

    Curtir

  2. Leonardo 27 abril, 2016 / 9:50 am

    Fico com o clássico de 1979. Nesse, não suportei a ideia de um Max Rockatansky quase mudo e um Black Interceptor V8 calhambeque. Os 12 minutos finais de perseguição ao caminhão tanque, salvaram o filme.

    Curtir

  3. king 2 outubro, 2011 / 12:48 pm

    O segundo filme, apesar de ser o menos comentado, é, definitivamente, o melhor.

    O primeiro é muito bom, mas às vezes torna-se um pouco confuso e maçante.

    O terceiro acho melhor do que o primeiro, mas fica bem atrás do segundo.

    Curtir

    • Roberto Siqueira 13 outubro, 2011 / 11:57 pm

      Olá King,
      Concordo que o segundo é o melhor filme, mas acho o terceiro o mais fraco da trilogia.
      Abraço.

      Curtir

  4. Tonho 18 outubro, 2010 / 11:25 pm

    Demais, demais, demais, demais de The Best, of The best, of the best, the best… (falo do filme, mas, qualquer comentário é bem vindo…salvo o que disse do susto ‘piegas’ do caminhão no início… na época não era piegas e suscitava homenagem ao Hitcook… a cena da trombada de Wez no mesmo caminhão ao final, mostrava a sua versão de ‘assustar’… sacou o lance do Miller?!?). Sudades da infância exploradora desse deslumbre. Fiquei marcado com o mundo de Rockantansky…

    Curtir

    • Roberto Siqueira 19 outubro, 2010 / 11:22 pm

      Olá Tonho.
      Seja bem vindo ao Cinema & Debate. Obrigado pela visita e pelo comentário. Só pra deixar registrado, o correto é Hitchcock, ok?
      Abraço e volte sempre.

      Curtir

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.