Todo homem morre, mas nem todo homem realmente vive

Roger Ebert dizia que “nenhum filme bom é longo demais e nenhum filme ruim é curto o suficiente”.

Desde que me tornei pai, sempre tive a expectativa de apresentar grandes clássicos do cinema aos meus filhos. Sempre fui apaixonado por cinema, sonhava desde criança em ter minha própria coleção de filmes, mas tudo isso ganhou uma nova dimensão quando meus filhos nasceram.

Pensando em retrospectiva, parte da minha motivação em seguir colecionando filmes mesmo quando a evolução da tecnologia já apontava para o risco dos DVDs e Blurays tornarem-se obsoletos era justamente oferecer a eles algo que eu nunca tive e sempre sonhei, a chance de acessar a qualquer momento que quiserem um acervo de grandes clássicos do cinema.

Além disso, no meu íntimo eu projetava e idealizava o momento que apresentaria muitos dos filmes que são especiais e marcantes em minha vida. Faço isso desde que são muito pequenos, apresentando-os de acordo com o crescimento deles e a evolução da maturidade para compreender certos temas. Algumas vezes, o filme apresentado é muito importante na história do cinema, em outras, é importante apenas para mim. De vez em quando, o escolhido da vez se encaixa nas duas situações.

Por tudo isso, o último fim de semana foi muito especial. Não apenas por que finalmente, após 4 anos vivendo em Portugal, consegui remontar minha coleção pessoal de filmes, que chamo desde sempre aqui no blog de Videoteca do Beto, mas também por que aproveitei o momento em que eles estão muito interessados em épicos medievais para apresentar o filme mais importante da minha vida.

Eu estava um pouco preocupado, confesso, por que a violência gráfica de “Coração Valente” era algo brutal na época em que foi lançado e me impactou profundamente, além é claro do peso dramático da narrativa. Para piorar, a geração dos meus filhos tem pouca paciência para “filmes longos”, o que sempre me faz evitar ao máximo dizer a duração dos filmes para eles. No entanto, a verdade é que os anos passaram e a evolução da linguagem cinematográfica e até mesmo de outras formas de entretenimento como os jogos de videogame fizeram com que aquela brutalidade hoje soe mais, digamos, normal.

Isso não impediu o Arthur e o Raul de curtirem demais o filme. Ambos gostaram muito, se empolgaram nas cenas de batalha, ficaram aflitos com as atrocidades cometidas pelo império inglês, se surpreenderam com as reviravoltas da narrativa e se emocionaram com o desfecho da história. Quanto à duração, os dois terminaram dizendo que nem perceberam as 3 horas passarem. Ebert, como sempre, tinha razão.

Obviamente, o impacto da trajetória de Wiilliam Wallace sobre eles não foi e nem deveria ser o mesmo que teve em mim há quase 30 anos atrás. O mais importante é que pude viver este momento sonhado por anos ao lado deles e curtir cada segundo.

Certamente meus pequenos irão encontrar o “Coração Valente” da vida deles, aquele filme que gerará um impacto muito além da própria experiência cinematográfica. Por enquanto, eles vão se divertindo com o cinema da forma mais pura, sendo envolvidos pela história que está sendo narrada, sem grandes preocupações com o futuro. E no dia em que eles encontrarem o filme mais importante da vida deles, poderão contar comigo para conversar e refletir a respeito.

Roger Ebert também dizia que “os filmes são janelas para o mundo. Eles nos permitem desvendar outras mentes – não simplesmente pela identificação com os personagens, embora isso seja uma parte muito importante, mas por nos oferecem a oportunidade de ver o mundo como outras pessoas o vêem”.

E está sendo uma delícia ver o mundo novamente junto dos meus pequenos.

Texto publicado em 10 de Março de 2023 por Roberto Siqueira

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