DE VOLTA PARA O FUTURO 3 (1990)

(Back To The Future Part III)

 

Videoteca do Beto #73

Dirigido por Robert Zemeckis.

Elenco: Michael J. Fox, Christopher Lloyd, Mary Steenburgen, Thomas F. Wilson, Lea Thompson, Elisabeth Shue, Matt Clark, James Tolkan, Hugh Gillin, Mark McClure, Wendie Jo Sperber, Jeffrey Weissman, Bill McKinney, Todd Cameron Brown, Flea e Richard Dysart.

Roteiro: Robert Zemeckis e Bob Gale.

Produção: Neil Canton e Bob Gale.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Fechando a magnífica trilogia dirigida por Robert Zemeckis, “De Volta para o Futuro 3” não decepciona, entregando tudo que a série tem de melhor em forma de homenagem a um gênero clássico do cinema norte-americano. O roteiro inteligente, as excelentes piadas, as ótimas atuações e o sentido de aventura aparecem com força total neste ótimo filme, que garante uma despedida digna para esta trilogia que marcou a geração dos anos oitenta.

Marty McFly (Michael J. Fox) decide voltar ao velho oeste para evitar a morte de Doc (Christopher Lloyd) quando ambos descobrem o túmulo dele após ler a carta escrita pelo cientista em 1885. Ao chegar ao velho oeste, Marty terá apenas cinco dias para evitar que Doc se apaixone por Clara Clayton (Mary Steenburgen) e morra nas mãos do temível bandido Tannen (Thomas F. Wilson).

Logo na introdução, De Volta para o Futuro 3” revela a principal característica da trilogia, ao apresentar um momento decisivo do filme anterior e imediatamente fazer a conexão com a narrativa que será desenvolvida pelo excepcional roteiro de Robert Zemeckis e Bob Gale. Além de constantemente fazer referências às características marcantes dos personagens, como a reação intempestiva de Marty ao ser chamado de covarde, o roteiro revela ainda diversas ações que refletiriam no futuro das famílias da cidade, como quando Doc e Clara conversam sobre a geografia da lua, o que inspiraria o nome do cachorro do doutor muitos anos depois. O roteiro está ainda repleto de alívios cômicos, como quando Doc diz “ainda bem que não fui parar na Idade Média”, pois lá ele seria queimado na fogueira ou na divertida piada sobre o que é produzido no Japão. Ainda podemos citar a piada sobre a origem do “frisbee”, a origem da ravina “Clayton” que se transforma em ravina “Eastwood” e o final de Tannen que remete aos filmes anteriores.

Escrito como uma homenagem ao western, “De Volta para o Futuro 3” apresenta todas as características mais marcantes do gênero desde a primeira cena no velho oeste, com o conflito entre homens brancos e índios. Temos, por exemplo, o saloon, com as prostitutas no primeiro andar e o tradicional uísque servido para os homens mal encarados no térreo, homens andando de cavalo, carroças, a ferrovia, um roubo de trem e, logicamente, o duelo entre o mocinho e o vilão. Zemeckis aproveita ainda para fazer diversas referências a filmes clássicos como “Taxi Driver” e “Impacto Fulminante” (quando Marty brinca com a arma na frente do espelho) e, principalmente, ao astro Clint Eastwood e ao western spaghetti (repare como o travelling que revela a cidade de Hill Valey remete ao mesmo movimento de câmera de Sergio Leone que revela a cidade de “Era uma Vez no Oeste”), além de também fazer referências à cultura pop, como a dança de Marty no salão claramente inspirada em Michael Jackson. O diretor mostra talento também na criação de momentos sutis e simbólicos, como no plano em que McFly brinca com seu bisavô, ainda bebê, enquanto Seamus McFly conversa com sua esposa. O futuro da família McFly dependia da sobrevivência daquela criança e Marty sabia disto, como fica evidente quando diz para Seamus “cuidar bem do bebê”. Quando Marty informa Doc que o Deloren estava sem combustível, o close no rosto do cientista expõe a gravidade da situação e, ao mesmo tempo, revela a imagem de Marty no espelho, agora bastante preocupado. E finalmente, Zemeckis conduz com perfeição a emocionante seqüência da volta ao futuro na ferrovia, alternando entre os planos que mostram Marty aflito dentro do Deloren, Doc tentando chegar ao carro e Clara tentando alcançar Doc, numa ótima cena que conta também com os efeitos especiais da Industrial Light & Magic, que, por exemplo, permitem que o vôo final de Doc pareça verossímil.

Zemeckis conta também com a montagem de Harry Keramidas e Arthur Schmidt para imprimir um ritmo acelerado, que sempre funciona bem em aventuras, além de fazer transições divertidas, como quando Doc diz que terá que explodir uma mina e em seguida vemos a explosão ou quando Doc diz para Marty que “aqueles índios nem estarão lá” e, na cena seguinte, vemos Marty gritando “Índios!”. Keramidas e Schmidt participam ainda de maneira decisiva na construção do clímax, ao balancear muito bem as cenas que antecedem o duelo, com a chegada de Tannen ao saloon, Marty acordando e partindo em busca de Doc, Doc divagando sobre o futuro no bar e Clara partindo no trem. O longa conta ainda com um ótimo trabalho de ambientação que nos joga pra dentro do clima do velho oeste, começando pela direção de fotografia de Dean Cundey, que emprega o tom sépia característico do western e, em conjunto com os planos gerais de Zemeckis, explora com competência as belas paisagens da região. A excelente direção de arte de Margie Stone McShirley e William James Teegarden e os figurinos de Joanna Johnston também ajudam a ambientar o espectador, através da estrutura de madeira dos imóveis da cidade, do tradicional saloon, dos chapéus e botas dos homens, dos vestidos impecáveis das mulheres e do próprio trem que percorre a ferrovia. Vale destacar a referencia ao personagem de Eastwood nos westerns através do figurino de Marty, especialmente na cena dentro do bar em que ele levanta o chapéu, momentos antes do duelo com Tannen. Além disso, a maquete que detalha o plano para voltar ao futuro é rica em detalhes e reforça a qualidade do cuidadoso trabalho de McShirley e Teegarden. E finalmente, observe a simetria de algumas construções da cidade com aquelas que vimos nos filmes anteriores, como o relógio em construção que mantém o exato formato que viria a ter no futuro. Aliás, é apropriado que o objeto que conecta os três filmes seja um relógio, já que a trilogia trata exatamente do tempo e de seus efeitos em nossas vidas. Vale destacar ainda o bom trabalho de som ao captar com precisão os cavalos galopando, os tiros, a máquina de Doc trabalhando e o trem em alta velocidade, e a empolgante trilha sonora de Alan Silvestri, que mantém as referências ao western e colabora com o clima de aventura.

Entre o elenco, Christopher Lloyd continua à vontade no papel do cientista “Doc”, com suas expressões exageradas que caracterizam muito bem a ansiedade constante do Dr. Emmett. A novidade é que neste filme seu personagem vive o drama central da trama, o que lhe garante mais espaço na narrativa, e encontra um amor, o que permite ao ator viver também momentos românticos e dramáticos – e Lloyd se sai bem nestes momentos também. Michael J. Fox novamente dá um show interpretando Marty com a leveza de sempre e de quebra vivendo Seamus, o patriarca da família McFly. A dupla, aliás, mantém a empatia dos filmes anteriores e se sai muito bem nas cenas em que atuam juntos, como quando Clara chega à oficina de Doc e ambos demonstram a ansiedade que sentem diante daquela presença. Doc, apaixonado, se mostra inquieto, enquanto Marty, preocupado com a provável descoberta do Deloren, também se mostra ansioso e procura esconder a miniatura do carro atrás das costas. E fechando os destaques, Thomas F. Wilson também repete o bom desempenho, agora como o cruel bandido Tannen, transmitindo através do olhar cerrado e da voz firme a confiança do personagem, que mandava e desmandava na cidade até a chegada de McFly.

Quando vemos o veículo que transportou nossos sonhos sendo completamente destruído, a sensação de tristeza é inevitável. O fim do Deloren simboliza também o fim da trilogia e, neste momento, a nostalgia toma conta do espectador. Nem mesmo o final alegre, com a feliz volta de Doc e Clara, evita esta sensação. Por outro lado, nos sentimos realizados por poder acompanhar três filmes com tamanha qualidade, que jamais caem na repetição batida de fórmulas, buscando se reinventar de diversas maneiras. Com muita criatividade e inspiração, Zemeckis e seu elenco nos deram um verdadeiro presente que, ao contrário do Deloren, jamais poderá ser destruído.

Texto publicado em 02 de Dezembro de 2010 por Roberto Siqueira

DE VOLTA PARA O FUTURO 2 (1989)

(Back To The Future Part II)

 

Videoteca do Beto #61

Dirigido por Robert Zemeckis.

Elenco: Michael J. Fox, Christopher Lloyd, Lea Thompson, Thomas F. Wilson, Elisabeth Shue, James Tolkan, Jeffrey Weissman, Charles Fleischer, Darlene Vogel, Jason Scott Lee, Elijah Wood, Flea e Billy Zane.

Roteiro: Robert Zemeckis e Bob Gale.

Produção: Neil Canton e Bob Gale.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Apoiando-se num roteiro incrivelmente engenhoso e criativo e contando com um elenco muito afiado, o diretor Robert Zemeckis brindou os espectadores com uma verdadeira obra-prima quando lançou nos cinemas, em 1985, o primeiro filme da trilogia “De Volta para o Futuro”. Felizmente, este segundo filme da série mantém a qualidade primorosa do primeiro filme e presenteia os cinéfilos com uma continuação que consegue explorar a mesma premissa de forma original e igualmente criativa, renovando a trilogia e evitando que soe como algo repetitivo.

Após conseguir corrigir o passado e alterar o futuro, o cientista Doc Brown (Christopher Lloyd) volta desesperado ao ano de 1985 para levar Marty (Michael J. Fox) e sua namorada (Elisabeth Shue) para o ano de 2015, com o objetivo de evitar uma verdadeira tragédia familiar provocada pelos filhos do casal. Já no futuro, o velho Biff (Thomas F. Wilson) consegue entrar na máquina do tempo e voltar ao ano de 1955, somente para entregar a si mesmo o almanaque dos esportes, com todos os resultados esportivos do período entre 1950 e 2000. Por isso, quando Doc e Marty retornam ao ano de 1985, encontram um mundo completamente diferente, resultado do poder adquirido pelo milionário Biff ao longo dos anos. Desta forma, a única maneira de destruir esta realidade paralela e evitar este futuro sombrio é voltar ao ano de 1955 e impedir que o velho Biff entregue a si mesmo o tal almanaque.

Logo no inicio de “De Volta para o Futuro 2” podemos rever a cena que encerrou o primeiro filme, num dos inúmeros momentos em que o espectador poderá rever uma cena sob outra perspectiva, pois o longa é repleto de rimas narrativas entre os dois filmes (e até mesmo com o terceiro filme), o que é extremamente elegante. Ao chegarmos ao ano de 2015, até podemos questionar o avanço tecnológico apresentado num período tão curto de tempo (de 1989 para 2015 temos apenas 26 anos), mas é inegável que o longa aproveita mais uma vez as inúmeras oportunidades que a situação oferece, como podemos notar na inteligente justificativa para o não envelhecimento do professor, que explica sobre as avançadas clínicas de rejuvenescimento. Inteligente também é a forma como os dois Martys se cruzam embaixo do balcão, o que possibilita a troca entre eles e abre espaço para revivermos a grande cena, agora completamente renovada, em que Marty foge de Biff em cima de um skate. O bom humor também está novamente presente, como notamos quando Doc diz que a justiça ficou muito rápida depois que aboliram os advogados.

O longa de Robert Zemeckis também mantém o excelente nível técnico do filme anterior, com destaque especial para a bela direção de arte de Margie Stone McShirley, que recria a cidade de diferentes formas em cada período, sempre com muita criatividade, como fica evidente na evoluída cidade de 2015 através dos carros, do posto Texaco e da engraçada referência à Tubarão 19 (!) – sucesso de Spielberg, que é amigo de Zemeckis e também produtor executivo do longa. A fotografia colorida em 2015 de Dean Cundey e Jack Priestley dá lugar às tonalidades escuras do ambiente hostil e sombrio nos anos dominados por Biff e volta aos tons pastéis nostálgicos nos anos cinqüenta. Já a montagem ágil de Harry Keramidas e Arthur Schmidt reforça o clima de urgência da missão da dupla, que neste segundo filme é ainda maior que no primeiro, além de colaborar sensivelmente nas seqüências de ação, também mais freqüentes neste segundo longa. Também merece destaque a maquiagem, que permite com que o mesmo ator apareça duas ou três vezes na mesma cena de formas completamente diferentes, além, é claro, dos ótimos efeitos especiais, que trazem grande realismo às cenas. Finalmente, a bela trilha sonora de Alan Silvestri está novamente presente, com músicas joviais e com o imponente tema da série.

A direção de Robert Zemeckis é impecável, mantendo o ritmo ágil e criando um visual magnífico em todas as épocas da narrativa, além de criar seqüências muito interessantes sempre que um personagem encontra seu correspondente em cena, como nos encontros entre os dois “Docs”, “Biffs”, “Jennifers” e “Martys”. Zemeckis também acerta a mão na condução das cenas de ação, como a sensacional perseguição de Biff, com o carro, à Marty, que foge no skate, já próximo do final do filme. Finalmente, o diretor consegue sucesso mais uma vez na direção de atores, permitindo que o elenco apresente outro excelente desempenho. Michael J. Fox está novamente perfeito como Marty McFly. Devido a um acidente com seu carro que o impediu de continuar com a música, Marty se tornou um infeliz funcionário em seu trabalho, enquanto seu filho se tornou um verdadeiro idiota, como ele mesmo admite quando o vê. E o ator aproveita a excelente oportunidade de mostrar talento ao interpretar as diversas etapas da vida do personagem com competência, além de interpretar também seus próprios filhos. Thomas F. Wilson vai muito bem quando interpreta o cruel Biff, sempre ameaçador. Repare como o ator utiliza uma voz rouca que colabora com este poder de intimidação do personagem. E mesmo quando interpreta o velho Biff o ator convence, mostrando que a vida dura que levou após as mudanças no passado não tirou o seu apetite pelo poder. Já quando interpreta o jovem Griff, Wilson exagera e acaba soando caricato, mas nada que comprometa sua atuação. Quem também repete a excelente atuação do primeiro longa é Christopher Lloyd, com todos os trejeitos do maluco doutor Emmett. Seu “Doc” é um personagem extremamente carismático e o ator tem todo o mérito por isso. E finalmente, Elisabeth Shue pouco aparece com sua Jennifer, não permitindo uma atuação além de discreta.

Mas apesar de toda qualidade do elenco e do ótimo trabalho técnico, novamente o grande destaque do longa é o roteiro de Zemeckis e Bob Gale. Ainda mais intrincado que no primeiro filme, o roteiro permite uma viagem através do tempo e faz constantes referências ao primeiro e (melhor ainda) ao terceiro filme, provando a qualidade da engenhosa criação da trilogia por parte dos roteiristas. Não é raro notar menções ao velho oeste, como quando vemos um vídeo sobre o tio de Biff ou quando “Doc” diz que se arrepende de não ter visitado o velho oeste, o que já prepara o terreno para a parte final da trilogia. Zemeckis e Gale também aproveitam praticamente todas as oportunidades que a situação oferece para explorar ao máximo estas idas e vindas no tempo, como quando McFly comemora o fato de morar em determinado bairro que, na realidade, se tornou o mais perigoso da cidade devido às mudanças do passado, como fica evidente nas palavras de um taxista. O roteiro abusa ainda das elegantes rimas narrativas com o primeiro filme, como quando McFly sai com o skate pelas ruas da cidade sendo perseguido por Biff. Mais interessantes ainda são os momentos marcantes do primeiro longa que podemos reviver sob outra perspectiva, como quando Marty toca guitarra enquanto podemos ver o outro Marty andando por cima da estrutura do palco ao fundo.

Por tudo isto, “De Volta para o Futuro 2” pode ser considerado um filme tão qualificado quanto o primeiro da trilogia. Além disso, o longa tem ainda o mérito de preparar o espectador para a parte final da série, como podemos notar quando a Western Union entrega a carta de Doc para Marty com data de 1885. Isto acontece porque em outro momento muito importante, porém sutil, o acidente com o Deloren zera a máquina do tempo e altera a data para 1885, o que também reflete no terceiro filme da série. Desta forma, além de se deliciar com este segundo filme, o espectador praticamente se sente obrigado a assistir o terceiro, o que não deixa de ser inteligente.

Belíssima aventura que nos permite viajar através do tempo, passando pelos anos de 2015, 1985, 1955 e finalizando em 1855, “De Volta para o Futuro 2” é extremamente criativo e cativante, permitindo ao espectador notar claramente as diferenças entre cada época, tanto no aspecto cultural quanto no aspecto visual, além de proporcionar um delicioso exercício de imaginação por parte de cada espectador. É maravilhoso viajar com Marty e Doc através do tempo e por isso, mal podemos esperar pelo terceiro filme da série. Ainda bem que hoje em dia, com a trilogia disponível em DVD, não precisamos de um Deloren para avançar no tempo, como os espectadores certamente desejaram fazer quando o segundo filme foi lançado nos cinemas.

Texto publicado em 11 de Agosto de 2010 por Roberto Siqueira