REQUIEM PARA UM SONHO (2000)

(Requiem for a Dream) 

 

Filmes Comentados #12

Dirigido por Darren Aronofsky.

Elenco: Ellen Burstyn, Jared Leto, Jennifer Connelly, Marlon Wayans, Chrisopher McDonald, Louise Lasser, Keith David e Sean Gullette. 

Roteiro: Darren Aronofsky, baseado em livro de Hubert Selby Jr.. 

Produção: Eric Watson e Palmer West.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de esclarecer que os filmes comentados não são críticas. Tratam-se apenas de impressões que tive sobre o filme, que divulgo por falta de tempo para escrever uma crítica completa e estruturada de todos os filmes que assisto. Gostaria de pedir que só leia estes comentários se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama]. 

– Requiem significa “repouso” em latim. Uma das famosas composições de Mozart é o Requiem, que a Igreja Católica utiliza em cerimônias fúnebres. Portanto, o “repouso” em questão tem um sentido de morte mesmo. Sendo assim, Requiem para um Sonho pode ser interpretado como o repouso eterno (ou morte) dos sonhos dos quatro personagens que o longa nos apresenta.

– Grande libelo anti-drogas, “Requiem para um Sonho” consegue passar uma mensagem sensível de forma direta e atordoante. O mundo do vício é abordado sem maquiagens, de forma crua e real, chocando o espectador e alcançando um resultado espetacular.

– A montagem de Jay Rabinowitz é simplesmente sensacional. Desde o inicio, com a tela dividida mostrando simultaneamente as ações de Harry (Jared Leto) e Sara (Ellen Burstyn), passando pelo pequeno clipe que simboliza o uso de drogas, notamos a qualidade do trabalho, que dita um ótimo ritmo ao filme. Podemos citar também o café da manhã de Sara, quando a laranja, o café e o ovo somem rapidamente, mostrando a agonia que ela sentia comendo somente aquilo, enquanto o relógio mostra a lenta passagem do tempo. A refeição parecia durar alguns segundos, enquanto que no restante do dia o tempo passava lentamente.

– A trilha sonora de Clint Mansell é linda. Reflete bem a agonia daquelas vidas presas a tantos vícios.

– Repare como o estilo do pequeno clipe que passa toda vez que alguém usa uma droga também é utilizado toda vez que Sara liga ou desliga a TV. A analogia é lógica: a TV também é um vicio, assim como as drogas. Harry chega até mesmo a dizer para Marion (Jennifer Connelly) que a mãe é viciada em televisão. E não são somente estes dois vícios que o filme aborda com competência. Temos também o vício em pírulas para emagrecer, os viciados em dinheiro, viciados em sexo e até mesmo um viciado em mulheres.

– Ellen Burstyn tem uma atuação fantástica, com destaque para a cena em que ela chega à emissora de televisão e é retirada pela polícia para ser levada ao hospital. Sua transformação de mulher tranqüila para completamente viciada em remédios para emagrecer é sensacional.

– Jennifer Connelly também tem uma atuação excepcional, retratando bem até que ponto o ser humano pode chegar quando está viciado. Moça de bom coração, porém seriamente afetada pelo vicio, ela vai até o fundo do poço, chegando inclusive a participar de festas com sexo bizarro para conseguir droga. Observe sua reação ao elogio de Harry quando está deitada com ele. Ela o ama de verdade, mas o vicio destruiu sua vida.

– Marlon Wayans e Jared Leto estão muito bem como os dois jovens sonhadores e viciados. A química da dupla é ótima, e os dois atores conseguem grandes desempenhos nos momentos mais dramáticos, como a prisão de Tyrone (Wayans) e o desespero de Harry ao sentir saudades de Marion. Além disso, estão praticamente perfeitos quando drogados (Connelly não fica atrás), mostrando a euforia e o desespero que o vício provoca.

– Harry é um bom filho, como podemos notar quando dá a televisão para a mãe e diz que vai visitá-la. Porém, infelizmente, o vício o transformou em um jovem problemático, que abandona a mãe e a faz sofrer. A família desestruturada sente muito a falta do pai, como fica evidente no contundente diálogo entre Sara e Harry (“Eu vivo só!”). Sara buscou na televisão uma válvula de escape para a solidão e a tristeza. Harry buscou nas drogas. E embora possamos entender, não podemos aceitar nenhuma das duas alternativas encontradas.

– A direção de Darren Aronofsky é muito dinâmica e cheia de planos criativos. A narrativa segue um ritmo ágil e Aronofsky é competente ao manter este ritmo com perfeição. Um exemplo de movimento de câmera interessante é quando Harry escuta o ranger dos dentes de sua mãe e a câmera lentamente gira em torno de sua cabeça até ficar de frente para ela, com o som mostrando o que lhe incomodava. Em outro momento, auxiliado pela excelente montagem, ele mostra Harry olhando para a janela e vendo Marion à beira da água. A imagem então transita para Harry andando em direção dela, e quando ela some, podemos ver que ele estava na casa, imaginando tudo aquilo. Outro momento de destaque é o video com imagens aceleradas que simboliza a agitação e ansiedade de Sara, além de alguns momentos em que a câmera fica presa aos atores, captando de perto suas reações, como quando Tyrone foge dos traficantes e quando Marion sai do apartamento de Arnold (Sean Gullette).

– O médico sequer olha no rosto de Sara para receitá-la. O tratamento impessoal mostra que ele não se importava se ela estava ou não com problemas, se limitando apenas a dar os remédios, sem se preocupar com as possíveis conseqüências do mau uso deles.

– A completa degradação do ser humano é retratada nas seqüências finais, quando todos eles chegam ao fundo do poço, completamente decadentes e afundados em problemas por causa de seus vícios. A fotografia de Matthew Libatique propositalmente utiliza cores frias, sem vida, refletindo a tristeza daquelas vidas vazias.

– A posição final de cada um deles, deitados na cama como bebês, mostra como o viciado pode ser visto como uma criança que não entende os limites do que pode e do que não pode fazer. Porém, sendo adultos, as conseqüências de seus desejos proibidos são infinitamente mais dolorosas e prejudiciais.

– “Requiem para um sonho” deveria ser exibido para os jovens, como forma de alertar sobre os perigos deste mundo das drogas. Não que eu acredite que esta seria a solução para o problema. Longe disso. Mas se de alguma forma o filme colaborar para que pelo menos um jovem não entre neste caminho, já será algo importante e que deve ser celebrado. 

 

Texto publicado em 06 de Dezembro de 2009 por Roberto Siqueira

8 comentários sobre “REQUIEM PARA UM SONHO (2000)

  1. natielly 13 maio, 2012 / 4:42 pm

    Filme maravilhoso, com uma equipe maravilhosa, chorei muito e por mais que você já saiba ou faça ideia de como seja a vida de pessoas viciadas, acaba ficando chocado ao descobrir que pode ser pior.

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    • Roberto Siqueira 24 maio, 2012 / 11:02 pm

      É verdade Natielly. Obrigado pelo comentário.
      Abraço.

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  2. Bárbara 31 julho, 2010 / 12:37 pm

    Adoro esse filme e gostei muito da sua crítica… vc cita algo que dificilmente as pessoas percebem qndo assistem, o ritmo…
    Acho muito inteligente o ritmo adotado nas cenas… no momento em que a atriz Ellen Burstyn atinge o culme do vício e passa a ter alucinações. Esta cena, a da geladeira, é uma das que mais gosto… aliás, a sensibilidade do filme tbm é algo muito marcante… a tristeza e solidão, a busca desesperada por algo capaz de preencher esse vazio… tudo expresso de forma singela e impactante, olhares, gestos, risos exagerados e toda a parte tecnica, a qual não possuo competência alguma para comentar e que vc falou mto beeem…

    Mto bom esse blog… acompanho já há algum tempo e hj senti vontade de comentar…
    Abs.

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    • Roberto Siqueira 31 julho, 2010 / 9:22 pm

      Olá Bárbara.
      Em primeiro lugar quero agradecer pelos elogios ao Cinema & Debate. Fico feliz que mais uma leitora do blog tenha “se revelado” ;).
      Realmente o filme mostra com competência e sensibilidade as causas e consequências dos diversos tipos de vício que o ser humano pode ter.
      Um abraço, obrigado pelo seu primeiro comentário e volte sempre.

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  3. suzana 25 maio, 2010 / 5:54 pm

    ótima reflexão.. muito boa mesmo!

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    • Roberto Siqueira 25 maio, 2010 / 7:02 pm

      Obrigado Suzana.
      Seja bem vinda ao Cinema & Debate e volte sempre.

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  4. Pablo Marchesini 19 maio, 2010 / 5:16 pm

    olá caro Siqueira,

    li o seu artigo e fiquei muito impressionado! achei muito bem pensado, principalmente das partes tecnicas do filme!
    parabens

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    • Roberto Siqueira 19 maio, 2010 / 9:50 pm

      Obrigado pelos elogios Pablo.
      Seja bem vindo ao Cinema & Debate e volte sempre.
      Abraço.

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