O FEITIÇO DE ÁQUILA (1985)

(Ladyhawke)

 

Videoteca do Beto #35

Dirigido por Richard Donner.

Elenco: Matthew Broderick, Rutger Hauer, Michelle Pfeiffer, Leo McKern, John Wood, Alfred Molina, Giancarlo Prete, Loris Loddi, Alessandro Serra, Nicolina Papetti, Charles Borromel e Ken Hutchinson.

Roteiro: Edward Khmara, Michael Thomas, Tom Makiewicz e David Webb Peoples, baseado em estória de Edward Khmara.

Produção: Richard Donner e Lauren Shuler Donner.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

O tema universal do amor impossível é o fio condutor deste simpático “O Feitiço de Áquila”, aventura medieval interessante e consideravelmente criativa dirigida pelo subestimado Richard Donner. Sua premissa inteligente já seria suficiente para garantir doses respeitáveis de drama e romantismo, mas este pequeno conto medieval vai além, apresentando uma estória encantadora, com boas atuações e uma direção competente. Por isso, mesmo apresentando pequenos defeitos, consegue envolver o espectador de maneira bastante agradável.

No século XII, a pequena cidade européia de Áquila é o palco para uma incrível história de amor. Ao perceber que sua amada Isabeau (Michelle Pfeiffer) está apaixonada pelo líder de sua guarda – o cavaleiro Navarre (Rutger Hauer) – o Bispo de Áquila (John Wood), enlouquecido de ciúme, lança uma terrível maldição sobre o casal. Durante o dia ela se transforma em um falcão e durante a noite ele se transforma em um lobo, impedindo assim que o casal consiga viver o seu amor. Mas a fuga de Phillipe Gaston (Matthew Broderick) da prisão da cidade e a inesperada ajuda do Padre Imperius (Leo McKern) será a luz de esperança que o casal precisava para finalmente poder ser feliz.

A premissa de “O Feitiço de Áquila” é muito interessante e inegavelmente criativa. O casal Navarre e Isabeau funciona como uma metáfora para o sol e a lua, que assim como os dois pombinhos (ou seria falcão e lobo?), nunca se encontram. Desta forma, o sempre atraente tema do amor impossível toma formas ainda mais dramáticas, impossibilitando até mesmo o contato físico entre os dois amantes. Os animais em que ambos se transformam também foram cuidadosamente escolhidos, já que o falcão é um conhecido símbolo de beleza, enquanto o lobo é um animal normalmente solitário – além do fato de ambos serem monogâmicos, como o próprio Navarre diz em certo momento. Até mesmo o uivo triste do lobo se encaixa perfeitamente ao lamento eterno de Navarre, o que se revela outra interessante sacada do inteligente roteiro de Edward Khmara, Michael Thomas, Tom Makiewicz e David Webb Peoples, baseado em estória de Edward Khmara.

Com um bom roteiro nas mãos, Richard Donner consegue imprimir um ritmo ágil à narrativa, mantendo a atenção do espectador constantemente, sem por isso deixar de criar uma crescente expectativa para o esperado reencontro do casal. Dentro da proposta do filme faz um excelente trabalho, deixando a narrativa se desenvolver de forma leve e divertida. Infelizmente, os vilões (no caso, a guarda do Bispo) não conseguem representar uma série ameaça, soando patéticos sempre que tentam atacar Phillipe e Navarre, o que impede que tenhamos a sensação de que a missão do casal corra realmente algum perigo. Além disso, as cenas de luta são pouco verossímeis, dando a sensação de que Phillipe e Navarre são super-heróis. E quando finalmente acontece o grande momento do reencontro do casal, por mais que seja uma bela cena, não consegue atender à expectativa criada devido à falta de emoção dos atores. Felizmente, o foco principal da narrativa se mantém na impossibilidade do casal se encontrar e o sofrimento que isto representa, e neste aspecto, Donner consegue sucesso absoluto.

Outro fator que conquista a simpatia do espectador é a presença do engraçado Phillipe Gaston, mais conhecido como “o rato”. Matthew Broderick surpreende com uma excelente atuação desde o primeiro momento em que surge no meio da lama, fugindo da prisão de Áquila. Alegre, com ótimo timing cômico e bastante solto, ele é o elo entre o espectador e o casal, sendo responsável também pelas melhores piadas do filme, como a brincadeira que faz com o cavalo “Golias” ao dizer que precisa lhe contar a história de Davi. Rutger Hauer consegue transmitir a angústia de Navarre na maior parte do tempo, além de mostrar a frieza esperada de um homem amargurado como ele. Firme no papel do “mocinho que salvará a princesa”, consegue sucesso nas cenas de combate, mas falha no momento mais importante dramaticamente, que é o reencontro com Isabeau. Mesmo assim, consegue fazer com que o espectador torça pelo sucesso de sua jornada e se identifique com o drama do casal. Merece grande destaque a excelente atuação de Leo McKern como o arrependido Padre Imperius. Observe como ele transmite toda a amargura do personagem, na bela cena em que conta a triste história da origem do feitiço para Phillipe. Notável também é a imponente figura do Bispo, interpretado de forma cruel por John Wood, e que representa o poder da Igreja católica naquele período. Vale observar como Donner constantemente filma o bispo por baixo, de forma que ele sempre pareça grande na tela, simbolizando seu poder. Finalmente, chegamos à personagem que dá nome ao filme (no original, em inglês). Michelle Pfeiffer, com sua beleza estonteante, cai muito bem no papel da donzela que embala os sonhos de Navarre (e até mesmo de Phillipe, como ele mesmo confessa). Carismática, consegue transmitir emoção durante os angustiantes segundos em que vê o amado como humano, e seu triste semblante ao se transformar em falcão novamente é tocante. Suas aparições noturnas, normalmente envolta em sombras, acentuam ainda mais o brilho de seu olhar e de sua beleza. Por outro lado, ainda que demonstre mais emoção que Hauer, Pfeiffer também falha no momento alto do romance, quando os dois finalmente se reencontram. Felizmente, sua alegria espontânea no último plano do filme recupera parte de seu prestígio e esta pequena escorregada não impede que o espectador se satisfaça com o final feliz do casal.

“O Feitiço de Áquila” conta também com um bom trabalho técnico, especialmente pela citada agilidade da narrativa, que é mérito também da boa montagem de Stuart Baird. Os figurinos de Nanà Cecchi e a bela direção de arte de Ken Court e Giovanni Nataluci conferem realismo à cidade medieval, repleta de montanhas nevadas, masmorras, castelos e catedrais belíssimas, enquanto a direção de fotografia de Vittorio Storaro explora muito bem as lindas paisagens da região. Além disso, Storaro capta com precisão os lindos momentos em que o sol surge e desaparece no horizonte, que também tem importante função narrativa, destacando o marcante contraste entre a noite e o dia. A trilha sonora acelerada e moderna de Andrew Powell não é coerente com a época retratada, se redimindo na linda cena do vôo do falcão sobre o rio, com um tom melancólico e belo. Os efeitos especiais não conseguem alcançar o realismo necessário nas transformações do casal, apelando para truques de montagem, mas nem por isso comprometem o resultado final. De certa forma, exige algo a mais da imaginação do espectador, o que é sempre bom.

Mesmo com os problemas citados, “O Feitiço de Áquila” consegue manter seu encanto. O duelo de cavaleiros dentro da Igreja funciona enquanto os cavalos estão em cena. Quando a luta passa a ser corpo a corpo, a falta de realismo demonstrada em todo o filme volta a aparecer, com escapadas exageradas de Navarre. Curioso notar também como todos na igreja ficam simplesmente olhando, como se fosse um espetáculo e não uma briga que colocaria em risco a vida do bispo, que até então não apresentava motivos para ser odiado por aquelas pessoas. De todo modo, o duelo final tem emoção e se estabelece como um grande momento do longa. Nada comparado, porém, a mais bela cena do filme, que acontece no breve encontro entre Navarre e Isabeau durante a transição da noite para o dia. Enquanto o sol lentamente espalha seus raios pela superfície, podemos testemunhar em câmera lenta os breves segundos em que os amantes podem se ver ainda como humanos, antes que Isabeau se transforme em falcão novamente. A montagem joga imagens na tela que simbolizam sua transformação, enquanto a câmera lenta tem a importante função de prolongar este prazeroso momento para o espectador, por mais que em tempo real ele dure apenas alguns segundos. Um grande momento, capaz de emocionar ao mais frio dos espectadores.

A terrível maldição que assola o casal é repleta de simbolismo e é um prato cheio para provocar lágrimas nos casais apaixonados. “Sempre juntos, eternamente separados” é a frase dita por Phillipe Gaston, que representa muito bem o drama vivido pelo casal. O previsível final feliz neste caso é muito bem-vindo e agrada em cheio ao espectador, que testemunha durante quase todo o tempo o sofrimento quase palpável de Navarre e Isabeau, aliviado apenas pela simpatia do divertido Gaston. Mesmo com pequenos problemas, “O Feitiço de Áquila” é simpático o suficiente para atrair a atenção do espectador e a linda história de amor que o embala é inegavelmente envolvente.

Texto publicado em 12 de Janeiro de 2010 por Roberto Siqueira

BLADE RUNNER – O CAÇADOR DE ANDRÓIDES (1982)

(Blade Runner)

 

Videoteca do Beto #25

Dirigido por Ridley Scott.

Elenco: Harrison Ford, Rutger Hauer, Sean Young, Edward James Olmos, Daryl Hannah, William Sanderson, Brion James, Joe Turkell, Joanna Cassidy, James Hong e Morgan Paull.

Roteiro: Hampton Francher e David Webb Peoples, baseado em livro de Philip K. Dirk.

Produção: Michael Deeley.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido o filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

De acordo com “Blade Runner – O Caçador de Andróides”, belíssima ficção-científica dirigida por Ridley Scott, o futuro do planeta é sombrio e assustador. O crescimento descontrolado das grandes metrópoles, aliado à globalização e a destruição do meio ambiente, provocou profundas alterações climáticas e sociais, transformando o planeta em um local frio, deteriorado e muito complicado de se viver. Este sombrio ambiente serve como pano de fundo para uma trama que levanta questões muito profundas a respeito da existência humana, gerando discussões filosóficas e provocando até mesmo estudos baseados no longa. Além disso, o filme desenvolve personagens complexos e fascinantes. E todos eles buscam respostas que não serão encontradas facilmente.

O ano é 2019. Uma grande corporação desenvolveu um robô, conhecido como replicante, que é idêntico ao ser humano em sua aparência e inteligência, porém mais forte e ágil. Utilizados como escravos na exploração de outros planetas, um grupo destes replicantes se rebela. O problema é que o motim provoca a reação imediata das autoridades terrestres, que proíbem a presença de replicantes no planeta, sob pena de morte. É quando seis replicantes chegam a Terra após render uma tripulação e o ex-caçador de andróides Deckard (Harrison Ford) é chamado para matá-los, numa operação que não é conhecida como execução, e sim remoção.

Como de costume nos filmes dirigidos por Scott, o visual deslumbrante do mundo futurista decadente se destaca logo no inicio do longa, graças ao excelente trabalho de direção de arte de David L. Snyder. Tudo é fascinante. Os carros sujos, a cidade poluída repleta de prédios enormes que se espremem em pequenos espaços, o contraste entre os luxuosos apartamentos dos ricos no alto dos prédios e a podridão da ralé que vive no nível do chão, o resultado da globalização, com uma verdadeira torre de babel circulando neste submundo repleto de pessoas de diversas nacionalidades, o clima quase sempre chuvoso, nublado e sombrio, resultado das mudanças climáticas provocadas pelo crescimento exacerbado do capitalismo, carros voadores, um festival de luzes e muito neon piscando com propagandas em toda parte. Tudo está lá, diante de nossos olhos, com um realismo incrível. A fotografia azulada e escura (direção de Jordan Cronenweth), que remete aos filmes noir, esconde os personagens nas sombras e ao mesmo tempo cria um forte contraste com os raios de luz (ou luzes piscando freneticamente) que entram nos ambientes, criando um visual sombrio e triste, refletindo a vida destas pessoas neste mundo frio e cruel. Claramente, este é o resultado de anos e anos de crescimento sem controle, sem preocupação ambiental e sem sustentabilidade, que provocou a degradação total do planeta e das relações humanas. A trilha sonora eletrônica de Vangelis completa a parte técnica casando perfeitamente como o ambiente do filme (e soando bastante ousada para a época). Os carros voadores dos policiais raramente arriscam entrar no violento submundo, onde as pessoas vivem precariamente. O perigo que os replicantes (andróides) representam é bem resumido na frase de um policial “Ele está respirando bem agora, desde que não desliguem os aparelhos”, se referindo ao último caçador de andróides que fez o teste com um deles. O teste, apresentado logo no inicio do filme, se resume a uma série de perguntas feitas de forma a identificar um replicante, já que fisicamente eles são idênticos ao seres humanos. Mentalmente, porém, são diferentes, já que não têm passado, e através das perguntas (e da dilatação dos olhos quando as escutam), os caçadores conseguem identificá-los. Aliás, a criatividade da tecnologia empregada em “Blade Runner” também é fascinante, como podemos notar, por exemplo, na máquina que Deckard utiliza para analisar uma fotografia.

Ridley Scott acerta a mão também no ritmo da narrativa. Lento e reflexivo, “Blade Runner” não é um simples filme de perseguição. É muito mais que isso. É claro que existem boas seqüências de ação. Auxiliado pela boa montagem de Marsha Nakashima, o diretor cria uma seqüência empolgante durante a perseguição de Zhora, por exemplo. Os cortes ágeis e precisos aumentam a adrenalina da cena sem torná-la confusa. Por outro lado, quando Deckard finalmente alcança Zhora e atira, ele utiliza a câmera lenta, mostrando em detalhes o impacto daquele ataque e a reação angustiada de Deckard, que sente pelo que fez, mas cumpre o seu dever. A trilha sonora triste marca o momento. A empolgante seqüência final entre Roy e Deckard também é sensacional, repleta de tensão e realismo. Mas o principal acerto de Scott, que conta com o criativo e excepcional roteiro de Hampton Francher e David Webb Peoples (baseado em livro de Philip K. Dirk), é a ambigüidade de cada um dos personagens e as inúmeras reflexões que provocam no espectador.

Todos os personagens em “Blade Runner” estão em busca de algo. Harrison Ford encabeça o elenco, encarnando muito bem o caçador de andróides Deckard que busca exterminar os replicantes da Terra, ao mesmo tempo em que busca também sua própria identidade. Ford acerta ao balancear a frieza e determinação com que Deckard parte para cumprir sua missão com a emoção contida, porém sensível, que sente quando está com a aflita Rachel, interpretada com competência por Sean Young. As dúvidas sobre sua própria origem e a angustia após descobrir a verdade são muito bem retratadas pela atriz. Quando Rachel demonstra ter sentimentos por Deckard, o espectador provavelmente se pergunta “E agora?”, já que ele descobre gostar dela praticamente ao mesmo tempo em que é avisado que precisa matá-la. “Eu sou o trabalho” diz ela, ciente da missão do parceiro. Deckard, por sua vez, sabe o que precisa fazer, mas não terá coragem para isso. Rutger Hauer está sensacional como o frio e assustador Roy, que busca desesperadamente encontrar uma forma de prolongar sua existência, já programada anteriormente para durar apenas quatro anos. Por outro lado, o ambíguo personagem demonstra “humanidade” no terceiro ato, quando salva Deckard e mostra seus sentimentos mais puros e sinceros, além de levantar questões profundas sobre a existência de cada ser no universo. Seu lado emocional fica ainda mais evidente quando sua amada Pris (Daryl Hannah) é assassinada por Deckard, provocando seu emotivo beijo de despedida. A tensa seqüência em que Roy mata Tyrell (Joe Turkell) é de um simbolismo tremendo. A perversidade da inteligência humana é colocada em cheque. Até mesmo a coruja é criada artificialmente na casa dos Tyrell. Insatisfeita com sua existência sem sentido, a criatura mata o criador. Afinal de contas, que sentido tem uma vida programada apenas para ser escravizada e com tão pouco tempo de existência? Em seguida, Roy aparece iluminado em um plano poderoso que reflete sua satisfação.

Quando descobrimos que as memórias de Rachel (brincadeira de médico, as aranhas) são implantadas, as reflexões que o filme sugere se tornam mais evidentes. As memórias dela, na realidade, são da sobrinha de Tyrell, o gênio que criou os replicantes. Tyrell limitou a existência destes seres em apenas quatro anos ao prever que poderiam desenvolver sentimentos próprios e o choro de Rachel ao descobrir toda a verdade comprova esta teoria. E é curioso pensar o que aquele ser, humano ou não, estaria sentindo naquele momento, nos levando a questionar até que ponto é justo o ser humano criar outro ser desta forma. Deckard, ao descobrir que seria incapaz de eliminar Rachel, decide fugir com ela, mesmo sabendo que a moça não sobreviveria por muito tempo. “É uma pena que ela não viverá, mas quem vive”, é a frase final de Gaff (Edward James Olmos), que remete a discussão central do filme, sobre a natureza finita de nossa existência.

Então chegamos ao dilema de “Blade Runner”, enriquecido pela bela discussão filosófica que o longa propõe. Seria Deckard é um replicante? Durante toda a narrativa são espalhadas dicas sobre a origem dele, mas de uma forma tão sutil que provavelmente a maioria dos espectadores não consegue notar. Primeiro, o texto que abre o longa diz que seis replicantes estão soltos na terra (três homens e três mulheres). Os quatro primeiros são logo identificados, mas o quinto só é revelado quando descobrimos que Rachel é uma replicante. Acontece que ela não sabe disso, pois foi utilizada como cobaia em experimentos de implante de memória e pensa ter tido uma infância. Sendo assim, não podemos descartar a hipótese de que Deckard também tenha memórias implantadas em sua mente. Além disso, quem garante que o sexto replicante realmente teria sido queimado quando invadiu a empresa Tyrell? É provável que seja apenas uma estória inventada pela policia para não levantar suspeita sobre a origem replicante de Deckard. Não podemos negar que é extremamente inteligente por parte da policia utilizar um replicante para caçar outros replicantes, já que ele se iguala em força e agilidade com os demais. Mas porque os policiais deixariam Deckard escapar? Ora, Gaff, o policial que faz origamis, deixa um unicórnio para Deckard momentos antes de sua fuga com Rachel. Como Gaff poderia saber desta passagem remota da vida dele, lembrada apenas em sonhos por Deckard? Este é o claro sinal de que ele pode ser um replicante e os policiais sabiam disso. Como podemos perceber, o filme levanta possibilidades, mas não as confirma. É o espectador quem deve buscar as respostas, o que é genial. Mas “Blade Runner” vai além, se aprofundando também em questões filosóficas sobre a existência humana. O que é ser um humano? De onde viemos e para onde vamos? A marcante frase de Roy no belíssimo diálogo que tem com Deckard (“Eu vi coisas que ninguém acreditaria. Todos esses momentos ficarão perdidos no tempo, como lágrimas na chuva”) resume bem o dilema de nossa existência. Por mais que existam meios de registrar fatos importantes (livros, vídeos, fotografias), muitas passagens importantes da vida de cada ser humano serão simplesmente apagadas do universo quando este deixar de existir.

Utilizando um mundo futurista incrivelmente sombrio que é apontado claramente como resultado das atitudes tomadas no passado pela humanidade, “Blade Runner – O Caçador de Andróides” levanta ainda muitas questões interessantes e profundas sobre a natureza da existência humana. O que acontecerá com cada um de nós quando a escuridão da morte chegar? De onde viemos? Para onde vamos? O que fizemos aqui será simplesmente apagado, “como lagrimas na chuva”? As respostas serão encontradas por cada espectador, de sua própria maneira. E esta é a beleza deste grandioso clássico, que marcou a ficção-científica e o cinema para sempre.

Texto publicado em 13 de Dezembro de 2009 por Roberto Siqueira