ESQUECERAM DE MIM 3 (1997)

(Home Alone 3)

2 Estrelas 

Videoteca do Beto #173

Dirigido por Raja Gosnell.

Elenco: Alex D. Linz, Olek Krupa, Rya Kihlstedt, Lenny von Dohlen, David Thornton, Scarlett Johansson, Haviland Morris, Kevin Kilner, Marian Seldes, Seth Smith e Christopher Curry.

Roteiro: John Hughes.

Produção: Hilton Green e John Hughes.

Esqueceram de Mim 3[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Se “Esqueceram de mim” era um filme que dependia exclusivamente da predisposição do espectador em aceitar sua premissa absurda para funcionar e “Esqueceram de mim 2” já apresentava um claro desgaste desta fórmula, imagine então o que acontece neste “Esqueceram de mim 3” que, além de apostar exatamente na mesma estrutura narrativa e nos mesmos elementos utilizados nos filmes anteriores, ainda se ressente da falta do carisma de Macaulay Culkin. Assim, se o longa anterior se salvava justamente por se apoiar no carisma do então jovem astro, este terceiro filme da franquia não consegue escapar do fracasso.

Escrito novamente por John Hughes, “Esqueceram de mim 3” tem início quando um grupo de criminosos escondem um valioso chip de computador dentro de um carrinho de brinquedo que, por acidente, acaba parando nas mãos do pequeno Alex (Alex D. Linz), um jovem que costuma ficar sozinho em casa durante o dia enquanto sua mãe (Haviland Morris) trabalha. Após descobrirem o paradeiro do chip, os ladrões terão que enfrentar as armadilhas do garoto para recuperar o importante objeto.

Ao contrário do que ocorria nos longas anteriores, “Esqueceram de mim 3” sugere uma narrativa mais sombria em seus minutos iniciais através da trama envolvendo o chip capaz de ativar um míssil, o que, convenhamos, está bem longe de ser uma premissa infantil. No entanto, engana-se quem pensa que isto significa um sopro de criatividade e uma tentativa de revigorar a fórmula que consagrou o primeiro filme da franquia, ainda que a fotografia de Julio Macat também seja claramente mais obscura, apostando em conjunto com os figurinos de Jodie Tillen em cores sem vida e ressaltando o predomínio da neve naquela época do ano de maneira mais ostensiva.

Contudo, os escorregões não passam tanto pelo aspecto visual, mas sim pelas derrapadas do roteiro de Hughes, que parece incapaz de inovar, apostando novamente numa narrativa que se passa na época do Natal, nos problemas entre o protagonista e a família e em coincidências difíceis de engolir, como a confusão pouco verossímil envolvendo sacolas iguais e a maneira como eles conseguem um voo de última hora para Chicago – ao menos o Papagaio que conversa normalmente é tão absurdo que chega a ser simpático. Por outro lado, a trilha sonora de Nick Glennie-Smith acertadamente mantém as músicas joviais e o tema principal da série, trazendo ainda uma empolgante composição que acompanha a preparação da defesa da casa, mantendo outra tradição da franquia.

Fotografia mais obscuraConfusão envolvendo sacolasPapagaioDa mesma forma, o diretor Raja Gosnell e seus montadores Malcolm Campbell, Bruce Green e David Rennie não conseguem evitar que a narrativa se torne arrastada, perdendo-se em alguns momentos ao investir, por exemplo, um longo tempo nas sequências em que o garoto chama a polícia e ninguém acredita nele. Ao menos, o diretor tem méritos por repetir uma estratégia adotada por Chris Columbus, apresentando alguns brinquedos de Alex (design de produção de Henry Bumstead) que serão essenciais no ato final, acertando também na empolgante sequência em que acompanhamos o carrinho do garoto através de uma câmera amarrada sobre ele, ainda que ocasionalmente tenhamos a sensação de que o brinquedo está sendo pilotado pelo MacGyver, conseguindo quebrar madeiras, correr mais que as pessoas e até mesmo pular as cercas entre as casas.

Garoto chama a políciaBrinquedos de AlexO carrinho do garotoEstes pequenos acertos não apagam, porém, sua falta de habilidade na direção de atores, o que permite que Olek Krupa, Rya Kihlstedt, Lenny von Dohlen e David Thornton encarnem seus ladrões, que teoricamente deveriam ser mais profissionais que os personagens de Pesci e Stern, de maneira extremamente caricata, em atuações que tentam soar mais perigosas, mas acabam sendo patéticas. Pra piorar, o menino Alex D. Linz não tem nem de perto o carisma de Culkin, ainda que seu personagem Alex consiga criar empatia com a mãe interpretada por Haviland Morris. Ela que também chega a irritar ao desconfiar constantemente do garoto por achar que tudo não passa de pura imaginação dele, mas esta é uma atitude justificável diante da falta de provas concretas e da fase da vida que ele está atravessando. Fechando o elenco, vale destacar a presença de Scarlet Johansson ainda bem jovem no papel de Molly, a irmã do protagonista.

PatéticosSem carismaEmpatiaAo menos, a melhor tradição da franquia é mantida e a tentativa de invadir a casa é mais uma vez repleta de momentos engraçados, apostando novamente no humor puramente físico para agradar. Só que, infelizmente, desta vez isto não é suficiente para salvar o filme do desastre. A fórmula muito desgastada de John Hughes já não colava mais.

Esqueceram de Mim 3 foto 2Texto publicado em 27 de Agosto de 2013 por Roberto Siqueira

ESQUECERAM DE MIM 2 – PERDIDO EM NOVA YORK (1992)

(Home Alone 2: Lost in New York)

3 Estrelas 

 

Videoteca do Beto #166

 

Dirigido por Chris Columbus.

Elenco: Macaulay Culkin, Joe Pesci, Daniel Stern, Catherine O’Hara, Brenda Fricker, John Heard, Devin Ratray, Hillary Wolf, Maureen Elisabeth Shay, Kieran Culkin, Tim Curry, Dana Ivey, Rob Schneider, Eddie Bracken, Ally Sheedy e Chris Columbus.

Roteiro: John Hughes.

Produção: John Hughes.

Esqueceram de Mim 2[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

O primeiro “Esqueceram de mim” é um filme que depende essencialmente da predisposição do espectador em embarcar em sua premissa absurda para funcionar, mas que por outro lado diverte bastante aqueles que se deixam levar por sua narrativa leve através da sádica estratégia do pequeno Kevin para defender sua casa. Este mesmo raciocínio pode ser aplicado na sequência “Esqueceram de mim 2 – Perdido em Nova York”, que, lançada somente dois anos após o primeiro filme, aposta exatamente na mesma estrutura narrativa para funcionar, alterando apenas pequenos detalhes que pouco interferem no objetivo final. Assim, se por um lado temos a oportunidade de dar algumas gargalhadas com as novas peripécias de Kevin, por outro temos a constante sensação de estarmos assistindo ao mesmo filme novamente.

Também escrito e produzido por John Hughes, “Esqueceram de mim 2” tem inicio quando a família McAllister se prepara para passar o natal na Flórida. Assim como ocorreu no natal anterior, eles perdem a hora, mas desta vez o pequeno Kevin (Macaulay Culkin) está junto com eles na van que sai desesperada para o Aeroporto. Só que ao chegar ao terminal de embarque, Kevin se perde de seu pai (John Heard) e acaba embarcando acidentalmente num voo para Nova York, onde ele aproveita para se hospedar num hotel renomado, já que está com o cartão de crédito de seu pai. O problema é que Harry (Joe Pesci) e Marv (Daniel Stern), exatamente os mesmos bandidos que tentaram invadir sua casa antes, também estão na cidade após fugirem da prisão.

Como podemos notar, Hughes não hesita em abusar das coincidências para criar a mesma situação que proporcionou os melhores momentos de “Esqueceram de mim”. Assim, mais uma vez temos a casa tumultuada na véspera da viagem (captada com os mesmos movimentos de câmera agitados de Chris Columbus), a mesma época do ano e os mesmos conflitos entre o pequeno Kevin e sua problemática família – especialmente com o irritante Buzz. Ao menos, estas repetições também geram algumas divertidas rimas narrativas com o primeiro longa, como quando a família assiste “A Felicidade não se compra” em versão dublada no hotel. Porém, basta raciocinar um pouquinho para que a inevitável pergunta surja: Que pais deixariam o filho para trás duas vezes? Ou seja, a premissa desta continuação é ainda mais ridícula que a do filme anterior, mas se você conseguir superar isto e embarcar na história será parcialmente recompensado por alguns bons momentos.

Casa tumultuadaConflitosFamília assiste “A Felicidade não se compra”Ciente disto, Columbus aposta outra vez numa abordagem descontraída e se sai bem em alguns momentos particularmente inspirados, como quando os próprios pais de Kevin fazem piada com a situação (“Está virando uma tradição da família”), evidenciando que ao menos o longa não se leva a serio e quer apenas nos divertir – o que até funciona, mas não serve como desculpa para perdoar seus claros equívocos narrativos. O diretor acerta também quando revela que Kevin está no veículo antes de sair da casa, numa subversão de expectativa interessante que quebra pela primeira vez a sensação de estarmos vendo “mais do mesmo”.

Pais fazem piada com a situaçãoKevin está no veículoChegada do garoto ao hotelEnxergando a história como uma fábula, o diretor realça o deslumbramento de Kevin através do tom de cenas como a da chegada do garoto ao hotel e seu passeio de limusine comendo pizza – algo que também ocorria no primeiro filme, já que, nas duas situações, o protagonista vive uma situação desejada por muitas crianças (ficar sozinho em casa e viajar sem a companhia dos pais). Também repetindo o que fizera antes, Columbus procura espalhar dicas importantes no primeiro ato que serão importantes durante a narrativa, como num plano detalhe de um rádio relógio com a hora alterada e nas cenas em que busca destacar o gravador de Kevin. Finalmente, o diretor ainda emprega interessantes movimentos de câmera, como quando acompanha uma espécie de telefone sem fio na descoberta de que Kevin não está com a família, criando também planos divertidos como aquele em que uma estátua indica o caminho que o menino deve seguir.

Passeio de limusine comendo pizzaRádio relógioEstátua indica o caminhoMas isto não seria suficiente para salvar “Esqueceram de mim 2” do fracasso, até porque o trabalho técnico da equipe liderada por Columbus limita-se a repetir as mesmas estratégias do primeiro filme, o que pode ser interpretado como algo coerente, mas acaba reforçando a sensação de “mais do mesmo”. Assim, a trilha sonora do ótimo John Williams outra vez utiliza composições agitadas, como aquela que acompanha todos acordando atrasados; a fotografia de Julio Macat novamente prioriza cores quentes no início – que, aliás, permitem a composição de belos planos da cidade de Nova York -, mudando para um tom sombrio na medida em que a narrativa avança (repare como o parque parece assustador à noite); e, finalmente, se os coloridos figurinos de Jay Hurley mais uma vez reforçam o clima agradável pretendido por Columbus, por outro lado à escolha da mesma roupa para o pai de Kevin e o homem que se parece com ele no Aeroporto, que obviamente tenta justificar a confusão do garoto, acaba soando forçada demais. Ou seja, tudo muito adequado, mas parecido demais com o que já tínhamos visto.

Cores quentesParque parece assustadorMesma roupaSeguindo a saga, novamente temos um trecho de um filme sendo usado para assustar personagens, mas apesar da falta de originalidade, a cena em que Kevin assusta os funcionários do hotel é ótima e ilustra o que “Esqueceram de mim 2” tem de melhor: o bom humor. E neste aspecto, assim como na direção de atores, Columbus faz um bom trabalho, extraindo gargalhadas da plateia em sequências inspiradas que contam com a montagem de Raja Gosnell para funcionar, como quando a mãe de Kevin diz que ele não sabe usar cartão de crédito e, em seguida, o vemos usando seu cartão VISA no hotel. Gosnell, aliás, cria também algumas transições bem elegantes, como no “boa noite” à distancia de Kevin e sua mãe ou quando o sorriso de uma animação e do Concierge do hotel (Tim Curry) se misturam logo após este descobrir que o cartão usado por Kevin tinha sido denunciado na polícia.

Trecho de um filmeSorriso da animaçãoSorriso do Concierge do hotelNo elenco, Devin Ratray continua chato como Buzz, mas ao menos temos alguns personagens novos e interessantes, como a moradora de rua vivida por Brenda Fricker, que tem exatamente a mesma função do homem da neve no filme anterior e, assim como ocorria com o personagem interpretado por Roberts Blossom, também rouba a cena numa conversa com o pequeno protagonista – aliás, nesta bela cena temos um raro momento de crítica social (“As pessoas não me querem na cidade deles”). Temos também o Concierge do hotel interpretado por Tim Curry que, com seu jeito levemente afeminado, consegue provocar o riso da plateia, além da adorável participação de Eddie Bracken como o Sr. Duncan, o simpático dono da loja de brinquedos, e do conhecido e nada talentoso Rob Schneider, que vive Cedric.

Moradora de ruaConciergeSimpático dono da loja de brinquedosE chegamos então ao sádico Kevin, novamente interpretado pelo carismático Macaulay Culkin, que carrega a narrativa com grande desenvoltura e facilidade, sentindo-se ainda mais à vontade no papel, como notamos, por exemplo, em sua conversa com uma recepcionista logo na chegada ao hotel. Vivendo um dos sonhos de qualquer garoto, ele se esbalda num quarto repleto de guloseimas e sai para passear sozinho pelas ruas de Nova York, mas o aparecimento dos bandidos que tentaram roubar sua casa traz novamente a tona sua faceta sarcástica, escondida sob seu rosto angelical. Ainda criança, mas claramente mais desenvolvido, Culkin baseia sua atuação muito mais nos diálogos do que nas caretas que marcaram o primeiro filme – e que aqui só surgem com quase uma hora de projeção. Finalmente, o desempenho divertido do garoto é essencial para que o reencontro com os bandidos funcione.

Sádico KevinConversa com a recepcionistaCaretasEncurtando a sequência de preparação da defesa da casa, Columbus ganha tempo para explorar o que o primeiro filme tinha de melhor, criando outra hilária tentativa de invasão dos ladrões, repleta de gags engraçadas e momentos inspirados que se baseiam puramente no humor pastelão, como na cena dos tijolos atirados por Kevin no pobre Marv – este humor físico, aliás, está presente desde o princípio na cena do canto das crianças no coral de natal. Desta vez vagando por em Nova York após fugirem da prisão (que coincidência, não?), os ladrões estúpidos vividos por Pesci e Stern jamais soam ameaçadores, o que, somado ao que já vimos no filme anterior, faz com que a plateia jamais tema pelo destino de Kevin. Ao menos, os atores mais uma vez não hesitam e se entregam ao humor físico sem reservas.

Tijolos atirados por KevinLadrões estúpidosReencontro de Kevin com a moradora de ruaApós o festival de gargalhadas, “Esqueceram de mim 2” chega ao seu final repleto de clichês, com a redenção de Buzz e o reencontro de Kevin com a moradora de rua, que ao menos emociona pela simplicidade de ambos. Além disso, a piada da conta do hotel encerra o filme com o astral lá em cima, o que é ótimo.

Apesar de seus inúmeros problemas, “Esqueceram de mim 2” ainda consegue nos divertir graças ao enorme carisma de seu protagonista e à engraçada sequência de defesa da casa. Por outro lado, a constante repetição de elementos usados no primeiro filme já evidenciava que a franquia poderia muito bem terminar por ali. E se você observar quantas vezes eu utilizei expressões como “novamente”, “outra vez” e “mais uma vez” neste texto, talvez concorde comigo. Ou simplesmente me considere um péssimo escritor.

Esqueceram de Mim 2 foto 2Texto publicado em 22 de Abril de 2013 por Roberto Siqueira

ESQUECERAM DE MIM (1990)

(Home Alone)

4 Estrelas 

Videoteca do Beto #164

Dirigido por Chris Columbus.

Elenco: Macaulay Culkin, Joe Pesci, Daniel Stern, John Heard, Roberts Blossom, Catherine O’Hara, Angela Goethals, Devin Ratray, Gerry Bamman, Hillary Wolf, John Candy, Kieran Culkin e Hope Davis.

Roteiro: John Hughes.

Produção: John Hughes.

Esqueceram de mim[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Dono de uma das carreiras infantis mais bem sucedidas da história do cinema, Macaulay Culkin tornou-se o exemplo perfeito de como os problemas externos podem prejudicar as estrelas de Hollywood. Após emplacar um sucesso atrás do outro e registrar uma ascensão meteórica no início dos anos 90, o jovem astro simplesmente sumiu das telonas, ganhando espaço na mídia apenas pela disputa jurídica que travou com seus pais para poder administrar sua fortuna, por seus problemas com drogas e por sua amizade com o astro pop Michael Jackson. E mesmo não sendo o filme de estreia do ator, foi justamente este divertido “Esqueceram de mim” que alçou aquele menino carismático à fama e tornou seu rosto um dos mais conhecidos da época.

Escrito e produzido por John Hughes, responsável por muitos filmes de sucesso voltados para o público adolescente nos anos 80, “Esqueceram de mim” parte de uma premissa que, de tão absurda, deixa evidente desde o princípio que a narrativa não pretender ser levada a serio, funcionando como um leve passatempo que busca simplesmente nos fazer rir. Afinal, por mais relaxados que sejam, que pais em sã consciência seriam capazes de esquecer o próprio filho em casa e partir numa viagem para o exterior? Pois é exatamente o que faz a atrapalhada família de Kevin (Macaulay Culkin), um menino de oito anos que é deixado acidentalmente em casa no Natal enquanto seus parentes viajam para a França. Sozinho, o garoto se torna uma aparente presa fácil para os ladrões Harry (Joe Pesci) e Marv (Daniel Stern), que pretendem aproveitar a ausência dos pais para invadir a casa dele. No entanto, esta tarefa não será tão fácil quanto parece.

Partindo desta premissa pouco crível, Chris Columbus procura conferir a “Esqueceram de mim” uma atmosfera quase fabulesca, conduzindo a narrativa com uma leveza que encontra reflexo na fotografia de Julio Macat, com seu visual colorido nas cenas diurnas e às chamativas luzes que enfeitam as casas durante a noite. Da mesma forma, os figurinos de Jay Hurley utilizam cores vivas e coerentes com o espírito do longa, assim como a boa trilha sonora de John Williams faz diversas referências ao Natal (uma festa sempre associada à alegria), mudando o tom somente quando Marley (Roberts Blossom), o “homem da neve”, surge em cena, ao criar uma atmosfera de suspense que funciona corretamente, sem jamais quebrar o clima festivo que permeia as ótimas canções selecionadas por Williams.

Cenas diurnasChamativas luzesCores vivasTambém desde o início, Columbus trabalha bem elementos importantes da narrativa, como o grande número de pessoas presentes na casa de Levin, captado com precisão pela câmera inquieta do diretor. Esta sensação incômoda que sentimos ao ver aquelas pessoas transitando pela casa é importante para estabelecer a confusão que impera no local e tornar menos absurdo o esquecimento do garoto. Assim, quando eles acordam atrasados, fazem a contagem apressada das crianças (atrapalhada pela presença de um garoto vizinho) e partem sem Kevin, o absurdo da situação não deixa de existir, mas acaba funcionando no filme.

Grande número de pessoasSensação incômodaAcordam atrasadosIsto ocorre também porque o roteiro tem o cuidado de inserir elementos que colaboram na construção deste momento crucial, como os problemas de Kevin com a família e a evidente falta de atenção de seus pais, que conseguem se atrapalhar até mesmo no simples pagamento de uma pizza. Da mesma forma, diversas dicas espalhadas ainda no primeiro ato terão reflexo no clímax da narrativa, como o dente dourado do policial Harry, a lenda do homem da neve e a aranha de Buzz (Devin Ratray), o que é sempre divertido. Finalmente, os movimentos de câmera de Columbus ajudam a compreender a geografia da casa, o que é essencial para que a sequência da invasão dos ladrões funcione – e tanto a escolha da mansão como a dos objetos usados por Kevin para evitar a invasão são importantes neste processo, o que é mérito do design de produção de John Muto.

Problemas de Kevin com a famíliaDente dourado do policial HarryAranha de BuzzEmpregando closes nas inúmeras caretas e nos diversos gritos de Macaulay Culkin, Chris Columbus busca valorizar ao máximo seu carismático protagonista, o que se revela uma estratégia inteligente por parte do diretor. Indefeso e maltratado pela família, Kevin logo se coloca numa posição vulnerável e, desta forma, conquista a empatia da plateia com tranquilidade. É claro que o carisma de Culkin é crucial neste processo e, mesmo sendo ainda tão jovem, o garoto se sai muito bem, carregando a narrativa com facilidade. Seu rosto angelical evoca uma aura de inocência que tornará ainda mais surpreendente sua sádica estratégia para proteger a casa (“Fiz minha família desaparecer”, diz sorridente ao descobrir que estava sozinho). Em suma, a presença de Culkin é fundamental para que “Esqueceram de mim” funcione tão bem como comédia.

Indefeso e maltratado pela famíliaRosto angelicalSádica estratégiaComo era de se esperar, Kate, a mãe de Kevin vivida por Catherine O’Hara, se desespera assim que descobre o que aconteceu, mas não ao ponto de quebrar o clima leve da narrativa. Ainda assim, a atriz vive um grande momento quando, com os olhos marejados, implora para embarcar em um avião, demonstrando que está realmente sofrendo pelo que aconteceu com seu filho. Já os outros personagens, como o chato Buzz, obviamente não apresentam muita profundidade, mas isto não é exatamente um problema grave numa comédia leve e despretensiosa como esta. Até por isso, Roberts Blossom consegue roubar a cena nos poucos minutos em que ganha destaque como o homem da neve Marley, emocionando a plateia ao confessar para o pequeno Kevin os problemas de sua família; e aqui impressiona também a desenvoltura de Culkin, que desenvolve o diálogo com naturalidade, sem jamais ser ofuscado pelo momento brilhante de Blossom.

Implora para embarcar em um aviãoConfessa para o pequeno Kevin os problemas de sua famíliaDesenvoltura de Culkin“Esqueceram de mim” traz ainda outras cenas emocionantes, como o inocente pedido de Kevin para um “ajudante” do Papai Noel (“Sei que você não é o Papai Noel, mas pode dar um recado pra ele?”) e o instante em que ele contempla uma família de vizinhos curtindo a noite de Natal, além é claro do esperado reencontro entre Marley e sua família. Mas são mesmo os momentos engraçados que garantem o sucesso do longa, começando pelos excelentes truques do garoto que buscam enganar os ladrões, como a festa promovida com brinquedos e cartazes e o trecho de um filme repetido diversas vezes, além da empolgante sequência de preparação da defesa da casa, que, auxiliada pela montagem dinâmica de Raja Gosnell e pela trilha sonora agitada, consegue criar o clima ideal para o engraçadíssimo terceiro ato.

Reencontro entre Marley e sua famíliaFesta promovida com brinquedosTrecho de um filmeE então chegamos à hilária tentativa de invasão promovida pelos bandidos, recheada de gags divertidas baseadas no humor físico, numa verdadeira sucessão de trapalhadas dignas dos “Três Patetas” ou das animações de Chuck Jones – e se tudo funciona muito bem, é também porque Pesci e Stern se entregam completamente ao humor pastelão, sem jamais hesitarem ou temerem cair no ridículo. Depois dela, até perdoamos a óbvia mensagem moralista sobre a importância da família e a previsível trajetória de redenção do protagonista.

Hilária tentativa de invasãoHumor físicoHumor pastelãoUma boa comédia é aquela que consegue envolver o espectador e fazê-lo rir das situações que apresenta, por mais incoerentes que estas possam parecer. Sendo assim, “Esqueceram de mim” é uma ótima diversão, que cumpre muito bem o que se propõe a fazer.

Esqueceram de mim foto 2Texto publicado em 04 de Abril de 2013 por Roberto Siqueira

CURTINDO A VIDA ADOIDADO (1986)

(Ferris Bueller’s Day Off)

 

Videoteca do Beto #116

Dirigido por John Hughes.

Elenco: Matthew Broderick, Alan Ruck, Mia Sara, Jeffrey Jones, Jennifer Grey, Cindy Pickett, Lyman Ward, Charlie Sheen, Edie McClurg e Kristy Swanson.

Roteiro: John Hughes.

Produção: John Hughes e Tom Jacobson.

[Antes de qualquer coisa, gostaria de pedir que só leia esta crítica se já tiver assistido ao filme. Para fazer uma análise mais detalhada é necessário citar cenas importantes da trama].

Os filmes adolescentes eram uma verdadeira febre nos anos oitenta, talvez porque as produtoras perceberam que os jovens formavam a grande parte do público que freqüentava os cinemas. Apesar disto, a quantidade de bons filmes voltados para este público era bem superior ao que vemos atualmente, como atestam a deliciosa aventura “Os Goonies”, a magnífica trilogia “De Volta para o Futuro” e comédias muito divertidas como este “Curtindo a Vida Adoidado”, que, com seu protagonista carismático e situações muito divertidas, conquista imediatamente o espectador.

Ferris Bueller (Matthew Broderick) é um aluno bastante popular na escola, que decide matar aula para curtir um belo dia de sol ao lado da namorada Sloane Peterson (Mia Sara) e de seu melhor amigo Cameron (Alan Ruck). Sua desculpa, porém, não engana o diretor Ed Rooney (Jeffrey Jones), que tenta de todas as formas descobrir suas falcatruas, e nem mesmo sua irmã Jean (Jennifer Grey), que também tenta atrapalhar seus planos.

Escrito, produzido e dirigido por John Hughes, “Curtindo a Vida Adoidado” é uma comédia adolescente leve, que representa bem o gênero que o próprio Hughes se especializaria em dirigir posteriormente. Repleta de boas idéias e piadas divertidas, a narrativa tem um ritmo ágil, essencial para agradar seu público alvo, o que é mérito também da montagem dinâmica de Paul Hirsch. Ciente do que queria, Hughes explora muito bem situações conhecidas pelo espectador mais jovem, como aquelas intermináveis aulas chatas que nos fazem quase babar nas mesas escolares, exatamente como acontece com os personagens que, letárgicos, assistem ao professor repetir insistentemente o nome de “Bueller”, mesmo vendo sua cadeira vazia. Partindo desta premissa, uma atitude até comum (pelo menos na minha geração) como “matar aula” serve de ponto de partida para um dia inesquecível, repleto de situações inusitadas, sempre lideradas pelo carismático protagonista. Ferris convida seu grande amigo Cameron para passar o dia ao seu lado, num momento divertido em que ficam evidentes os métodos alternativos que eles utilizam pra matar aula e até mesmo o estado de espírito de cada um. Enquanto Cameron vegeta em seu quarto embalado por uma trilha sombria, Ferris toma uma bebida em sua cadeira de praia, acompanhado por uma trilha bem suave. Depois, após uma hilária ligação, Ferris arma uma situação e consegue a companhia da namorada Sloane. Está montado o cenário para um dia inesquecível.

Sempre num contexto cômico, Hughes faz ainda algumas referências a outros personagens importantes do cinema, como “Alien” e “Dirty Harry”, que, aliás, faz Rooney se encher de orgulho ao ser comparado com o personagem durão de Clint Eastwood. Além disso, o diretor dá total liberdade para que seu protagonista quebre constantemente a quarta parede ao falar com a câmera e se dirigir a platéia, num artifício narrativo que nos surpreende e nos faz rir, além de fugir da abordagem realista ao inserir tópicos escritos na tela, por exemplo. Mas apesar da direção eficiente, é na força da atuação de Matthew Broderick que o longa se sustenta. Carismático, o ator cria um personagem adorável desde os primeiros minutos em cena, que se tornou um símbolo dos jovens em sua época. Os adolescentes queriam ser Ferris Bueller. Mimado pelos pais, Ferris é o verdadeiro bon vivant, capaz de criar inúmeras situações para curtir seu “dia de folga”, sempre driblando aqueles que tentam impedi-lo. E apesar de algum exagero, as armações de Ferris – como na cena do restaurante e a fita gravada em seu quarto – funcionam muito bem, provocando o riso no espectador.

Além de seu carismático protagonista, “Curtindo a Vida Adoidado” conta ainda com coadjuvantes adoráveis, como o medroso e engraçado Cameron, interpretado por Alan Ruck, que é quem mais se transforma na narrativa, criando coragem para enfrentar o pai e levar a vida mais na boa, inspirado pelo amigo Ferris. Revoltado, ele extrapola e acaba detonando a Ferrari do pai, em outro momento bastante engraçado. Interpretada pela graciosa Jennifer Grey, Jean, a irmã de Ferris, tem a função narrativa de criar dificuldades para Ferris e inserir um pouco de suspense na trama, mas sempre de maneira leve e descontraída. Apesar disso, Grey constantemente aparece séria, demonstrando irritação com o irmão, até o momento em que encontra um garoto drogado (Charlie Sheen, em participação hilária) na delegacia e muda de comportamento – e Grey se sai muito bem após o beijo, demonstrando a empolgação da garota. Vale destacar ainda Jeffrey Jones, que faz do diretor Ed Rooney um personagem adoravelmente atrapalhado em sua tentativa de soar ameaçador.

O clima leve da narrativa é reforçado pela fotografia clara do bom Tak Fujimoto, que explora bem o dia ensolarado em que se passa a trama para empregar um visual bastante alegre e coerente com o espírito do longa. Também colaboram as roupas coloridas de Ferris e seus amigos (figurinos de Marilyn Vance) e a trilha sonora agitada de Arthur Baker, Ira Newborn, John Robie e Yello, que pontua muito bem o empolgante dia do trio, como quando eles saem da escola na Ferrari do pai de Cameron após enganarem o diretor, acompanhados pela trilha cheia de adrenalina, ou quando eles visitam o museu, acompanhados pelo som de músicas clássicas. A trilha acerta ainda na escolha de músicas infalíveis, como “Twist and Shout”, dos Beatles, que mexe o esqueleto de qualquer um e faz o espectador se sentir bem enquanto assiste ao filme.

Com esta atmosfera jovial, “Curtindo a Vida Adoidado” conta ainda com um arsenal de piadas criativas, como os efeitos sonoros do teclado que imitam a tosse do “doente” Ferris, que sensibilizam seus colegas de escola e dão início ao engraçado movimento “Save Ferris”. Entre tantos momentos memoráveis, vale destacar também a hilária conversa telefônica entre o diretor Rooney e o suposto Sr. Peterson, em que a câmera demora a revelar Cameron do outro lado da linha, fazendo com que o espectador pense que o diretor de fato está falando com o pai de Sloane. Finalmente, na corrida desesperada de Ferris pra casa já no final, torcemos muito por ele, ainda que tenha matado aula e enganado a todos, justamente pelo inegável carisma do personagem. Após os créditos, Ferris ainda brinca com câmera, usando a metalingüística de maneira bastante divertida.

Criativo e cativante, “Curtindo a Vida Adoidado” é um filme despretensioso sobre um personagem igualmente despretensioso. Ferris não tem grandes aspirações, não se preocupa com os problemas ao seu redor e só quer saber de se divertir. Certamente, ele não poderá viver assim pra sempre. Por isso, trata de aproveitar enquanto pode. E seu dia de diversão acabou se transformando em algo muito maior: um clássico do cinema nos anos 80.

Texto publicado em 13 de Outubro de 2011 por Roberto Siqueira